Era casada quando me apaixonei por outra pessoa... e não me arrependo
Volta e meia tenho encontrado cabeça, coração e rabo
Eu era casada quando me apaixonei por outra pessoa e não me arrependo.
A Dra. Helen Fisher, uma das principais estudiosas do comportamento humano, conta, num dos seus TEDs, que o cérebro apaixonado fica como um dependente químico. Fiquei bem assim, que nem cracuda do krush querendo mais uma dose. Você já sentiu isso também, caro leitor?
Meu último banho tinha sido no dia anterior de manhã. Quando cheguei em Pinheiros meu corpo guardava resquícios do escritório, uma noite em casa e mais de 12 horas entre aeroportos e voo. "Não dá tempo de tomar banho, passa só um perfume", ordenou a Dani, e eu obedeci, como faço desde que a gente tem uns 18 anos.
Nessa noite eu transei com um cara e me senti a maior vagabunda ao não lembrar o nome dele pela manhã. Era algo parecido com resfriado, eu pensava rindo internamente. Para a menina que tinha crescido sob o duro julgamento mineiro, e era casada com um cara lindo e legal, eu tinha total direito de me sentir muito vagaba.
Resfriado? Como era mesmo o nome dele? Nunca um estranho tinha sido tão familiar. O paletó de veludo preto e camiseta verde; os conhecidos em comum do outro lado do planeta, a Arelis, garçonete do lugar que costumava comer; o chimichurri do restaurante argentino delicioso; o outro que tinha "happy" no nome e a gente teve que estacionar ao lado da creche mais triste do mundo; o trânsito na 395. Ele parecia conhecer o mundo de onde eu vinha.
Coriza? Tenho que lembrar esse nome. Aquele foi o primeiro e único beijo roubado da vida. Benza as deusas, porque hoje sabemos que isso não se faz. Só que se eu tivesse sido cantada não teria rolado. Não que eu acreditasse tão piamente na monogamia, mas não me permitia tanto com o marido, hoje ex, que tinha crescido no interior da Inglaterra, tinha sido coroinha e, com toda sua ingenuidade, realmente acreditava no para sempre. Por mais que eu venha de uma linhagem de vacas, termo pejorativo usado para determinar mulheres livres, meus limites internos não se estendiam tanto assim.
Tosse! Era isso! Beijamos e transamos tanto que acordei andando que nem cowboy. Bom quando a gente tem flashback da noite anterior, né? Você lá no meio do palco, falando de coisa importante e, de repente, brota um siricutico subindo pelo corpo, rs. E tem flashback de orgasmo que é quase orgasmo. Ô, delícia.
Achei que não fosse ver o narigudo nem seu peru comprido nunca mais. Mas segunda entregaram rosas colombianas, o que me deu uma desculpa pra ser safada pelos dias seguintes. Todo o tempo que não estava trabalhando, nessa viagem à São Paulo, estava grudada nele que nem peixe de aquário de restaurante chinês, saca? Daqueles que ficam grudados no vidro, só que com a ventosa no krush. Phoda Madrinha torce pra que você já tenha vivido isso.
Se não havia um senso de urgência, ele brotou quando minha amiga e sogra querida morreu. A morte da Etel fez crescer a consciência de que a vida é um sopro, e que ignorar certos chamados é cagada. Como é que eu ia voltar pra minha vida anterior sem aquela tosse, que na verdade se chamava Tosi, e que no meu coração era Z? Voltei, mas não de corpo presente, porque ali só tinha uma alma penada.
Com as ferramentas que tinha me separei, pedi demissão e voltei pro Brasil da forma mais suave e indolor possível; e se a vida fosse uma comédia romântica, eu diria que fomos morar juntos e, por fim, fomos felizes pra sempre. Detalhe: se me contassem essa história, ou visse num filme, acharia o roteiro péssimo, questionaria os motivos da personagem e diria: "Bebeu? Usou drogas? Vai largar essa vida pra voltar pro Brasil por amor? Ah, nem..."
Ainda bem que não é. A gente é tão massa que quanto mais apanha, mais cresce. Há um trecho famoso de uma peça de Ésquilo, Agamêmnon, que diz que nós, mortais, aprendemos pelo sofrer (páthei máthos), mesmo que a contragosto; é forte mas é gracioso. Gil cantaria o seguinte: "o amor da gente é como um grão, / uma semente de ilusão, / tem que morrer pra germinar, / plantar n'algum lugar. / Ressuscitar no chão, nossa semeadura". Morremos e renascemos algumas vezes, e só melhoramos a cada versão. A gente é um Benjamin Button do amor, começa querendo ficar viúva e termina se apaixonando.
Democracia corintiana; sua família de adolescência de índios nativos americanos em Las Cruces; o estudo antropológico que é o Kiss Kruise, um cruzeiro da band Kiss; sua versão Z nóia, que descobri recentemente e amei; de experimentar uma segurança que nem meus pais me deram e de poder contar de fato com alguém. Tive a sorte de descobrir muita coisa incrível até agora, e desconfio que ainda tenha mais um tanto.
Se hoje eu voo é porque posso contar com uma puta mola propulsora. Z, muito obrigada por ser o melhor pai que o Cachorro poderia ter tido, por lavar a louça, cuidar da casa, da Aiaiai, de mim, do imposto de renda, do vazamento, por respeitar a liberdade que me dou, me deixar ocupar 80% da cama, acolher os amigos e irmãs que invadem mais a casa da gente do que a lenda do MST e a do Boulos juntos, me deixar assistir seu crescimento, amadurecimento e desconstrução. Love you horrors, Z.
A Phoda Madrinha deseja que você seja feliz sozinho, casado, numa relação a três, de quatro (rs), ou poliamorosa; mas caso tenha um krush, que ele te ame mesmo que você não se ame ainda, que seja no estilo Z ("Por que choras, Rodrigo Hilbert?", rs), desses completos. E que não te falte conexão cabeça, coração e rabo. Feliz dia dos namorados!
PS: Nunca te contei, mas às vezes quando você chega em casa, e a Aiaiai tá quase infartando de felicidade, internamente ouço "Here comes your man" do Pixies.
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