Colo de Mãe
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Não aguentarei mais um ano de aula online; tenho medo do que virá

Costumo ser resiliente, mas cheguei no limite como mãe multitarefa

Mila Supinskaya - stock.adobe.com
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Agora

Quase chorei quando recebi o modelo de contrato da escola de minhas filhas no final do mês. E não foi por causa dos altos valores das mensalidades. O motivo do meu quase pranto era outro.

O contrato trouxe de forma bem especificada que os serviços que vou contratar para 2021 poderão ser prestados de forma presencial ou remota, como orienta o Procon e como autorizou o CNE (Conselho Nacional de Educação), que permitiu a possibilidade de aulas online até o fim de 2021, caso as autoridades sanitárias acreditem ser necessário por causa do coronavírus.

Eu nunca gostei de aula online. Há dois anos, fui uma das primeiras a levantar a bandeira contra a medida, em uma coluna, dado o projeto de homoeschooling do governo federal, mas jamais imaginei que a expressão “ensino remoto” iria despertar em mim tamanha ansiedade e tristeza, além de trazer à tona todo o cansaço.

Sou uma pessoa bem resiliente e costumo exercitar essa resiliência para ensiná-la às minhas filhas. E, como o coronavírus não está para brincadeira, foi fácil entender que as aulas online eram necessárias.

Enviar o filho à escola em meio a uma pandemia de um vírus sem cura pode ser fatal. Embora eu não seja defensora do ensino a distância, sou do time que prefere deixar as filhas em casa por mais um mês e meio do que enviá-las à escola correndo o risco de adoecer. Entre ter depressão por ficarem trancadas ou morrerem ao contrair a Covid-19, fiquei com a primeira opção.

Há o time de mães que acreditam que mandar para a escola traz risco de contaminação, mas que essa contaminação não ocorrerá, como há o time de mães que sabem que deixar os filhos trancados traz risco de depressão, mas acreditam que essa depressão não ocorrerá. Sou do segundo time. Se protocolos sanitários na escola impedem o coronavírus, protocolos de saúde mental em casa impedem este adoecimento.

Aulas online foram um amargo remédio para algo que não tinha jeito e, embora eu não as defenda, tenho por elas o mesmo apreço que nutro pela cesariana e pela fórmula láctea. Não se recomenda o uso, mas é bom que existam para salvar vidas.

No entanto, ter apreço por essa solução não significa que eu goste dela. Eu estou exausta e não aguentarei mais um ano de aula online. E, mesmo com toda autonomia que dei às minhas filhas, pois fazem aulas sozinhas –com alguma supervisão, conforme a idade e suas necessidades–, não dá para seguir sendo mãe multitarefa.

Minhas filhas estão em idades diferentes. Uma tem 13 anos e, no auge de sua adolescência, adaptou-se bem às aulas online, mas precisa de um ambiente silencioso. Com isso, só tenho uma hora no dia para passar o aspirador de pó ao mesmo tempo em que sirvo o almoço e trabalho.

Já a caçula de oito anos decidiu fazer as aulas ao meu lado, e elas ocorrem bem no meu horário de trabalho. O transtorno só não é maior porque sou acostumada ao burburinho da redação. O desespero é tamanho que eu não sei se quero que 2020 acabe logo por medo de 2021.

Colo de Mãe

Cristiane Gercina, 42, é mãe de Luiza, 15, e Laura, 9. É apaixonada pelas filhas e por literatura. Graduada e pós-graduada pela Unesp, é jornalista de economia na Folha. Opiniões, críticas e sugestões podem ser enviadas para o email colodemae@grupofolha.com.br.

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