Colo de Mãe
Descrição de chapéu Agora

Proteger a criança é forma de cuidar da mãe

País precisa debater problemas reais da infância e sair da narrativa das ameaças imaginárias

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Fundamentalismo religioso, fake news, falta de educação profunda e atitudes criminosas têm empurrado a infância ladeira abaixo no Brasil.

Desde que, há dois anos, o país acreditou na narrativa da existência do kit gay e da mamadeira de piroca, o cuidado básico com os pequenos chegou a um ponto degradante.

Apenas em 2020 temos dois casos emblemáticos: a morte do menino Miguel, que caiu do nono andar de um prédio no Recife (PE), após a patroa rica e branca de sua mãe, negra e periférica, apertar o botão do elevador que levaria a criança a perder a vida.

E o da menina de 10 anos, grávida após sofrer abuso de um tio por anos, que foi recebida aos gritos de assassina por pessoas na porta do hospital onde faria o aborto, e teve seus dados pessoais, como o endereço e o hospital em que estaria, divulgado de forma criminosa em uma atitude que teria contado com envolvimento do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, órgão que, na teoria, deveria proteger a ela e demais crianças.

Falo de dois casos profundos que beiram a barbárie para demonstrar o quanto os pequenos desrespeitos aos direitos da crianças nos levaram onde estamos. Em um ano de pandemia, as coisas pioraram demais para filhos e, consequentemente, suas mães. A sociedade não fez opção pela infância.

Não priorizou a abertura de escolas e, agora, ao reabrir, às vésperas de que se chegue uma vacina —o que demonstra que poderíamos esperar só mais um pouquinho— dá aos pequenos e suas mães apenas duas escolhas: ir à escola e correr o risco de ser contaminado e, até mesmo, de morrer, ou seguir em casa, podendo ser vítima de um adoecimento psicológico mais profundo.

No mês das crianças no Brasil, é preciso debater mais profundamente o que está anotado na Declaração Universal dos Direitos das Crianças e no Estatuto da Criança e do Adolescente. As palavras não podem ficar só no papel.

Neste ano, em que tivemos que nos isolar socialmente por causa de um vírus grave e letal, desrespeitamos vários itens da lista. A educação online não foi para todos os pequenos. Porque distribuir material e ter aulas gravadas não significa incluir todos no contexto da edução.

O direito de brincar foi tirado, pois não há espaços públicos amplamente disponíveis nos quais as crianças possam estar com total segurança sanitária. E ficaram sem direito à saúde, pois, na maioria das vezes, estão expostas ao vírus, seja por decisão dos pais ou do poder público.

Enquanto não debatermos a responsabilidade de todos nestas falhas imensas com a infância teremos crianças e mães doentes, em uma sociedade que tende a seguir mal. O filho precisa estar bem para que a mãe fique bem. É preciso cobrar e se movimentar para que as crianças tenham o cuidado e a proteção que merecem.

Se não fizermos nada, seguiremos combatendo males que não existem, definindo as cores de roupas de meninos e meninas enquanto mães e filhos sofrem.​

Agora

Colo de Mãe

Cristiane Gercina, 42, é mãe de Luiza, 15, e Laura, 9. É apaixonada pelas filhas e por literatura. Graduada e pós-graduada pela Unesp, é jornalista de economia na Folha. Opiniões, críticas e sugestões podem ser enviadas para o email colodemae@grupofolha.com.br.

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