Colo de Mãe
Descrição de chapéu Agora

Álcool 70, uma vela para o santo e pé na estrada

Sete meses depois, pegamos a rodovia para fora de SP pela primeira vez desde o isolamento

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Não tenho casa na praia, chácara nem sítio. Nem eu nem minha família. Seria muito bom poder contar com essa opção, principalmente nos tempos de pandemia.

Poder, vez ou outra, dar uma fugida para um local seguro, onde ficaria apenas a família quarentenada, sem temer ser contaminada ou contaminar alguém com o coronavírus. Ficar isolada por meses, voluntariamente (e com o auxílio da empresa, que nos mantém em home office, em segurança, desde março), não é fácil.

Em casa, somos em quatro, todos com suas atividades online, dividindo computador, internet, anseios, perrengues e, muitas vezes, uma certa descrença na humanidade que aglomera, não sabe fazer quarentena e tem dificuldades em entender que a máscara deve cobrir o nariz e não o queixo.

A pandemia não acabou e ficar indo e voltando por aí é muito arriscado, mas os números estão melhorando, o verão está chegando e a vacina está muito longe de imunizar a todos nós, atingindo a tal imunidade de rebanho que nos permitirá ter uma vida próxima do normal. Digo isso sem a certeza de que voltaremos, um dia, à antiga normalidade.

Tudo isso para dizer que, após ler e reler especialistas, ouvir o que diz o dr. Drauzio Varella e o querido Átila Iamarino (ambos colunistas da Folha), decidi que dar uma fugida de São Paulo poderia ser uma boa, no feriado de Dia da Criança, aproveitando os dias da pausa que as meninas teriam na escola, além da folga conquistada (para quem não sabe, jornalista que trabalha em redação desconhece feriado e final de semana).

Foi difícil escolher o lugar. Tudo absurdamente caro e sem a segurança sanitária que eu buscava. Joguei para o universo e, de repente, um lugar que estava ocupado não estaria mais. Era nas montanhas, na Serra da Mantiqueira, distante duas horas de carro, preço que cabia no bolso e o melhor: sem contatos.

Juntamos comida, lençóis, tolhas, roupas e muito álcool 70 —em gel, em potinho de espirrar e em embalagens menores para caber na bolsa e no bolso— mais desinfetantes e muita água sanitária. Partimos.

Foram três dias sem contatos. Olhando as montanhas e o horizonte, vendo o sol se pôr. As meninas deram comida aos pássaros, andaram por árvores e hortas, curtiram leituras e uma boa rede, além de conquistar o maior presente desta quarentena: respirar sem máscara na rua sem saída no meio do mato!

Foi uma viagem necessária, com respeito ao planeta e aos demais. Com muita segurança sanitária, sem aglomerar e com risco baixíssimo de espalhar ou pegar o vírus. Como sei que não há 100% de segurança ainda, creio que só ficarei totalmente tranquila quanto à saída 14 dias depois.

Enquanto isso a gente vai se reinventando. Sempre com máscara e cuidados e também cuidando da saúde mental.

Não sou do time que acha que, para manter a saúde da mente, podemos sair por aí, nos arriscando a morrer e a matar. Como já disse nesta coluna, logo no começo da pandemia: não tenho medo do vírus nem da morte. Tenho apenas respeito pelo ser humano e pelo planeta, por isso, isolo-me, continuo em quarentena e tomo todos os cuidados possíveis quando preciso sair de casa para fazer algo que seja necessário.

Eu quero sobreviver! Sobreviver para contar história, para rir de tudo, tirar lições de um momento tão difícil e, viva, cuidar ainda mais da minha saúde mental, da saúde mental de minhas filha e de minha família.

Parar foi bom, saber que os números —tanto de morte quanto de contaminação— estão em queda também traz um certo consolo às mães e aos filhos que estão trancados. Para mim, ainda não é hora de reabrir escolas e, não, nem eu nem minhas filhas vamos pirar. Estamos restauradas.

Agora

Colo de Mãe

Cristiane Gercina, 42, é mãe de Luiza, 15, e Laura, 9. É apaixonada pelas filhas e por literatura. Graduada e pós-graduada pela Unesp, é jornalista de economia na Folha. Opiniões, críticas e sugestões podem ser enviadas para o email colodemae@grupofolha.com.br.

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