Bom de Garfo

Boteco raiz da rua Maria Antônia, Bar do Zé tem um dos bolinhos de carne mais gostosos de SP

Quitute é preparado com trigo para quibe

A porção de quibinhos vem com 12 unidades: o miolo derrete na boca
A porção de quibinhos vem com 12 unidades: o miolo derrete na boca - Otavio Valle/Folhapress
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​Apesar de não ser mais um reduto da esquerda intelectual paulista, o Bar do Zé, na rua Maria Antônia, persiste como uma espécie de resistência. Só que, agora, a luta é contra a globalização. Em meio a tantas transformações, o boteco na Vila Buarque consegue se desviar das mudanças impostas pela contemporaneidade.

Se há cinco décadas o bar foi testemunha de um emblemático episódio do período da ditadura militar (1964-1985), hoje está distante daquele lugar que presenciou a “Batalha da Maria Antônia”. A realidade atual é completamente outra.

Em seus prédios, distribuídos em pouco mais de 400 metros de via, a grande maioria de moradores é formada por estudantes do Mackenzie e da Santa Casa. Os velhos comércios da rua deram lugar às grandes redes de lojas e serviços. Os bares e restaurantes perderam espaço para franquias ou espaços gourmetizados.

Hoje, a rua tem um climão de shopping center. Mesmo assim, o Bar do Zé resiste bravamente como um botecão. A clientela não é só de estudantes. Logo pela manhã, trabalhadores da região passam por lá para comer um tradicional pão da chapa, tomar um pingado ou comer ainda a deliciosa coxinha (R$ 5). O portentoso salgado é feito caprichosamente com frango desfiado à mão.

Na hora do almoço, faz sucesso o “Ligeirinho” (R$ 24,90). Um PF de frango empanado, bem servido e com gosto caseiro. No fim da tarde, o Bar do Zé, que na verdade se chama “Bar e Café Faculdade”, deixa de lado o perfil restaurante e assume sua versão botecão boêmio.

Grupos de amigos, que frequentam o bar há décadas, se misturam aos estudantes mais jovens. O arquiteto Jorge Coppini, 63, cliente do bar por quase 25 anos, conta que já viu de tudo por lá. Gosta de frisar que o local não perdeu a vocação de arena política. “Aqui é uma tribuna que aceita todas as colorações. Vozes aumentam, mas nunca há desrespeito”, relata Coppini.

Rodrigo Pinto Ribeiro, há 13 anos no comando da casa junto do pai Adelino e do irmão Marcelo, diz que alguns ajustes foram feitos no cardápio para atender novas demandas: “Aqui, tradição e qualidade continuam com o passar dos anos. Tiramos alguns sanduíches que tinham pouca saída. Mas colocamos outros no lugar”.

O boteco é daqueles bons para puxar uma mesa na calçada, ver o movimento, bater um papo e tomar uma cerveja, que está sempre gelada. Os garçons, todos velhos de casa, criam uma atmosfera especial, com resenhas pra todo lado.

Rodrigo me fala com orgulho do bolinho de bacalhau (R$ 8). “Compramos o ‘Cod Gadus Morhua’, que é o legítimo bacalhau. Ele é mais caro, mas não discutimos qualidade”, afirma Ribeiro. Realmente, a iguaria faz a fama da casa. Os bolinhos estão sempre fresquinhos na estufa do bar. Apesar disso, o meu tira-gosto preferido no Bar do Zé é a porção de quibinhos (R$ 32,90).

É um quibe que, na verdade, parece mais um bolinho de carne. A começar pelo formato, eles são redondinhos e fogem do estilo zeppelin. O salgado é produzido exclusivamente pelas mãos de Anésio, o cozinheiro da noite. É dele a proporção entre trigo e carne, segredo que deixa o quitute com o miolo desmanchando. Você sente o sabor do trigo e não percebe os grãos. É realmente sedutor! Desafio alguém a comer um só. São perfeitos para acompanhar a cerveja e curtir o último boteco raiz da Maria Antônia.

Bar e Café Faculdade (Bar do Zé)

  • Quando De seg. a sex., das 5h30 às 0h30
  • Onde Rua Maria Antônia, 216, Vila Buarque
  • Tel. (11) 3257-8882

Bom de Garfo

Otavio Valle, 48, é formado pela Unesp (Universidade Estadual Paulista) e pós-graduado em fotografia pelo Senac, mas a vida de jornalista o fez especialista em "botecologia", pela universidade "Bares da Vida".

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