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Celebridades
Descrição de chapéu The New York Times

Aubrey Plaza estreia no teatro após se tornar uma das atrizes mais requisitadas de Hollywood

Aos 39 anos, atriz de 'The White Lotus' aceitou convite do amigo Christopher Abbott para peça

Aubrey Plaza posa para retrato em Los Angeles - Chantal Anderson/The New York Times
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Julia Jacobs
Los Angeles
The New York Times

"Oh, vá em frente. Goela abaixo", disse Aubrey Plaza enquanto comia pizza no café da manhã, em um restaurante que estava quase deserto na região central de Los Angeles, em uma manhã de sexta-feira no final de agosto.

Seu colega, Christopher Abbott, estava avaliando a ampla oferta de carboidratos, laticínios, prosciutto e café espalhada sobre a mesa, classificando-a como "um pesadelo para o intestino".

"Você tem pílulas de fibra no carro. Por que não vai buscá-las?", provocou Plaza, deflagrando uma torrente de objeções de Abbott antes que ela se retratasse apressadamente. "São minhas pílulas, são minhas. Eu as tomo."

Quatro anos depois de se conhecerem no set de filmagem do thriller cômico "Black Bear", os atores estão trabalhando juntos novamente, desta vez em uma versão off-Broadway de "Danny and the Deep Blue Sea", peça de John Patrick Shanley na qual eles retratam desconhecidos que se tornam amantes depois de se conhecerem em um bar no Bronx.

Plaza está fazendo seu primeiro trabalho em teatro, na peça que estreia em 30 de outubro no Lucille Lortel Theater, no West Village, e a única pessoa com quem ela conseguia se ver dividindo o palco, na obra que só envolve dois atores, era Abbott, um profissional experiente com quem ela compartilha tanto uma simetria artística quanto uma amizade estreita e brincalhona.

Depois de anos provando que era capaz de muito mais do que novas versões de April Ludgate, a estagiária imperturbável e carrancuda que ela interpretava na série "Parks and Recreation", Plaza, 39, se tornou uma das atrizes mais requisitadas de Hollywood. Seu desempenho como uma advogada insatisfeita, na segunda temporada de "The White Lotus", na HBO, foi um dos favoritos do público, e seu papel como uma golpista em ascensão no thriller cinematográfico "Emily, A Criminosa" foi elogiado pelos críticos por sua ferocidade e nuanças.

Ao mesmo tempo, ela atingiu um nível de celebridade no qual, para alguns, ela se tornou menos conhecida por sua associação com qualquer personagem específico do que por ser ela mesma: uma queridinha da internet conhecida por fazer comentários absurdos, e ocasionalmente sinistros, com uma expressão imperturbável que leva os espectadores dos talk shows a não saber bem se ela está ou não falando sério.

Em Abbott, 37, que interpretou um namorado frustrado que passa por uma virada soturna em "Girls", série de humor da HBO, Plaza encontrou um colega que parece saber exatamente quando ela está brincando, e que adere alegremente às esquisitices pelas quais ela se tornou conhecida.

Enquanto ponderava o cardápio, Abbott respondeu com um sotaque italiano exagerado quando Plaza decidiu fingir ser italiana, e depois testou em voz alta o sotaque rude do Bronx que usaria na peça. "Você quer ouvir como estou falando?", disse Abbott, forçando a voz. "Estou tentando fazer um tipo de Andrew Dice Clay."

"Ele se importa, mas também não se importa; é a melhor receita para um parceiro de cena, no meu caso", disse Plaza, que parecia uma estrela de cinema da metade do século 20, com cabelos levemente encaracolados, à altura dos ombros, e óculos escuros empurrados para o topo da cabeça. "É divertido, é bom e é seguro. Também gosto de jogar coisas pela janela, rir, brincar e não levar tudo tão a sério. É uma combinação difícil de encontrar."

O sentimento é mútuo. "Nós dois não temos medo de sermos feios, esquisitos e estranhos", disse Abbott, que começou sua carreira de ator profissional há 15 anos, em uma produção off-Broadway de "Good Boys and True", de Roberto Aguirre-Sacasa, sobre um escândalo em uma escola preparatória.

A primeira peça de Plaza como atriz profissional não é nada fácil. Sua personagem, Roberta, é uma divorciada solitária que está desesperada por amor, mas acredita que merece castigo e nada mais; o personagem de Abbott, Danny, é um bruto solitário que começa brigas por causa da menor das ofensas. Juntos, eles entram em um ciclo de gritos, choro, tapas, agressões e troca de insultos chulos. Há também beijos, abraços, toques carinhosos e reflexões sobre um amor de conto de fadas.

Os planos para a peça foram solidificados bem antes de os escritores e atores de Hollywood entrarem em greve, o que resultou na paralisação de todo o setor. Há mais de um ano, o ator Jeff Ward ("Marvel’s Agents of S.H.I.E.L.D."), que está dirigindo "Danny and the Deep Blue Sea", apresentou a ideia a Abbott, com quem ele já dividiu um apartamento. Abbott aceitou imediatamente e, ao ler a breve descrição de Roberta no texto de Shanley, pensou em Aubrey.

"Não quero parafrasear, mas era algo como...", começou Abbott. "Sexy... Linda... quebrada?", sugeriu Plaza. Na verdade, foram os "olhos brilhantes e nervosos" de Roberta que o fizeram pensar em Plaza para o papel.

Se não fosse pela greve, Plaza teria passado boa parte das últimas semanas filmando "Animal Friends", ao lado de Ryan Reynolds e Jason Momoa. Abbott estaria viajando ao Festival de Cinema de Veneza, para a estreia da comédia surrealista "Pobres Criaturas" (premiada com o Leão de Ouro) e Ward estaria no Japão promovendo a série de mangá live-action "One Piece". Aconteceu que, em meio à greve, os atores e seu diretor tiveram tempo para simplesmente conversar sobre a peça e o que poderiam fazer com ela.

"Parece que o ingrediente secreto para tudo isso pode ser o tempo", disse Ward. "Um pouco mais de tempo."

Parte daquilo em que eles estão trabalhando é uma ideia que Ward disse que lhe ocorreu anos atrás, quando ele e Abbott moravam em Bushwick. Eles se conheceram há cerca de 14 anos em um teste para uma peça: Abbott ficou com o papel, enquanto Ward foi contratado como seu substituto. Nas festas, Ward, um entusiasta da dança experimental, notou que Abbott era um bom dançarino e pensou que um dia eles poderiam colaborar em algo que envolvesse movimento.

Então, no ano passado, enquanto pensava em maneiras de incorporar coreografia a uma produção de "Danny and the Deep Blue Sea", Ward apanhou uma cópia do texto que trazia o título completo da obra: "Danny and the Deep Blue Sea: An Apache Dance".

O subtítulo é uma referência a um estilo de dança francês, desenvolvido na forma de um popular número de cabaré no início dos anos 1900, que mistura um tipo sedutor de tango com uma violenta batalha doméstica na qual os dançarinos arremessam uns aos outros pelo palco, entre momentos de interlúdio amoroso.

Era uma referência cultural pop comum nas décadas de 1950 e 1960, quando Shanley estava crescendo no leste do Bronx. A dança aparece em filmes antigos como "Can-Can", com Shirley MacLaine; desenhos animados como "Louvre Come Back to Me!", com Pepé Le Pew; e sitcoms como "I Love Lucy". Na primeira temporada desta última série, Ethel Mertz a descreve como aquela dança "em que o francês durão agarra a garota pelos cabelos, a joga por cima do ombro e derruba no chão, e aí pisa nela".

Qualquer leitor do roteiro perceberá rapidamente o que Shanley queria dizer com o subtítulo. Depois que Danny e Roberta se conhecem, seus encontros oscilam entre o afeto desesperado e a agressão instintiva e incontrolável (Shanley baseou a propensão de Danny para pugilatos em suas próprias tendências adolescentes).

"Coloquei aquilo para dar alguma orientação sobre como a peça poderia ser encenada", disse Shanley sobre o subtítulo, em uma entrevista por telefone. "É realmente sobre a vida interior dessas duas pessoas e como elas se encontram e explodem ao se tocarem."

Shanley, que já ganhou um Oscar (por "Feitiço da Lua") e um Tony (por "Doubt: A Parable" [Dúvida: Uma Parábola], que será remontada em fevereiro com um elenco estelar na Broadway), deu a Ward, diretor estreante, sua bênção para reviver "Danny and the Deep Blue Sea". A peça estreou em 1984 no Humana Festival em Louisville, Kentucky, com John Turturro e June Stein, antes de ser transferida para Nova York (em sua crítica no New York Times, Mel Gussow escreveu que a peça "é o equivalente a assistir da beira do ringue uma luta de boxe que termina em um abraço amoroso"). Shanley também autorizou Ward a desenvolver movimentos que vão além das instruções de palco da peça, embora tenha dito que se manifestaria caso não gostasse dos acréscimos.

Esses acréscimos serão coreografados por Bobbi Jene Smith e Or Schraiber, cujos movimentos gestuais, às vezes simplórios, retratam a vida interior de um casal com uma intimidade que quase faz com que os observadores sintam que estão testemunhando algo que não deveriam.

Para Abbott e Plaza, cuja formação em dança envolve alguns passos de dança irlandesa quando criança, um senso de voyeurismo é exatamente o que eles querem que o público sinta quando Danny e Roberta se apaixonam de forma louca e improvável.

"Estamos fazendo essa peça todas as noites para o público, mas acho que também temos que fazê-la um para o outro", disse Abbott, que parecia seguir o figurino do personagem, com uma camiseta branca e um colar de corrente, e uma tatuagem de anzol visível em seu antebraço. "Queremos entreter o público, mas eu, pessoalmente, quero entreter Aubrey."

"Acho que também gosto de entretê-lo", disse Plaza, adotando uma voz como a de um refém lendo uma resposta forçada, antes de abrir um sorriso.

Plaza e Abbott cresceram longe da máquina de Hollywood: ela em Delaware, ele em Connecticut. Ambos desenvolveram seu amor por filmes trabalhando em locadoras de vídeo e, depois de decidir que queria ser atriz, quando criança, Plaza começou no entretenimento como estagiária de cenografia do programa "Saturday Night Live" e pajem da NBC. Abbott descobriu a atuação mais tarde, em um curso de teatro em uma faculdade comunitária local, o que o levou a abandonar o curso e se mudar para Nova York a fim de estudar atuação mais seriamente.

Mais de 15 anos depois, ambos os atores se tornaram rostos reconhecíveis nas telas e gradualmente se libertaram da associação aos papéis que os tornaram famosos.

Depois de "Girls", Abbott assumiu papéis complexos, muitas vezes torturados, em filmes como "James White", sobre um homem desempregado que enfrenta o peso da doença terminal de sua mãe, e "Sanctuary", sobre um herdeiro de hotel determinado a romper com sua dominatrix de longa data. Em um de seus papéis de maior destaque, ele estrelou como John Yossarian, bombardeador da força aérea, na adaptação televisiva do romance "Catch-22".

"Ele tem um lado explosivo", disse Shanley sobre Abbott. "Há sempre uma sensação de instabilidade e perigo."

Depois de "Parks and Recreation", Plaza apresentou o "Saturday Night Live", recebeu sua primeira indicação ao Emmy por sua atuação em "White Lotus" e se tornou produtora para ter mais controle sobre roteiros que a atraem muito, entre os quais "Emily, A Criminosa" e "Ingrid Vai para o Oeste", em que interpreta uma perseguidora obcecada pelo Instagram. Ela se afastou do conforto das comédias independentes de humor maldoso para assumir um papel glamouroso, de heroína armada, no filme "Esquema de Risco: Operação Fortune", e recentemente realizou o sonho de trabalhar com Francis Ford Coppola em seu aguardado épico "Megalopolis".

"Black Bear", um filme dentro de um filme ambientado nas montanhas Adirondack, foi um desses roteiros que Plaza correu a aceitar, tornando-se produtora e atriz principal ao lado de Abbott.

"Infelizmente, não podemos falar sobre esse filme", disse Plaza, citando a greve continuada do SAG-AFTRA, o sindicato dos atores, que proíbe os atores de promover filmes e programas de TV que já foram concluídos (Plaza fez piquete no mês passado ao lado de um cavalo miniatura chamado Li'l Sebastian, uma celebridade local na cidade de Indiana que serve de locação a "Parks and Recreation").

Mas, no thriller psicológico em questão, há indícios do que poderia acontecer no palco em "Danny", incluindo a luta de Abbott, às desordenada, com a masculinidade de seu personagem, o talento de Plaza para retratar pessoas perturbadas e os momentos de intimidade crepitante entre eles.

O relacionamento de seus personagens em "Black Bear" muda de forma: no início, Abbott, um futuro pai, não consegue reprimir sua atração por uma hóspede (Plaza), apesar da presença de sua namorada grávida. Na segunda metade do filme, os papéis das mulheres são invertidos, e Plaza é a cônjuge torturada pelo ciúme, acabando por sofrer um ataque de raiva e desesperança.

"Com base em 'Black Bear', ficava claro que seria elétrico. Não havia necessidade de os dois aprenderem a se conhecer", disse Ward. "Há algo na maneira pela qual eles combinam."

Os dois atores encontraram "Danny and the Deep Blue Sea" pela primeira vez na escola de teatro —o que não é incomum, já que a peça, que oferece amplas oportunidades de cenas intensas, é uma das favoritas das aulas de teatro e das audições. O ator Sam Rockwell, um dos produtores da remontagem, recorda ter feito cenas da peça em audições para "Noites Violentas no Brooklyn" (ele conseguiu o papel) e "O Poderoso Chefão 3" (não conseguiu).

Abbott procurou Plaza para oferecer o papel sem saber se ela estaria disposta a fazê-lo. Embora ela tenha atuado em teatro comunitário quando criança —"De Ilusão Também se Vive" e "Cinderela", em que interpretou uma das irmãs da protagonista— e treinado em improvisação na Upright Citizens Brigade, a experiência seria algo totalmente novo.

Mas depois que Plaza leu a peça, ela sabia que eles tinha de fazê-la. "Eu chorei. Dei risada. Adorei", disse.

Apesar de sua onipresença, a peça teve apenas uma outra produção fora da Broadway desde sua estreia —em 2004, estrelada por Adam Rothenberg e Rosemarie DeWitt— e nunca foi encenada na Broadway.

Em entrevista por telefone, Rockwell disse que sugeriu que a produção continuasse assim, pelo menos por enquanto, embora a fama de Abbott e Plaza tenha o potencial de gerar vendas de ingressos na Broadway. "Acho que muitas peças fracassaram na Broadway porque, na verdade, foram feitas para ficar fora da Broadway", disse Rockwell, que está trabalhando no espetáculo com seu parceiro de produção, Mark Berger. "Elas tinham aquela qualidade descolada."

Afinal de contas, "Danny and the Deep Blue Sea" não é o tipo de história inspiradora e afirmativa que provavelmente levaria os espectadores a comprar camisetas do espetáculo ou a irem ao teatro com os filhos. Trata de duas pessoas danificadas e repletas de vergonha que tentam encontrar uma saída para a própria miséria.

"Existem vários tipos de histórias de amor, e esse é apenas um deles", disse Plaza. "Não gosto da ideia de que toda obra de arte que exista precise conter algum tipo de comentário social ou mensagem política. É uma peça de teatro. São personagens."

Apanhando a fatia de pizza restante, Abbott concordou —"a melhor resposta para a pergunta 'por que agora?' é sempre do tipo 'por que não?'"— e explicou que, assim como Plaza, aprendeu ao longo dos anos a se importar com o trabalho sem se preocupar com o benefício que traria para sua carreira.

"Não sei –é só algo que quero fazer", disse Abbott. "Deixei de lado a questão do que isso vai fazer por mim."

Plaza olhou para a crosta de pizza, coberta de migalhas. Ela trazia desenhos de corações e a frase "Happy Galentine's Day" [Feliz Dia dos Gamorados], uma referência a uma cena da série "Parks and Recreation" que fez sucesso suficiente para se tornar um feriado real.

"Isso é uma pegadinha?", ela perguntou, virando-se para ver se alguém poderia estar por trás daquilo. "É como se eu não conseguisse escapar. Estou tentando fazer uma peça. Não posso simplesmente fazer uma peça sem que alguém me lembre de que um dia trabalhei na TV aberta?"

Tradução de Paulo Migliacci

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