Marco Nanini lembra cenas, improvisos e crises de risos com Marília Pêra em 'Brega & Chique'
Ator diz ter dúvidas se humor ingênuo da trama de 1987 faria sucesso nos dias de hoje
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Rafaela, papel interpretado por Marília Pêra (1943-2015) em "Brega & Chique" (Globo, 1987), olha para a câmera e começa a avaliar o seu rosto, como se estivesse olhando para um espelho. Ela comenta com Montenegro, personagem de Marco Nanini: "Que coisa triste, olha aqui. Eu tô com uma...estou com um papinho aqui, está vendo?"
Ele concorda, mas logo se surpreende ao fazer uma análise do seu próprio rosto: "Meu Deus! Eu também estou, Rafaela (...) Mas não é nenhum problema isso aí, a gente pega um cirurgião, corta e manda para o inferno essa papada." Nos próximos minutos, os dois discutem quanto custaria uma plástica na região. Rafaela chuta US$ 5.000 no caso dela, e US$ 10 mil para ele.
A cena hilária, que entrou para a história da teledramaturgia brasileira, sintetiza o tipo de humor que caracterizou "Brega & Chique", novela de Cassiano Gabus Mendes (1929-1993), que volta a ser reprisada a partir desta quarta-feira (19), no Viva, às 14h30. A trama vai substituir "Selva de Pedra" (Globo, 1985).
"Nós tínhamos muitas crises de riso nas gravações, e o Jorginho [o diretor Jorge Fernando, morto em outubro de 2019] deixava passar, como se fosse parte da novela. Até cena ele inventava, como essa, em que eles ficavam na frente de um espelho vendo quem mais precisava de plástica", relembra Marco Nanini.
Para o ator, o texto de Cassiano Gabus Mendes, que conseguia a seu ver fazer uma "comédia pastelão, mas com muito bom gosto" também foi fundamental para a trama cair no gosto do público. "Brega & Chique", que era exibida na faixa das sete, foi o grande sucesso de audiência de 1987, superando inclusive a novela das oito, "O Outro", de Aguinaldo Silva.
Questionado se um remake da novela poderia fazer sucesso hoje, Nanini diz que tem dúvidas porque a trama, segundo ele, tem um humor ingênuo para os tempos atuais. "Mesmo quando tinham cenas mais fortes era amenizado pelo humor que era proveniente claramente da chanchada, que a gente fazia como alusão", diz o ator.
Como exemplo disso, ele cita outra cena famosa da história quando Montenegro está conversando com Rafaela, enquanto ela limpa a casa, e sua gravata é sugada pelo aspirador, quase o asfixiando.
O enredo de "Brega & Chique" tinha uma premissa simples. Uma mulher rica que ficava pobre, a Rafaela de Marília Pêra, e uma pobre que ficava rica: Rosemere da Silva, personagem de Glória Menezes. Sem saber, as duas eram casadas com o mesmo homem, o empresário Herbert, vivido por Jorge Dória (1920-2013).
Logo no início, para escapar da falência, ele simula a própria morte e foge do país. Sem dinheiro, Rafaela e os filhos vão morar na mesma vila em que já vive Rosemere. Para a segunda família, porém, Herbert deixa uma boa quantia em dólares. A trama tem uma grande reviravolta quando Herbert volta, mas com um novo nome e rosto (após uma cirurgia plástica). É Cláudio Serra, interpretado por Raul Cortez (1932-2006).
Montengro, papel de Nanini, era o secretário de Herbert, o único que sabia a verdade sobre a história do patrão. Muito fiel e subserviente ao empresário, mas ao mesmo tempo apaixonado por Rafaela, ele fazia de tudo para ajudar a dondoca depois da falsa morte do seu marido.
O ator conta que foi um dos últimos a ser escalado para a trama. Até então, ele nunca tinha trabalhado com o autor Cassiano Gabus Mendes, mas ambos estabeleceram um diálogo por meio da novela. "A gente ia conversando pelas cenas, era muito legal, porque eu não precisava falar com ele, nem ele comigo. Ele simplesmente escrevia, e eu ia fazendo, e deu certo", conta.
Nanini, que está de férias da TV desde o fim de "A Dona do Pedaço" (Globo, 2019), diz que pretende rever a reprise de "Brega & Chique". "Era uma época muito gostosa e uma novela que eu guardo boas lembranças."
NU COM A MÃO NO BOLSO
Ao som da música "Pelado", do Ultraje a Rigor, a abertura de "Brega & Chique" foi motivo de polêmica na época. Criada por Hans Donner, ela é lembrada até hoje por mostrar o modelo Vinícius Manne com a bunda de fora, seguindo literalmente o refrão da canção "Pelado, pelado, nu com a mão no bolso".
Em princípio, a censura implicou com a nudez e pediu que as nádegas fossem cobertas com uma folha de parreira. A Globo cumpriu a ordem e mudou a abertura para o segundo capítulo da trama. Mas os censores acharam que a folha deveria ser maior.
Após negociações, a versão original foi liberada e voltou a ser exibida. Se fosse hoje, o ator Marco Nanini diz acreditar que pediriam para colocar "uma trepadeira de uvas na frente [do bumbum] para ficar bem escondido".
"Eu acho que está pior que em 1987, porque há um moralismo muito grande, muito belicoso, uma coisa parcial... não sei. A gente vê uma obra de arte, uma comédia ou mesmo uma novela, cada um vê com seus olhos e é, por isso, que é bonita a arte. Você vai numa exposição e você interpreta aquilo...Mas o tempo não é para isso [hoje]", diz.
Segundo ele, há uma patrulha maior, inclusive, vinda do próprio presidente Jair Bolsonaro (sem partido). "É uma época mais triste", afirma.