Internautas desinformados se revoltam com Faustão, que não furou a fila do transplante
Apresentador recebeu um coração neste domingo (27), em São Paulo
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Não importa quando Fausto Silva recebesse um coração para transplante: se hoje, daqui a um mês ou daqui a um ano e meio. Sempre haveria muita gente nas redes sociais gritando indignada que ele furou a fila. O apresentador é, de longe, o mais famoso brasileiro a precisar de um transplante de coração. Talvez também seja o mais rico.
Essa notoriedade toda gerou uma onda de solidariedade em torno de seu nome, desde que foi anunciado que ele havia entrado na fila de espera por um coração, onde já estavam quase 400 pessoas. Só que, imediatamente, também começou a especulação na internet: por ser milionário, famoso e muito bem conectado, Faustão acabaria recebendo o órgão muito antes que os pacientes mais pobres.
A "profecia" se autorrealizou neste domingo (27), quando Faustão foi operado em São Paulo. As redes sociais logo se encheram de mensagens desejando pronta recuperação ao apresentador, mas a quantidade de postagens desconfiadas, para não dizer francamente furiosas, também foi avassaladora.
É compreensível. O Brasil ainda é o país do pistolão, do jeitinho, do "você sabe com quem está falando?". Nossos serviços públicos melhoraram um pouco, mas ainda são precários. Além do mais, a Justiça costuma pegar leve com os poderosos, enquanto manda ladrões de galinha para a cadeia.
Acontece que ninguém furou a fila, que é organizada pelo SUS. A ordem de chegada não é o único critério. Também conta, e muito, o estado de saúde do paciente, e o de Fausto Silva era de fato gravíssimo.
Além do mais, o coração precisa ser compatível com o peso, a altura e o tipo sanguíneo do receptor. O de Faustão é o B, muito mais raro do que o A. Para completar, existe o fator tempo: um coração sobrevive de quatro a seis horas fora de um corpo. É complicado despachá-lo para longas distâncias, mesmo de avião.
Mas não adianta explicar nada disso para quem está imbuído de ira santa. Muitos internautas lembraram de MC Marcinho, que morreu no sábado (26). Só que o caso do funkeiro carioca era completamente diferente: ele tinha diversas comorbidades, como diabetes e doença renal, e ainda foi acometido por uma infecção generalizada, o que inviabiliza qualquer cirurgia. O tribunal da internet não quer nem saber.
O SUS talvez seja a melhor instituição pública deste país. É sério, tem capilaridade, e alguns dos melhores médicos brasileiros atendem lá, sem cobrar o doente. As filas de espera por transplantes evitam que os órgãos sejam comercializados no mercado paralelo. Nelas, os pacientes são identificados por números, não pelos nomes, para impedir qualquer tipo de favorecimento pessoal.
O Brasil é o segundo país que mais realiza transplantes no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Mas o número de doadores ainda é muito baixo, em relação ao tamanho da nossa população. A falta de órgãos disponíveis continua sendo um enorme obstáculo.
Pois fica aqui minha sugestão: que tal se, ao invés de reclamar de uma injustiça imaginária, você doasse os SEUS próprios órgãos? A primeira coisa é avisar a família sobre a sua vontade. Não é preciso assinar nada nem registrar nenhum documento em cartório. Mas sua família precisa estar ciente, e de acordo.
Quando as doações aumentarem, as filas irão diminuir, e celeumas como esta, em torno de Fausto Silva, cessarão de existir.