Tony Goes
Descrição de chapéu Eleições 2022

Apesar da repercussão, apoio de famosos parece não ter virado muitos votos para Lula

Boa parte do eleitorado parece imune aos apelos da classe artística

Bruna Marquezine, Malu Mader, Sérgio Guizé e Preta Gil fazem campanha para Lula - Reprodução/ alinnemoraes

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São Paulo

"A Fátima Bernardes virou o voto da minha mãe e da minha avó!". "Minha mãe mandou o vídeo da Fátima no grupo do zap e já virou dois votos". "Fátima virou os votos de todas as mulheres de meia idade, agora vai dar Lula com 70%!"

Mensagens como esta se espalharam pelo Twitter na tarde de sábado (1º), depois que a apresentadora Fátima Bernardes fez algo inédito em sua carreira: divulgou um vídeo explicando por que escolheu votar em Lula no primeiro turno.

A notícia causou um impacto imediato. Aqui no F5, ainda é a terceira mais lida no momento em que escrevo esta coluna, na manhã de segunda (3). Nem era para menos: Fátima tem uma enorme credibilidade, seus argumentos são sólidos e ela nunca havia se manifestado politicamente antes.

Não foi a única. Angélica também declarou voto em Lula, para surpresa de muita gente –afinal, ela é casada com Luciano Huck, que já foi muito crítico ao ex-presidente. Xuxa foi outra. Ivete Sangalo também deixou de ser isentona e engrossou o coro de cantoras a favor do petista, ao lado de Anitta, Pabllo Vittar, Ludmilla, Duda Beat, Luísa Sonza e muitas outras.

Ciristas históricos como Caetano Veloso, Tico Santa Cruz e Fábio Porchat abandonaram o candidato do PDT e aderiram ao voto útil em Lula, na tentativa de elegê-lo presidente logo no primeiro turno.

Juntaram-se a uma lista caudalosa de artistas, influenciadores e jornalistas, muito mais longa que a dos que apoiam a reeleição de Bolsonaro: Taís Araújo, Lázaro Ramos, Paolla Oliveira, Felipe Neto, Rachel Sheherazade, Bruno Gagliasso, Giovanna Ewbank, Camila Pitanga e até mesmo Marcelo Serrado, um entusiasta da operação Lava-Jato quatro anos atrás.

Cada um desses nomes ganhou as manchetes na hora em que declarou seu voto, e enorme repercussão nas redes sociais. Parecia que estava se formando um tsunami em favor do ex-presidente, capaz de convencer os indecisos e os eleitores de Ciro Gomes e Simone Tebet a votar em Lula.

Não foi bem isto o que aconteceu. Lula teve uma votação expressiva, mas insuficiente para liquidar a fatura no primeiro turno: 48,4% dos votos válidos, dentro da margem de erro dos principais institutos de pesquisa. As celebridades devem mesmo ter virado vários votos, mas não o bastante.

Porque existe um público imenso que não só resiste a elas como também, aparentemente, aos fatos. Jair Bolsonaro teve 43,2% dos votos válidos, muito mais do que o previsto. Em termos numéricos, recebeu mais votos do que no primeiro turno de 2018 –ou seja, ganhou eleitores, mesmo tendo atrasado a compra de vacinas, incentivado a destruição da Amazônia e trazido o Brasil de volta ao mapa da fome.

Esse resultado leva a duas conclusões. A primeira é que a ideologia, pelo menos neste momento, é mais forte do que a realidade. A "luta entre o bem e o mal" parece ter repercutido muito mais entre boa parte do eleitorado do que dados concretos como a inflação e as mortes na pandemia.

A segunda é que a classe artística tem muito menos influência do que aparentava e ainda sofre com a demonização que sofreu nos últimos anos. Muitos eleitores acreditam que quase todos os artistas queiram viver pendurados nas tetas do governo, uma campanha de desinformação muito bem-sucedida.

O poder de convencimento dos famosos também empalidece se comparado ao das igrejas evangélicas. Ainda não há pesquisas sobre o assunto, mas o senso comum indica que a adesão incondicional de muitas denominações religiosas ao bolsonarismo foi crucial para o bom desempenho do presidente.

Agora teremos segundo turno, e é de se esperar que ainda mais artistas, atletas, youtubers e similares se engajem na campanha de Lula. Outros tantos declararão apoio a Bolsonaro, agora sem a vergonha que existia antes. Mesmo assim, é para lá de duvidoso que qualquer um deles faça alguma diferença.

Já sabíamos há algum tempo que a fama não garantia que alguém fosse eleito, haja vista a quantidade de ex-BBBs, atores pornô, subcelebridades e até mesmo atores consagrados (alô, Lucélia Santos) que fracassaram em suas tentativas de engatar uma carreira política.

Agora ficou claro que até mesmo o poder de convencimento da classe artística é relativamente limitado. O Brasil mudou, e ainda não sabemos direito para onde.