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Hebe representada na Globo não é a da vida real, dizem pessoas próximas à apresentadora

Morte da apresentadora completa oito anos nesta terça-feira

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São Paulo

A série "Hebe" termina nesta quinta-feira (1º) na Globo, após dez episódios que retrataram a vida da apresentadora desde a juventude em Taubaté, no interior de São Paulo, até o estrelato na televisão brasileira, na capital paulista. Quem dá vida à "gracinha" é a atriz que na última quinta-feira (24) foi indicada ao Emmy, o maior prêmio da TV mundial, na categoria Melhor Atriz.

Criticada pelo único filho de Hebe, Marcello Camargo, a trama com roteiro de Carolina Kotscho e direção de Maurício Farias mostra um lado diferente da apresentadora alegre que costumava dominar a TV nas noites de segunda-feira.

Ao admitir se tratar de "uma obra de ficção livremente inspirada na vida da apresentadora Hebe Camargo", a série revela uma mulher que fez aborto ao engravidar do empresário Luís Ramos (Daniel de Oliveira), vira dona de casa e abandona a carreira a pedido do primeiro marido, Décio Capuano (pai de Marcello, interpretado por Gabriel Braga Nunes), sofre violência doméstica, se defende das brigas provocadas pelo ciumento Lélio Ravagnani (Marco Ricca), tem adoração pelo cantor Roberto Carlos e vive relação carinhosa com Marcello (Caio Horowicz) e com o sobrinho Cláudio Pessuti (Danton Mello), que também era seu empresário.

A ficção aborda, ainda, as questões que ela enfrentava em seu trabalho na TV, como a censura imposta a seu programa ao vivo por militares e por políticos. Mas também mostra momentos divertidos, como o furacão Menudo, quando Hebe usa um portunhol bem ruim para entrevistar os músicos, e o "selinho" em Rita Lee, lançando ali uma espécie de tradição. "Meu namoro com o Lélio começou assim", disse a apresentadora à roqueira.

A reportagem tentou falar com Marcello para saber o que é real e o que é ficção na série, sem sucesso. Mas ele comentou o assunto no programa que comanda no YouTube, Café com Selinho, onde admite que a trama retrata de forma fiel o início da carreira da mãe (nessa fase interpretada por Valentina Herszage) e a censura sofrida por ela. Marcello, porém, contesta veementemente que Hebe tomasse uísque ("ela odiava"), diz que ela realmente perdeu um brinco caríssimo porque o colocou em um vaso ("mas nunca ninguém falou em chamar a polícia") e que ele e o padrasto se davam bem.

"Conheci ele em 1973 em um restaurante perto da [avenida] Paulista, quando estava jantando com a minha mãe, e ele, que eu nem sabia quem era, se aproximou. Eu tinha oito anos e ele era grandão, vermelho. Eu, criança, fiquei com medo. Não via a hora de ele sair dali da mesa. Mal sabia que ele ia ser meu padrasto", conta Marcello no programa.

"Mas não tínhamos uma relação tão ruim como o filme [a série] mostra, parece uma coisa de ódio. No começo me dava muito bem com o Lélio, ele gostava de futebol e loteria esportiva, fazíamos os jogos juntos. Era bacana", conta. "Quando fiz 18 anos, ganhei dele um carro e meu pai nem ficou com ciúme, porque era pão duro [risos]. Mas depois a minha relação [com Lélio] foi se deteriorando por causa das brigas. Eu era adolescente, quem gosta de ver alguém gritar com sua mãe? Agora, violência física, bater, não."

HEBE SOLIDÁRIA

Produtora executiva do programa de Hebe no SBT por 23 anos, Regina de Souza, que preferiu não revelar a idade, também contesta a série por, segundo ela, exibir a apresentadora bebendo uísque e não mostrar o lado solidário da artista.

"A Hebe era muito alegre, mas na série ela está muito carregada. Acho que tem muita coisa que não existiu [citadas na série]. Nunca a vi de ressaca. Ela gostava de tomar champanhe e vodca, mas jamais bebeu no camarim ou no programa. Nos últimos anos, ela pedia água de coco."

Regina conta que Hebe --famosa por usar joias, roupas e sapatos de luxo-- ajudava muitas pessoas. Uma vez, nos anos 1990, numa época de frio, ela afirma que a chefe pediu que ela comprasse cem cobertores.

"Hebe botou tudo no carro dela e saiu distribuindo nos faróis. Ela se sensibilizava com as pessoas morando nas ruas. Ela também pagou tratamento de funcionários, ajudou outros a construírem suas casas, comprou camas hospitalares e ajudava com enterros. Ela era assim."

Regina, contudo, elogia a série por usar itens pessoais que realmente pertenceram a Hebe. "Achei positivo, porque ajuda o artista a entrar mais na personagem. E também é uma forma de trazer um pouco da Hebe e da personalidade dela."

No início de 2010, Hebe foi diagnosticada com câncer. Regina conta que, pouco depois, a produção decidiu homenagear o aniversário de 82 anos da apresentadora, em 8 de março. "Fizemos um programa especial com Xuxa, Ana Maria e Marília Gabriela na primeira fila. Ela amava essas mulheres. Na plateia, estavam de Carlos Alberto [de Nóbrega] a artistas que faziam novela. Ela estava com uma roupa prateada, foi lindo."

Hebe morreu dois anos depois, em 29 de setembro de 2012. Sua morte completa, hoje, oito anos.

JANTAR EM CASA

Hebe era festeira e, segundo Regina de Souza, gostava de levar convidados que ela admirava para jantar em sua casa. A produtora executiva do programa no SBT conta, ainda, que Hebe adorava a cantora inglesa Sarah Brightman e a convidou para jantar em sua casa, na Cidade Jardim (zona oeste de São Paulo), após o programa de que ela participara.

"Nós chegamos antes [da Sarah], e a Hebe foi se arrumar. Tirou a roupa do programa e colocou outra, ficou chique e muito bem arrumada", conta Regina. "A Sarah chaga de jeans, camiseta e uma sandália rasteira. A Hebe fala: 'Sarah, one minute, please'. Sobe as escadas, coloca um jeans turquesa rasgado, uma camisetinha que devia ter uns dois brilhos --não tinha roupa da Hebe que não tivesse brilho--, super despojada. Ela desce de rasteirinha e diz: 'Pronto, Sarah, agora estou pronta para te receber'. A Sarah ficou passada, pensou: 'que mulher é essa'."

Outro momento divertido de Hebe, diz Regina, foi quando a cantora norte-americana Dionne Warwick, de quem a apresentadora "era fã", esteve com ela no SBT. "A Hebe fazia questão de que as pessoas no programa dela estivessem como ela [elegantes]. Quando a Dionne aparece de moletom e tênis para cantar, ela me fala: 'será que ela está pensando que é ensaio?' Mas ela era ídolo, minha e da Hebe", conta. "Não podíamos mandar a Dionne embora! Mas ela não me põe nem um brinquinho? Hebe ficou abalada e pensou: 'Eu estou de Chanel para recebê-la e ela vem vestida assim?'."

Regina encerra elogiando a ex-chefe. "Ela abria o programa no palanque, falando de aposentadoria, e brigava pelos pobres e necessitados. Hebe nunca teve dimensão do tamanho dela. Mas nós, que convivemos com ela, sabemos que ela é grande demais, só ela entrevistava daquela forma e brigava pelas minorias."