A irresistível ascensão de Pabllo Vittar
Há menos de dois anos, a então desconhecida Pabllo Vittar postou seu primeiro clipe no YouTube. "Open Bar" era uma versão em português de um dos grandes hits de 2015, "Lean On", do trio americano de música eletrônica Major Lazer.
O vídeo era uma produção modesta, quase caseira: Pabllo e outras drag queens apareciam cantando e dançando ao redor da piscina de uma casa com cara de emprestada.
Neste domingo (30), às 17h, a internet brasileira parou por causa do lançamento de "Sua Cara", o novo clipe do Major Lazer, gravado no deserto do Saara. Nos vocais, duas brasileiras: a superstar Anitta e... Pabllo Vittar.
No momento em que escrevo este texto, as visualizações já passam de 13 milhões; no momento em que você lê, já devem ser muito mais. Nada mau para um filho de mãe solteira, batizado com o curioso nome de Phabullo (mas que se pronuncia "Pábulo") e criado na pobreza.
Mas não dá para ter pena de sua carreira meteórica: com apenas 23 anos, Pabllo Vittar já é a drag queen com mais seguidores no Instagram: 2,6 milhões, mais de um milhão a mais que a lendária RuPaul (e, no momento em que você me lê, também já devem ser mais).
A que se deve essa incrível ascensão? Ao talento, claro: Pabllo de fato canta bem (embora sua voz em falsete não seja uma unanimidade), e sabe se cercar dos melhores colaboradores. Mas não dá para negar que ela também tem muita sorte.
Uma de suas madrinhas é a poderosa Fernanda Lima, que comanda o programa "Amor & Sexo" (Globo). Pabllo foi a crooner da banda da atração nas últimas temporadas, ganhando exposição na maior emissora do país.
Outro padrinho é o produtor musical Diplo, que já trabalhou com Madonna e é um dos integrantes da banda Major Lazer. Diplo é figura fácil no Brasil: já veio para cá inúmeras vezes e se encantou com o funk carioca. Agora resolveu dar impulso a uma drag queen que regravou com outra letra um de seus maiores sucessos.
O momento em que vivemos também ajuda. Nossa crise política e econômica fez ressurgir uma direita ignorante, raivosa e com livre acesso às redes sociais. Guardadas as devidas proporções, lembra a conjuntura do início dos anos 1970, quando os Dzi Croquettes e os Secos & Molhados brotaram em plena ditadura militar, como uma reação ao ambiente repressivo.
Naquela época, como agora, também havia um movimento global em prol da libertação do corpo e das sexualidades. Só que hoje estamos mais politizados e conscientes, longe do desbunde inconsequente de então.
Pabllo Vittar é uma figura de proa da onda "queer" que invadiu a música brasileira. Por enquanto, foi a única que emplacou uma música fora do circuito cult: "Todo Dia", um dueto com o rapper Rico Dalasam, que foi um dos hinos do último Carnaval.
Sua insistência em se dizer drag queen --e não trans-- também é corajosa. Por incrível que pareça, drags vêm sendo criticadas por trans nos Estados Unidos: são acusadas de covardes, pois ainda desfrutam das vantagens de serem homens durante boa parte do tempo.
Mas Pabllo Vittar não está nem aí, e continua se vestindo de menino --um "menino gay e afeminado", em suas próprias palavras-- quando não está em cena. Também não se importa em ser chamada de "o" ou "a" Pabllo. Ou seja: assume a dubiedade, como a drag barbada Conchita Wurst.
Conchita ganhou o festival Eurovision em 2014. Tenho o palpite de que Pabllo Vittar chegará ainda mais longe
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