Tony Goes

Minissérie 'Feud' é um tratado sobre a rivalidade feminina

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A minissérie "Feud", que estreou neste domingo (12) no canal Fox 1, é uma boneca russa televisiva. Duas estrelas contemporâneas (Jessica Lange e Susan Sarandon) interpretam duas estrelas do passado (Joan Crawford e Bette Davis) interpretando as duas estrelas decadentes e fictícias do clássico filme de terror "O Que Terá Acontecido a Baby Jane?".

O tema explícito do programa é a rivalidade entre mulheres. Joan Crawford e Bette Davis não se davam bem desde os anos 1940, quando competiam pelos mesmos papéis e fãs. Mas a inimizade entre as duas tinha uma boa dose de marketing, assim como a disputa entre Emilinha Borba e Marlene, as rainhas do rádio brasileiro.

Jessica Lange e Susan Sarandon vivem Joan Crawford e Bette Davis na série "Feud"
Jessica Lange e Susan Sarandon vivem Joan Crawford e Bette Davis na série "Feud" - Reprodução

Também foi a forma com que Jack Warner, o chefão do estúdio Warner Bros., encontrou para domar a rebelde Davis, que exigia contratos mais generosos e flexíveis. Ou seja: para variar, duas mulheres foram postas para brigar apenas para manter o status quo econômico criado pelos homens.

"Feud" explora com maestria cada fofoca maldosa, cada farpa envenenada, que suas protagonistas dispararam uma contra a outra durante a filmagem de "O Que Terá Acontecido a Baby Jane", em 1962.

O longa foi concebido por Joan  Crawford como um retorno triunfal, depois de um tempo no ostracismo. Já com 57 anos, ela descobriu o romance de suspense em que o roteiro foi baseado e convidou sua antiga inimiga Bette Davis para o papel-título, achando que seria boa publicidade.

As atrizes Bette Davis  e Joan Crawford
As atrizes Bette Davis e Joan Crawford - Reprodução

Imediatamente, a imprensa da época começou a colocar uma contra a outra. Amargas, inseguras e rejeitadas por uma indústria que até hoje supervaloriza a juventude, Bette e Joan rodaram um filme que entrou para a história do cinema, mas romperam para sempre.

A delas talvez tenha sido a rivalidade feminina mais notória do showbiz, mas está longe de ser a única. Até hoje, os colunistas que cobrem o mundo das celebridades costumam atiçar os brios das atrizes, ainda mais se elas estiveram trabalhando na mesma produção. Nem mesmo Jessica Lange e Susan Sarandon escaparam dos relatos de que estariam se engalfinhando nos bastidores de "Feud" (e ambas já desmentiram esses boatos).

Aqui no Brasil, são frequentes as notícias de que uma famosa estrela da Globo estaria de mal com esta ou aquela colega. O curioso é que quase nunca se fala das rivalidades masculinas, como se os atores homens fossem todos grandes camaradas uns dos outros.

Essa distorção também existe longe das câmeras. A percepção antiga é a de que mulheres nunca podem colaborar de verdade, porque, no fundo, estão sempre disputando a mesma coisa: os homens.

Isso está mudando, felizmente. O inimigo comum das mulheres não são elas mesmas, mas o patriarcado. E cada vez mais gente se dá conta disto.

Assim, torna-se cada vez mais rara a frase que encerra "O Que Terá Acontecido a Baby Jane?": "Quer dizer então que, esse tempo todo, nós podíamos ter sido amigas?".

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

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