Novela da Globo dar menos audiência é o 'novo normal'
A notícia é recorrente. Quase todas as novelas da Globo estreiam com menos pontos no Ibope do que suas antecessoras. No dia seguinte, os sites e colunas especializados fazem um escarcéu: "pior resultado da história", "primeira fase será encurtada", "já estão prevendo mudanças".
O tom das manchetes costuma piorar nos dias seguintes, porque a audiência também costuma cair. E começa a busca por culpados: "o público rejeitou a trama", "há personagens demais", "o autor está velho".
Tudo isso é verdade. Mas não existe um único responsável pela largada fraca desta ou daquela novela. O que estamos assistindo, na verdade, é ao fim do domínio absoluto que este gênero exerceu sobre a TV brasileira durante mais de 50 anos.
Vejamos o caso de "Babilônia". Não há nada de profundamente errado com a nova trama de Gilberto Braga, Ricardo Linhares e João Ximenes Braga. A novela precisa de alguns ajustes, é verdade —como bem apontou meu colega Thiago Stivaletti. E a Globo já começou a executá-los, alterando até mesmo o logotipo do programa.
E no entanto, "Babilônia" ainda patina na audiência. Os evangélicos estão cantando vitória, querendo crer que está funcionando o boicote que pregaram contra a novela. Mas os problemas vão muito além de um simples beijo entre duas senhoras que se amam.
Antes de prosseguir, é bom relativizar este suposto fracasso. "Babilônia" tem alcançado 25 pontos em São Paulo (no resto do país costuma dar mais), e mais de 40% de "share" (a percentagem de televisores ligados naquele horário). Cada ponto equivale a 67 mil domicílios na Grande São Paulo.
Isto é uma audiência brutal em qualquer lugar do mundo. Um quarto da população de um país sintonizada num mesmo programa? Acho que nem na Coreia do Norte.
Mas é pouco para a Globo. A emissora precisa de um número ainda maior, para justificar os preços que cobra de seus anunciantes e cobrir seus imensos custos de produção.
Só que... O mundo mudou. Não estamos mais no final dos anos 90, uma era de esplendor para o canal, quando a concorrência na TV aberta era pífia, a TV paga ainda tinha baixa penetração e a internet apenas engatinhava.
Hoje este quadro se inverteu, e gerou um fenômeno perigoso para a Globo: seu público não está sendo reposto. As novas gerações, principalmente nas classes mais altas, ignoram não só as novelas mas a televisão como um todo. Claro que ainda consomem conteúdo, mas de maneira diferente.
Some-se a isto o desgaste do próprio gênero folhetim. O público parece cansado das histórias repetitivas com mocinhas sofredoras e vilãs maquiavélicas. E no entanto, tentativas de renovação como "Além do Horizonte" ou "Geração Brasil" não foram bem-sucedidas no Ibope.
Como não dá para contratar o Super-Homem e fazer a Terra girar ao contrário, a melhor solução é se adaptar aos novos tempos. Nunca mais reveremos os 100 pontos marcados por "Roque Santeiro" em seu último capítulo, no distante ano de 1986.
Novela da Globo dar menos audiência é o "novo normal". Precisamos nos acostumar com isto.
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