Tony Goes

Venha para o "Cabaret" de Claudia Raia

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É preciso muita coragem para subir num palco. É preciso ainda mais para subir e (re)interpretar um papel que se tornou icônico na pele de outro ator. Marco Nanini conseguiu tal façanha há alguns anos, quando se atreveu a estrelar uma remontagem de "O Bem Amado".

Eu achava que jamais iria desassociar Odorico Paraguaçu de Paulo Gracindo, mas Nanini fez a escolha certa: criou um coronel totalmente seu, diferente do consagrado pela TV, mas também coerente com o texto de Dias Gomes.

Claudia Raia enfrentou um obstáculo parecido no "Cabaret" que está em cartaz no teatro Procópio Ferreira, em São Paulo. Na cabeça de milhões de pessoas, Sally Bowles é Liza Minnelli e vice-versa, e ai de quem tentar imitá-la. Além do mais, Claudia não tem a vulnerabilidade que Liza transmitiu ao papel da cantora inglesa instalada na Berlim dos anos 30. Claudia é grandalhona, forte, imponente: de frágil não tem nada.

Crédito: Zé Carlos Barretta/Folhapress Claudia Raia em cena do musical "Cabaret", dirigido por José Possi Neto
Claudia Raia em cena do musical "Cabaret", dirigido por José Possi Neto

Esse tamanho todo prejudicou-a em "Sweet Charity", há alguns anos. Apesar do talento como atriz, cantora e dançarina, Clauda simplesmente não convencia como a prostituta inocente e delicada no musical baseado em "Noites de Cabiria" de Fellini. Não tem o "physique du rôle".

Achei que ela teria problemas parecidos em "Cabaret". A Sally do cinema é uma eterna sonhadora que, apesar das inúmeras porradas que levou da vida, ainda espera um amor sincero e verdadeiro. Mas a que se vê em cena em São Paulo é diferente: cínica, ácida, amarga. Sábia Claudia, que logrou fazer sua a personagem.

O espetáculo todo é sensacional. Não quero soar colonizado, mas é um sinal de maturidade teatral uma adaptação dessas ser feita no Brasil sem ser uma franquia da Broadway, que já vem pronta. O diretor José Possi carregou os números musicais de erotismo, e a versão brasileira de Miguel Fallabella para as letras das canções honra os originais de Kander e Ebb.

Claudia tem um parceiro à altura em Jarbas Homem de Mello. Experiente em musicais, o ator tem a melhor oportunidade de sua carreira como MC, o mestre de cerimônias do clube Kit Kat. E, assim como a colega, consegue brilhar sem imitar a atuação que deu a Joel Grey o Oscar de ator coadjuvante em 1972.

Menos impactante está Guilherme Magon, que substituiu Reynaldo Gianecchini no papel do escritor americano com quem Sally se envolve. Pode-se argumentar que é o personagem menos histriônico da peça e que o ator teve menos tempo para ensaiar que o resto do elenco. Mesmo assim, ele não compromete o resultado final.

"Cabaret" está lotado até a tampa e só se conseguem bons lugares pela internet, com alguma antecedência e a preços bem salgados. Mas quem gosta de musicais não pode perder. Quem gosta de Claudia Raia também não: ela transformou o maior desafio de sua carreira em seu maior triunfo.

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

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