Tony Goes

A mensagem negativa da série "Crepúsculo"

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Sei muito bem que não sou o público-alvo de "Crepúsculo". Até aí, também não sou de "Harry Potter", mas sempre gostei das aventuras do bruxinho. Já as dúvidas de Bella entre o vampiro e o lobisomem me caem muito mal. Tenho vontade de enxotar os rapazes para longe: fujam, não percam mais tempo! Existem no mundo milhões de mocinhas mais interessantes do que essa mosca morta.

Ou será que não? Afinal, outros milhões de mocinhas se identificam com Bella. Em parte é por inveja: todas gostariam de ser disputadas por dois gostosões. E em parte é porque compartilham da mesma hesitação dela. Que na verdade é o medo do sexo. Ou o medo de virar adulta, e ter que lidar com a própria sensualidade. Melhor permanecer virgem e inocente --se não para sempre, então pelo maior tempo possível.

Mas o signifcado de "Crepúsculo" vai além disto. Para a autora Stephenie Meyer, o sexo é sempre sujo e perigoso, mesmo depois do casamento. Em "Amanhecer", o capítulo final da saga --cuja primeira parte estreia hoje em metade das salas de cinema do Brasil-- Bella finalmente resolve quem é o seu amor, e se entrega a ele. Mas as consequências são terríveis.


Pare de ler por aqui se você não quer saber o que acontece. Mas os leitores da série sabem: Bella engravida do vampiro Edward, e o bebê que ela espera é um monstro. Quem achou um saco os três primeiros filmes finalmente vai se divertir um pouco. Mas a triste heroína, que tanto padeceu até chegar às vias de fato, merecia uma experiência mais gratificante. Que nada: ela foi punida, mesmo tendo se preservado até casar de papel passado.

A mensagem que Meyer parece querer passar a suas jovens e impressionáveis leitoras (duvido que muitos garotos tenham se interessado pelos livros) é simplesmente deprimente: o amor, o sexo, o casamento, a gravidez, tudo isto é um horror. Por isto prefiro mil vezes o que está subentendido em "Harry Potter": "seus poderes são inúmeros e desconhecidos, cabe a você descobri-los e usá-los".

Vou acabar vendo "Amanhecer", apesar de não ter gostado de nenhum dos filmes anteriores. Quero entender melhor esse fenômeno global. Também gosto do trabalho do diretor Bill Condon, que fez "Dreamgirls" e "Deuses e Monstros". E estou curioso para ver como ele filmou o Rio de Janeiro, a cidade que os pombinhos escolheram para sua lua de mel.

O pior é que o sofrimento está longe de acabar. De olho na bilheteria, os produtores dividiram em dois filmes o derradeiro volume da saga, e a segunda parte só entra em cartaz daqui a um ano. A patética Bella ainda vai ser um ícone cultural por um bom tempo. Pobres mocinhas, pobres de todos nós.

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

Final do conteúdo
  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Ver todos os comentários Comentar esta reportagem