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Tradições das ceias de fim de ano se mantém através do tempo, mas chefs propõem ousadia

Pratos pesados e ingredientes importados continuam em alta

Prato preparado pelo chef Aldo Teixeira
Prato preparado pelo chef Aldo Teixeira - Divulgação
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Fernanda Pereira Neves
São Paulo

Todo fim de ano é igual: trocas de presente, promessas de mudança e muita comilança. Na mesa, entra ano e sai ano, e as coisas mudam muito pouco: é peru no Natal, lentilha no Ano-Novo, uvas passas e romãs.

Para a maior parte das famílias, uma tradição pouco pensada, apenas trazida de geração em geração. “Eu mesma cozinho de tudo. Sempre tem que ter peru, pernil, doces, bolos”, afirma a pensionista Leia Hayashi, 72, que cita também a oração e a árvore de Natal com muitos enfeires. 

Mas por que pratos pouco consumidos no decorrer do ano são tão essenciais na hora da ceia? Para a historiadora Thereza Maia, uma tradição do período colonial, que se mantém ainda hoje, sem poucas atualizações. Mesmo lentilha e romã, que vêm do Oriente, chegaram ao Brasil pelas mãos dos portugueses. 

O porquê de cada prato é ainda mais fácil de explicar. Maia conta que eram ingredientes e combinações comuns em países europeus, além de compatíveis com a época do ano, que é de frio no hemisfério norte. Assim, era comum optar por assados e outas comidas pesadas. 

No caso da superstição em torno dos pratos, não há nada místico ou sobrenatural. É a aparência que dá a fama a eles, como a lentilha e outros grãos, que remetem à abundância por serem consumidos em grande quantidade, assim como a uva, que nasce em cacho, e as romãs, que possuem grande número de sementes em seu interior. 

O mesmo acontece com o frango, o peru e outras aves, que costumam ser evitadas no Ano-Novo, apesar de serem tão populares nas festas de Natal. Ao contrário do que ocorre com os grãos, esses animais costumam ciscar para trás, o que para algumas pessoas pode remeter ao retrocesso. 

Apesar dos pratos tradicionais se manterem firme nas ceias de fim de ano, algumas mudanças já aconteceram desde o final dos anos 1980. Segundo o chef Aldo Teixeira, que escreveu o livro "Cozinhando com Frutas" (R$ 78, 128 págs., DVS Editoria), isso pode ser visto no tamanho das mesas, menos fartas e mais proporcional ao tamanho das famílias e também em alguns ingredientes e pratos inseridos nos já existentes. 

“Acho que as pessoas estão ousando colocar frutas com os alimentos como forma de deixar as coisas mais leves, como o camarão com molho de uva e a farofa de damasco no peru. Também criaram as entradas, mais leves, como sopa de pepino, salmão defumado, carpaccio. Antigamente não havia entrada”, afirma ele. 

O chef de cozinha, Guga Rocha, que apresenta o programa Homens Gourmet (Fox Life), concorda que mudanças já vêm acontecendo, mas afirma que deveriam ser mais ousadas. "Porque não servir um peixe assado, uma farofa de castanha de caju. Vamos sair do lugar comum, de framboesas, morangos e cerejas, vamos servir pitanga e outras frutas da gente”, sugere ele.

"Podemos exaltar a fé, que é a proposta do Natal, com o que nós temos. É uma época de louvor e as pessoas querem servir o melhor e nem lembram que o melhor pode vir daqui também. As tradições devem ser abrasileiradas, tropicalizadas”, afirma o chef. 

CORES DO ANO-NOVO

Para Guga Rocha, falta uma tradição culinária genuinamente brasileira para essa época do ano, como ocorre com as cores de roupa, cujas escolhas costumam simbolizar o que se pede para o novo ano. “Se a pessoa passa de branco você sabe que ela quer paz, mas se escolhe o amarelo você sabe que é dinheiro."

A historiadora Thereza Maia também aponta as cores de roupa no Réveillon como um hábito brasileiro, mas minimiza sua importância como uma tradição: é “uma coisa mais comercial”. "Temos que lembrar que é inverno na Europa, por exemplo, então não dá pra brincar tanto com a roupa”, aponta ela, que recorda a visitação de presépios nas casas de vizinhos como um costuma em décadas passadas, embora não seja mais comum nos dias atuais.

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