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Tony Goes

Janja se mostra articulada e simpática no Fantástico, mas não deve ter mudado opiniões

Futura primeira-dama deu entrevista a Maju Coutinho e Poliana Abritta

A futura primeira-dama, Rosângela da Silva, a Janja, concede entrevista ao Fantástico, da TV Globo
A futura primeira-dama, Rosângela da Silva, a Janja, deu entrevista ao Fantástico - Perla Rodrigues/Divulgação
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São Paulo

O Brasil tem uma nova estrela no noticiário, goste-se ou não dela. Rosângela Lula da Silva, a Janja, ganhou notoriedade ao se casar com Lula, teve um papel importante na campanha eleitoral e será a primeira-dama do Brasil a partir de janeiro. Também vem incomodando políticos e jornalistas pela desenvoltura com que expressa suas opiniões políticas, e alguns temem que ela terá uma influência excessiva no próximo governo.

Janja deu uma longa entrevista a Maju Coutinho e Poliana Abritta no Fantástico deste domingo (13). Vestida com uma camisa com estampas alaranjadas que lembravam manchas de sangue, a terceira senhora Lula da Silva mostrou-se articulada, simpática e ciente de seu papel. "Quero ressignificar o conteúdo do que é ser primeira-dama", afirmou.

Mas, afinal, o que é ser primeira-dama? A função não existe oficialmente. Não tem salário, não tem direito a assessores, não tem atribuições definidas. O termo surgiu nos Estados Unidos, a primeira república moderna, quando se imaginou que a esposa do presidente seria uma espécie de rainha informal do país – e quando nem se cogitava que um dia as mulheres chegariam por si mesmas ao poder.

Na Europa, não pegou. Cônjuges de presidentes e primeiros-ministros mal aparecem na imprensa de lá. Nas Américas, o papo é outro. Do Canadá à Argentina, a figura da primeira-dama sempre foi envolta em glamour, e espera-se muito dela. Mas o quê, exatamente?

Tanto os EUA como o Brasil já tiveram primeiras-damas de tudo quanto é jeito, das discretíssimas às politizadas, passando pelas peruas deslumbradas. Algumas são até difíceis de categorizar. Dona Santinha, por exemplo: a mulher de Eurico Gaspar Dutra era carola e "do lar". Mesmo assim, em 1946, convenceu o marido a tomar duas importantes decisões: acabar com o jogo legal no país e extinguir o Partido Comunista Brasileiro.

O fato é que pouco vimos das nossas últimas primeiras-damas. Ruth Cardoso, casada com FHC, era quase invisível, mas foi fundamental para a criação e implantação do Bolsa-Escola, mais tarde ampliado para o Bolsa-Família pelos governos do PT. Marisa Letícia, segunda mulher de Lula e primeira-dama do Brasil durante os dois primeiros governos do marido, não fazia quase nada sequer se envolveu em causas sociais, algo tradicional para sua função.

Marcela Temer mal apareceu durante a presidência de seu marido Michel, e hoje só é lembrada pelo epíteto de "bela, recatada e do lar". Michelle Bolsonaro também ficou na moita por três anos e meio, até ser reinventada como uma peça crucial da campanha de reeleição de Jair.

Talvez por isto mesmo, a desinibição de Janja venha causando certo desconforto. Mas as pessoas se esquecem que ela é uma militante histórica do PT, filiada ao partido há quase 40 anos. Nunca foi de ficar calada e não haveria de ficar agora, quando tem holofotes em cima de si.

Na entrevista ao Fantástico, Janja mostrou mais uma vez que é assertiva, destemida e sem papas na língua. Impressiona a maneira como ela se refere ao "meu marido" (não disse o nome de Lula uma única vez), jamais medindo esforços para preservá-lo. Também deixou claro que vai, sim, dar palpite em tudo.

Poliana Abritta e Maju Coutinho entrevistam Janja, futura primeira-dama do Brasil
Poliana Abritta, Janja e Maju Coutinho tiraram fotos juntas no final da entrevista - Ricardo Stuckert

Não por acaso, as duas primeiras-damas estrangeiras por quem revelou admiração tiveram fortes atuações políticas. A argentina Evita Perón agia de forma escancarada, quase como uma estrela de cinema, enquanto a americana Michelle Obama operava com firmeza nos bastidores. Só faltou Janja citar Hillary Clinton, que depois de ser primeira-dama se elegeu senadora e foi candidata à presidência da República.

No entanto, ao fim e ao cabo, Janja não deve ter mudado muitas opiniões. Quem já não gostava dela teve a confirmação de que sim, ela não se restringirá ao papel de dona-de-casa. Afinal, é um animal político e continuará sendo: na entrevista, revelou que ligava diretamente para Simone Tebet durante a campanha, para discutir pautas – principalmente femininas, mas não só.

E quem já tinha simpatia por Janja, agora tem ainda mais. A futura primeira-dama se posicionou claramente como uma parceira de vida do marido, em todos os aspectos. Fará tudo o que se espera de uma esposa dedicada, mas também discutirá projetos, dará ideias e indicará nomes, sem se preocupar muito em ser discreta.

Isto é bom para o Brasil? Depende do país que queremos ser. Uma primeira-dama não é eleita, mas é óbvio que ajuda a eleger (ou não) o marido. E o que ela fará no Palácio pode dar o tom de toda uma presidência. Janja já começou.

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

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