Desafio Sob Fogo Brasil e América Latina aposta na diversidade na 4ª temporada
Mulher de 63 anos e homem gay assumido estão entre participantes
Quando pensamos num forjador, a imagem que vem à cabeça é a de um homem musculoso, talvez de barba, dono de uma tremenda força física. Desde que os gregos e os romanos representaram desse jeito Vulcano (ou Hefestos), deus do fogo e protetor dos ferreiros, este é o clichê que pegou.
O reality competitivo Desafio Sob Fogo Brasil e América Latina está disposto a quebrar o estereótipo. Afinal, a cutelaria requer mais habilidade do que força. Qualquer um pode se dedicar ao ofício: basta ter interesse e persistência.
No ano passado, em sua terceira temporada, o programa incluiu pela primeira vez uma mulher entre os competidores. Era a brasileira Juliana Baioco, uma engenheira de petróleo e professora que havia feito seu primeiro curso de cutelaria apenas um ano antes.
Na quarta temporada, que estreia às 22 horas desta quinta-feira (28) no canal History, a diversidade é ainda maior. Entre os três brasileiros concorrentes estão os paulistanos Silvana Mouzinho, 63, e Roger Glasser, 43, que é gay assumido.
"O Roger gosta de dizer que o Desafio agora tem um gay e uma idosa", ri Silvana. "Mas isso é o marketing dele. Eu adoro contar a minha idade, consegui bastante mídia com isso. Mas não me sinto idosa, não!"
Os dois se conhecem há tempos e são amigos. Mas, além do programa, também competem em outra área. Silvana organiza o Salão Paulista de Cutelaria, o mais tradicional evento do gênero no país, que terá sua 13ª edição nos dias 6 e 7 de novembro. E Roger está por trás da Mostra Internacional de Cutelaria, a segunda maior do mundo em número de expositores, cuja 11ª edição acontece em maio de 2022.
Pergunto a Roger se ele sofreu algum tipo de discriminação ao longo de sua carreira como forjador, que começou em 2007. "Sendo muito sincero: de frente o pessoal não costuma falar", responde ele, que é casado há sete anos. "Mas eu nunca tive problema com isso. Não é questão de ser assumido ou não. Eu sempre tive uma conduta que fala mais forte que a minha orientação sexual".
Mas nem por isto escapou de piadinhas e agressões verbais. "Para de abichalhar seu Instagram", escreveu um expositor de seu evento numa mensagem. Com toda a calma do mundo, Roger retrucou: "O perfil é meu e eu faço o que eu quiser. Se eu coloco alguma coisa, é porque estou representando pessoas que se inspiram em mim". Quinze dias depois, o sujeito pediu desculpas formais.
Silvana Mouzinho, que é conhecida no meio como "Dama de Ferro" ou "Dama de Aço", também sofreu preconceito. "A discriminação existe, mas é tão presente que a gente nem percebe mais", afirma ela, que, apesar de seus 16 anos de experiência na área, foi apresentada certa vez como "representante da cutelaria feminina". "Não existe cutelaria feminina", prossegue ela. "Existe cutelaria, ponto."
Apesar de serem bem conhecidos entre os forjadores, ambos tiveram que se inscrever e passar por todo o processo normal de seleção do programa.
As gravações, previstas originalmente para janeiro, acabaram acontecendo só em junho, devido à pandemia. Roger e Silvana passaram quase três semanas na Cidade do México, mas não puderam fazer turismo. O hotel era em frente ao estúdio, e as refeições tinham que ser feitas a sós, cada em seu quarto. "Teve um dia em que Roger e eu demos uma escapulida para um shopping ali perto", conta Silvana. "Levamos a maior bronca!".
Os dois não podem revelar quem é o campeão da temporada, mas já se sentem vencedores. A exposição que terão na TV certamente impulsionará as vendas dos artefatos que fazem, além de atrair expositores e visitantes para seus eventos.
Pergunto a Silvana, que se inspirou na pioneira Marina Farão, o que ela diria para uma menina que está começando hoje no mundo da cutelaria. Sem titubear, ela responde: "Vai em frente que o mundo é teu. Se precisar de alguma coisa, eu estou aqui. Conte comigo!".
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