Tony Goes

'Zorra' volta ao ar encarando o desafio de rir da pandemia

Com cenas gravadas remotamente, programa estreia nova temporada em 15 de agosto

Cena 'Zorra'
Cena 'Zorra' - Divulgação
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Diogo Vilela dança em frente a um fundo branco. A música, “Novo Normal”, é uma paródia de um sucesso de Tim Maia, “De Leme ao Pontal” –a letra foi alterada para se referir ao estranho cotidiano a que fomos submetidos pelo confinamento, lá se vão cinco longos meses.

A cena faz parte do clipe que abrirá o programa de estreia da sexta temporada do “Zorra” (Globo), 100% inédita, no dia 15 de agosto. Não teria nada de especial, não fosse por um detalhe. Diogo não está num estúdio, e sim na sala de seu apartamento em Copacabana, no Rio de Janeiro. O diretor Carlos Diegues e toda o resto da equipe também estão em suas próprias casas. Todos se comunicam através de aplicativos de videoconferência. Bem-vindos ao novo normal.

As gravações da nova safra do “Zorra” começaram em janeiro, ainda no esquema presencial. Como de praxe, o elenco traz novidades: Karina Ramil, Robson Nunes, Victor Lamoglia, Marisa Orth e, voltando à Globo depois de um hiato de cinco anos, Diogo Vilela.

Como também costuma acontecer, os primeiros esquetes registrados foram os chamados “comportamentais”: sátiras de pequenos momentos do dia-a-dia, que não estão ligadas a nenhum acontecimento específico e podem ir ao ar em qualquer momento.

Então, em meados de março, começou a pandemia. A Globo suspendeu de imediato as gravações de quase todas suas atrações. Novelas, assim como programas de variedades e de humor, foram bruscamente interrompidos.

Mesmo assim, o “Zorra” voltou ao ar em maio, depois do término do “BBB 20”. A princípio, só com reprises: os famigerados “melhores momentos”, que se tornaram inescapáveis em todos os canais da TV aberta. Aos poucos, no entanto, foram surgindo quadros inéditos, gravados remotamente.

“Não queríamos deixar o programa distante da realidade que ele retrata”, conta o diretor-geral Mauro Farias, em entrevista por telefone. “Precisamos falar do que está acontecendo agora, à nossa volta”.

O primeiro quadro a voltar ao ar foi a imitação de Jair Bolsonaro feita por Fernando Caruso. A ideia era manter um mínimo de contato com a atualidade, até que as coisas voltassem ao normal. Só que elas ainda não voltaram.

“Quando ficou claro que as restrições não iriam acabar tão cedo, decidimos trabalhar assim mesmo”, acrescenta Farias, que garante não ter sido pressionado pela cúpula da emissora para produzir conteúdo novo.

Mas o desafio era enorme. Como dar conta de 30 páginas de roteiro por semana, com um elenco disperso (Marisa Orth, por exemplo, mora em São Paulo) e a impossibilidade de usar grande parte dos recursos dos Estúdios Globo?

A solução, é claro, veio da tecnologia. A engenharia da emissora desenvolveu um kit para os atores gravarem a si mesmos, com um celular com câmera, equipamento de iluminação e microfones. A equipe foi dividida em duas e passou a trabalhar em frentes simultâneas –algo bastante comum nas novelas, com sua gigantesca carga semanal de gravações, mas inusitado para o “Zorra”, cuja edição semanal dura apenas 25 minutos.

Cada frente do programa recebeu a missão de gravar três páginas por dia, de segunda a sexta. Os roteiristas, liderados por Gabriela Amaral, Martha Mendonça e Nelito Fernandes, também tiveram seu próprio abacaxi para descascar: fazer graça com um momento que está sendo difícil, quando não trágico, para a maioria da população.

Além do mais, as cenas teriam que ser gravadas nas casas do elenco. Como escolher o ambiente mais adequado? Como iluminá-lo à distância? Como fazer os atores contracenar, se estão a quilômetros um do outro?

“Estou muito feliz com o resultado que conseguimos”, afirma Farias. “Nossos dias de trabalho têm sido bastante intensos. A carga horária é a mesma, mas não pegamos mais trânsito. E tivemos um ganho artístico: os cenários são mais realistas. São casas de verdade, que dão um molho de realidade às cenas”. A partir de setembro, o programa ganhará externas, gravadas na cidade cenográfica da emissora.

O novo “Zorra” também tem algo que o pessoal de efeitos especiais da Globo está penando para incluir na retomada das novelas: beijo na boca. Isto porque vários dos atores são casados com atrizes, e elas, mesmo sem serem contratadas da emissora, acabaram fazendo participações no programa. Foi o caso de Micheli Machado, mulher de Robson Nunes, ou Mariana Cabral, casada com Fernando Caruso.

Já o vestuário vem dos armários do próprio elenco, com palpites dos figurinistas da emissora. Para a maquiagem, não teve jeito: como numa peça teatral de baixo orçamento, cada ator precisa maquiar a si mesmo.

Este esquema, high-tech e mambembe ao mesmo tempo, agrada a Diogo Vilela. “Eu estou sentindo a mesma vibe de 30 anos atrás, só que mais moderna”, conta o ator, também por telefone. “Parece que chegou o futuro de algo que eu comecei há muito tempo”.

Durante as gravações presenciais, Vilela se deliciou em reencontrar Marisa Orth, com quem foi “casado” durante três temporadas da sitcom “Toma Lá, Dá Cá”. Também adorou conhecer novatos como Victor Lamoglia (da série “Ninguém Tá Olhando”, da Netflix). “Essa garotada me passa uma sensação de continuidade. Com eles, eu estou com a minha turma”.

Mas a turma precisou se afastar com a pandemia. Agora, a única pessoa que acompanha presencialmente as gravações com Vilela é seu irmão Marco Aurélio Monteiro, que tem larga experiência como produtor de cinema e TV. Os dois estão morando juntos durante a quarentena.

Diogo Vilela passou quase toda sua carreira dentro da Globo. Começou na emissora em 1969, aos 11 anos de idade, na novela “A Ponte dos Suspiros”, uma adaptação do romance de Michel Zevaco feita por Dias Gomes.

Seu retorno à emissora, mais de 50 anos depois da estreia, não deixa de ser um recomeço, apesar das condições tão distintas.

“Quando eu era pequeno, meu pai construiu um teatrinho para mim no quintal da nossa casa”, prossegue ele. “Mas, depois que eu me tornei ator profissional, sempre fiz questão de separar meu trabalho da vida doméstica. Agora, com as gravações remotas do “Zorra”, estou novamente atuando dentro de casa”.

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

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