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Thiago Stivaletti
Descrição de chapéu Televisão réveillon

Série reúne depoimentos emocionantes das vítimas do Bateau Mouche

Uma das maiores tragédias brasileiras dos anos 80 ganha reconstituição enxuta, mas potente

A imagem mostra um homem submerso em água, com os braços levantados. A luz azulada ilumina a cena, criando um efeito dramático. Bolhas de ar estão subindo ao redor dele, e há algumas plantas aquáticas visíveis na água.
Cena da série documental 'Bateau Mouche: O Naufrágio da Justiça' - Max/Divulgação
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Trinta e um de dezembro de 1988, noite de Réveillon. O Bateau Mouche IV, barco originalmente construído para receber 28 pessoas, sai de Botafogo com uma lotação de 153 pessoas numa grande festa com jantar para ver os fogos na praia de Copacabana.

Com o mar agitado, o barco naufraga, provocando a morte de 55, incluindo idosos e crianças. O episódio é relembrado em detalhes na série "Bateau Mouche: O Naufrágio da Justiça", que o streaming Max estreia na próxima terça, dia 18.

O primeiro episódio nos coloca no coração do naufrágio, fazendo uma reconstituição enxuta, mas eficaz do desespero das vítimas em alto mar, tentando se salvar enquanto buscavam parentes em meio ao caos e à escuridão das águas. O segundo entra nos detalhes daquilo que uma das depoentes chama de "suco de Brasil": uma mistura de negligência e corrupção que levou ao desastre.

Entre as negligências, o salão estava superlotado, as passagens dentro do barco eram muito apertadas e ninguém foi informado de onde estavam os coletes salva-vidas. Pior: havia uma autorização da Capitania dos Portos para que a embarcação navegasse com tanta gente.

A corrupção aparece por meio de algumas testemunhas, como um turista americano que afirma ter visto dois dos empresários responsáveis pelo barco subornando um funcionário da Capitania para liberá-lo.

Um dos momentos mais arrepiantes da constituição é quando uma parte dos sobreviventes resgatados por um pesqueiro os leva de volta à sede do Clube Sol & Mar, onde rolava uma festa de Réveillon com jantar.

Eles começam a bater no vidro enquanto lá dentro rola uma festa com música alta e convidados elegantes. Alguns funcionários da festa tentam barrar os náufragos, para "não atrapalhar" o evento que rolava no salão. Solidariedade passa longe.

A imprensa cobriu o caso por meses, ajudando a cobrar os responsáveis. Mas eles eram poderosos: um grupo de 13 empresários, entre eles espanhóis que tinham dezenas de negócios no Rio de Janeiro, entre restaurantes, hotéis e concessionárias de automóveis.

A direção é de Tatiana Issa, responsável pelo ótimo filme sobre os Dzi Croquettes e a série sobre Daniella Perez, um dos produtos de maior sucesso da Max no Brasil; e de Guto Barra, que codirigiu com ela a série sobre a atriz.

Eles conseguem extrair ótimos depoimentos das vítimas, entre lembranças emocionadas do naufrágio –quase todos admitem que lembram do trauma ainda todo dia, 36 anos depois– e relatos indignados da trajetória de impunidade aos empresários.

A VILÃ DAS SEIS

Naqueles dias, o Brasil vivia o frisson do "Quem matou Odete Roitman?", na reta final da novela "Vale Tudo". Na festa do Bateau Mouche, estava Yara Amaral, uma das maiores atrizes do Brasil, que havia acabado de encarnar a segunda maior vilã de 1988: a pérfida Joana Flores de "Fera Radical", sucesso do horário das seis.

Yara morreu no naufrágio muito jovem, aos 52 anos. Seu filho Bernardo, que tinha 15 anos quando sobreviveu ao naufrágio, foi um dos maiores responsáveis pela luta incessante por Justiça que se seguiu ao longo de décadas, idealizando também a Associação de Vítimas que ajudou a pressionar o Judiciário.

Se você não quer SPOILER sobre o desfecho do processo, não leia este último parágrafo. Mas, em se tratando de Justiça, o Brasil não comporta grandes spoilers: o final é quase sempre o da impunidade. O primeiro processo, de 1990, inocentou os 13 empresários.

O segundo condenou Álvaro Pereira e Faustino Vidal, presentes na noite fatídica, a prisão em regime semiaberto. Com seis meses de pena, os dois fugiram para a Espanha e lá montaram novos negócios. Houve um pedido de extradição do governo, negado pela Justiça espanhola.

Apenas algumas famílias até hoje receberam algum tipo de indenização. E a Marinha não quis dar depoimento para a série. É uma instituição que há tempos não se dá com a imprensa e a liberdade de expressão. Vale lembrar, trata-se da única Força Armada que deu apoio irrestrito à tentativa de golpe de Jair Bolsonaro em 2022.

"Bateau Mouche: O Naufrágio da Justiça"
Série em três episódios; um por semana
Estreia nesta terça (18) na Max

Thiago Stivaletti

Thiago Stivaletti é jornalista e crítico de cinema, TV e streaming. Foi repórter na Folha de S.Paulo e colunista do UOL. Como roteirista, escreveu para o Vídeo Show (Globo) e o TVZ (Multishow)

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