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Rosana Hermann
Descrição de chapéu Todas Chuvas no Sul

Na tragédia, vemos o melhor e o pior do ser humano

Enquanto influenciadores como Whindersson Nunes e Felipe Neto lotam aviões com água e donativos, há quem cometa crimes e se aproveite desse momento delicado

Vista do alto da cidade de São Leopoldo (RS) completamente alagada - Pedro Ladeira/Folhapress
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São Paulo

Não sei você, mas eu choro o tempo todo. Choro de emoção quando ouço a história do pai que colocou sua bebê de oito dias numa mochila e atravessou telhados com sua mulher em pontes improvisadas com restos de madeira. Choro de alegria quando vejo um bombeiro resgatando uma senhora que estava ilhada. Choro de alívio ao ver um voluntário salvando um cachorrinho que nadava desesperado no meio das águas.

Como não se acabar em prantos quando um pai conta que caminhou oito horas pela lama, por escombros, para buscar comida para seus filhos famintos?

Também choro de preocupação com todos os que ainda estão em suas casas ilhadas, de desespero pelos pais que não encontram seus filhos, pelas crianças perdidas. Pelos que perderam parentes e amigos.

Chorei várias vezes de felicidade nas agências dos Correios em São Paulo, onde moro, quando vi a imensa quantidade de donativos que estão sendo levados. E quando ouvi no rádio uma voluntária contar que um velhinho levou uma única garrafinha de água para doar porque era tudo o que ele podia comprar.

A tragédia do Rio Grande do Sul é absurda, impensável, sem precedentes e mexe com nossa humanidade. É comovente ver pessoas famosas como Whindersson Nunes, Felipe Neto, Fábio Porchat, lotando caminhões e aviões com água, filtros, donativos, usando a influência que têm para ajudar os que perderam tudo nas águas.

É tocante ver o esforço de voluntários anônimos, bombeiros, jornalistas, cidadãos, escoteiros, médicos, atletas, todos os envolvidos, doando seu tempo, seu talento para ajudar, seja separando roupas, fazendo lanches ou pilotando um jet ski.

E nessa grande onda de solidariedade que nos revigora, as notícias que nos revoltam. Como assim tem gente inventando mentiras que atrapalham as doações? Como assim tem gente saqueando bens dos que tiveram que abandonar suas casas para se salvarem? Como pode existir "pirata de enchente", que rouba barco de resgatistas? Como pode um saqueador de lares atirar num profissional que estava fazendo a ronda de segurança em meio às ruas alagadas? Como é possível que no meio de tanta dor e desespero de pessoas que estão vulneráveis, sem comer, sem beber água, sem nada, vários homens tenham cometido violências sexuais, estupros, contra meninas em abrigos humanitários?

É doentio, é criminoso, é revoltante. E é real. Chocantemente real.

O ser humano é capaz dos atos mais heroicos e mais atrozes. De ser gentil e amoroso e também vil e covarde. E é isso que nos aterroriza. Saber que esse espectro tão largo que vai do amor ao horror existe dentro de pessoas aparentemente comuns, que convivem conosco. E que, muitas vezes, pessoas capazes de tanto horror estão dentro das próprias casas de suas vítimas.

É preciso chorar mesmo, por tudo, por todos, pela nossa impotência diante de uma calamidade tão grande.

Mas, após chorar, de sentir revolta e raiva pelas pessoas nefastas, é preciso acalmar o coração e ver que ainda somos um povo incrivelmente solidário. Nunca vi tanta gente mobilizada para ajudar o próximo nessa dimensão, salvando vidas de todos os tipos. E isso é, sim, uma esperança.

Ainda vamos ver muita dor e tristeza nos próximos dias, semanas, meses, porque a tragédia está em curso e não vai embora magicamente de um momento para o outro.

Temos que continuar a mobilização de donativos, do jeito que pudermos.

O Rio Grande do Sul precisa de todos nós para se reconstruir. E nós precisamos continuar exercitando nossa compaixão, porque só assim conseguiremos nos manter humanos.

Rosana Hermann

Rosana Hermann é jornalista, roteirista de TV desde 1983 e produtora de conteúdo.

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