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Aula online expõe impaciência dos pais

Diferentes realidades no país expõem fosso entre crianças, mas muitos pais só querem saber de si

Na pandemia do coronavírus, crianças têm aulas online e pais ficam impacientes com tantas tarefas - samuel - stock.adobe.com
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Fazia tempo que um assunto não dividia tanto o país quanto a educação online em meio à pandemia de coronavírus.

Eu fui uma das mães que disse não querer escola a distância para minhas filhas porque pago pela educação presencial e acredito que nada substitui o “olho no olho”.

Lembro-me de, no começo da quarentena no Brasil, ter conversado com uma amiga sobre esse tema, pois as crianças dela já estavam estudando pela internet enquanto as minhas faziam atividades enviadas pela escola em seus respectivos cadernos.

Na época, em meados de março, eu acreditava que a sociedade iria cumprir as determinações do Governo do Estado de São Paulo e se manter em casa, sem espalhar o vírus, fazendo com que saíssemos logo da calamidade.

Doce engano. Cada um tem os seus motivos para sair de casa e, com isso, torna-se cada vez mais difícil chegarmos ao fim do isolamento social, com a possibilidade de reabertura plena das escolas.

Passado este susto inicial e já conformada que não teríamos outra opção a não ser encarar as aulas de forma remota, comecei a me preparar para o momento.

Organizei-me em casa, com o notebook antigo que temos —ele tem mais de dez anos— e partimos para a primeira semana de aula.

Houve muitas dificuldades iniciais. Dificuldades das minhas filhas em se organizar para estudar, dificuldades dos professores com a nova plataforma, falhas na internet após uma pane geral de operadoras em 83% do estado de São Paulo e, o ponto mais difícil de todos, a impaciência dos pais.

Sei que todos os pais querem dar o melhor a seus filhos, o que inclui uma educação de qualidade. E é isso que faz com que paguemos altas mensalidades.

Todos os pais também querem ter filhos que sejam educados, amáveis, compreensivos, obedientes, doces e que façam a diferença na existência, ajudando a construir um mundo melhor.

Mas muitos ainda não perceberam que não há fórmula mágica na formação de uma criança. Não é a mensalidade cara da escola particular que fará do filho um bom ser humano.

Eu acredito que desenvolver habilidades como resiliência, empatia, compreensão e paciência pode levá-los a ser cidadãos melhores. E saber lidar com as adversidades também faz parte do pacote “vida em sociedade”.

O que eu tenho visto em diversos grupos de pais e mães nas mais diferentes redes sociais é a impaciência com a nova forma de aprendizado. Ficam ansiosos, sentem raiva, fazem cobranças excessivas às unidades escolares e aos professores e estão, de forma geral, muito insatisfeitos.

Todos esses sentimentos são passados para os filhos, que também ficam estressados, dispersos nas aulas online e se sentem ainda mais sufocados, sem poder sair de casa. Sem contar os casos em que os pais furam a quarentena, sendo um péssimo exemplo para os seus filhos.

E enquanto reclamamos da conexão ruim, das falhas do professor, dos erros da escola, da nova vida adaptada em meio a uma correria, há diversas crianças que não têm computador, celular e nem mesmo uma TV que as permitam assistir às aulas gratuitas preparadas pelo governo de SP e pela prefeitura da capital paulista.

Agora, era hora de estarmos discutindo essas diferenças, de termos empatia com tantas outras crianças que vivem em cortiços e barracos, passando necessidades e sem direito à educação.

Enquanto os pais discutem porque querem agora, neste momento, a melhor educação online para seus filhos, ou saem por aí desrespeitando o isolamento social, o fosso entre os dois Brasis que vivemos se alarga.

Aprenderemos algo na pandemia?

Agora

Colo de Mãe

Cristiane Gercina, 42, é mãe de Luiza, 15, e Laura, 9. É apaixonada pelas filhas e por literatura. Graduada e pós-graduada pela Unesp, é jornalista de economia na Folha. Opiniões, críticas e sugestões podem ser enviadas para o email colodemae@grupofolha.com.br.

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