Colo de Mãe

Crianças percebem o mundo e nos dizem sobre suas dores de diferentes formas

É preciso ouvir o que os filhos têm a dizer

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Descrição de chapéu Agora

Minha filha de sete anos escreveu um “livro”. Em duas páginas de sulfite dobradas ao meio, ela contou sua história e revelou seus sentimentos na obra chamada de “O livro que vai ser mais lembrado - ajudar as pessoas é bom”. Escreveu com essa concordância estranha mesmo.

A data de “lansamento” foi 1º de agosto. Nas páginas em branco, sem linhas, Laura discorreu sobre o que pensa do mundo. E fez colocações sobre a realidade que a toca diariamente. “Está tendo reforma da Previdência e minha mãe tem que anotar tudo”, diz minha pequena, contando, com seus erros de criança que ainda está tendo a alfabetização refinada, a rotina de nossa casa. 

Os filhos aprendem com o exemplo, muito mais do que com palavras. E quando paramos para prestar atenção no que eles têm a dizer, seja escrevendo, desenhando ou fazendo birras, podemos entender como o dia a dia de uma família e a vida social de um país influenciam na percepção de mundo dos novos seres humanos.

Creio que, como eu, mães e pais queiram que os filhos vivam em um mundo mais harmônico, onde haja amor e paz, sem violência, corrupção ou sonegação. Um mundo onde a cor da pele, a idade, o valor do conta bancária e a região em que se mora não sejam motivo de preconceitos. E as palavras de minha filha me fizeram refletir sobre o quanto as dificuldades atuais e a realidade que estamos vivendo têm abalado minha pequena. E deve abalar muitas de nossas crianças.

Em sua pequena obra literária, minha Laura fala dos moradores de rua e diz querer que todos tenham casa. Quer que nós, como sociedade, olhemos e ajudemos. Quer que não deixemos ninguém passar fome. Pede o tempo inteiro para que sejamos bons. Faz esse apelo aos governantes.

Em seus sonhos de menina, Laura revela que quer ser presidente “para mudar o mundo”. Quer que todos tenham o que comer e que as pessoas ajudem o Brasil. O apelo que faz ao final, pedindo “por favor, ajude o mundo a melhorar”, me fez refletir muito.

Enquanto nós estivermos brigando no mundo real, sufocando a cultura, deixando a educação de lado e dando a Deus a grande missão de ser o único responsável por nossos atos, estaremos falhando como sociedade.

Enquanto estivermos desmerecendo o conhecimento e a ciência, nos xingando nas redes sociais e nos desrespeitando, querendo uns passar por cima dos outros, haverá crianças com o sentimento de que o mundo está pesado demais.

Eu posso até desistir de deixar um mundo melhor para minhas meninas, mas jamais desistirei de deixar filhas melhores para o mundo. Quero sempre ouvi-las e aprender com elas.

Agora

Colo de Mãe

Cristiane Gercina, 42, é mãe de Luiza, 15, e Laura, 9. É apaixonada pelas filhas e por literatura. Graduada e pós-graduada pela Unesp, é jornalista de economia na Folha. Opiniões, críticas e sugestões podem ser enviadas para o email colodemae@grupofolha.com.br.

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