Lima Duarte após morte de Flávio Migliaccio: 'Eu não tive a coragem que você teve'
Ator lembrou das dificuldades que ambos enfrentaram durante a ditadura militar
O ator Lima Duarte, 90, relembrou os momentos difíceis da ditadura militar no Brasil (1964-1985) em vídeo que fala sobre a morte do amigo Flávio Migliaccio, encontrado morto em seu sítio em Rio Bonito (RJ) na segunda (4). "Agora, quando sentimos o hálito putrefato de 64, o bafio terrível de 68, agora, 56 anos depois, quando eles promovem a devastação dos velhos, não podemos mais. Eu não tive a coragem que você teve."
No vídeo de quase cinco minutos, que foi divulgado na terça-feira (5), Duarte se mostra emocionado. "Eu te entendo, Migliaccio, porque eu, como você, sou do Teatro de Arena, com Paulo José, Chico de Assis, com o [Gianfrancesco] Guarnieri. Foi lá que aprendemos com o [Augusto] Boal que era preciso, era urgente que se pusesse o brasileiro em cena."
Lima Duarte complementa que eles conseguiram cumprir essa missão. "A alma brasileira, você foi um mestre. Você conseguiu colocar, e eu também. Colocamos em cena o homem brasileiro. Foi linda essa viagem (...)", afirmou.
O ator também cita uma fala do personagem Pedro Jáqueras, na peça "Os Fuzis da Senhora Carrar" (1937), de Bertolt Brecht, que aborda a luta dos povos em defesa da democracia e contra o fascismo: "Os que lavam as mãos o fazem numa bacia de sangue".
A morte de Migliaccio foi confirmada como suicídio por seu único filho, Marcelo, segundo quem o pai estava em depressão profunda desde o ano passado. O ator deixou cartas à família. Migliaccio nasceu no bairro do Brás, no centro de São Paulo, numa família de 17 irmãos —uma delas, Dirce Migliaccio, também atriz.
Marcelo afirmou que irá entrar com processo contra o estado do Rio de Janeiro por divulgar imagens do corpo do ator. As fotos foram tiradas por dois agentes da polícia militar e divulgadas na web pelos autores, segundo o filho do ator. "Quanto aos policiais militares que fotografaram com celular a cena mórbida no quarto do sítio e colocaram a imagem em redes sociais, o estado do Rio de Janeiro responderá judicialmente por ter pessoas assim a representá-lo", escreveu.
Segundo o advogado da família, Sylvio Guerra, o estado terá que responder pelas acusações de violação ao direito de imagem e vilipêndio a cadáver, previsto no art. 212 do Código Penal.
A assessoria de imprensa da Secretaria de Estado de Polícia Militar do Rio de Janeiro afirmou que "o comandante do 35ºBPM (Itaboraí) instaurou um procedimento apuratório para analisar o caso."
Nas várias novelas que fez na Globo, o Migliaccio ficou conhecido por sua atuação, entre outras, em “Rainha da Sucata”, “A Próxima Vítima”, “Vila Madalena”, “Senhora do Destino” e “Passione”. Pela última novela de que participou na emissora, "Órfãos da Terra", recebeu o prêmio de ator de TV do ano da Associação Paulista dos Críticos de Arte, a APCA.
Um de seus trabalhos mais recentes de Migliaccio foi no seriado “Tapas & Beijos”, que a Globo exibiu de 2011 a 2015, como seu Chalita, dono de um restaurante árabe em Copacabana. Sua última aparição profissional foi, no entanto, no cinema, no longa independente "Jovens Polacas", lançado no ano passado.
Comentários
Ver todos os comentários