Maria Zilda publica memórias e recorda infância conturbada, uso de drogas e beijo em Cazuza
Com mais de 45 anos de carreira, atriz está no ar em 'Pico da Neblina'
Com mais de 45 anos de carreira, atriz está no ar em 'Pico da Neblina'
Uma das atrizes mais almejadas de sua geração, Maria Zilda, 66, diz que se fosse publicar todas as suas memórias, “lançaria uma bíblia”. Ela, então, resolveu escolher apenas algumas para compartilhar com o público no livro “A Caçadora de Amor”, editado de forma independente.
Lembranças de uma adolescência conturbada, a descoberta das drogas e da atração por mulheres durante a internação são alguns dos episódios relatados nas 212 páginas da obra recém-lançada, além dos bastidores de seus casamentos, de trabalhos bem e mal-sucedidos e da amizade com ícones da cultura brasileira.
Um dos pontos altos do livro é justamente a amizade da atriz com Cazuza, a quem ela chama carinhosamente de Caju. Maria Zilda recorda que deu um beijo na boca do cantor, em público, para mostrar a todos que a AIDS não é transmitida pela saliva.
“Quem era soropositivo tinha que lidar com muitos preconceitos. Era muito triste. Não tive nenhum medo de beijá-lo. Tinha vários amigos médicos que me afirmavam que esse preconceito era um absurdo. Ficava com muita raiva”, conta ela ao F5.
A atriz afirma ainda que chegou a passar por uma “saia justa” com a mãe do amigo, Lucinha Araújo, que a teria a teria acusado injustamente de oferecer cocaína para Cazuza quando ele estava em estado terminal.
“Mencionei isso porque ela disse isso no livro dela. Foi uma crueldade, porque eu gostava muito do Cazuza. Primeiro que não sou traficante, segundo que ele não precisava de ninguém para lhe dar nada, porque conseguia tudo por si só. E terceiro porque eu o queria muito bem. Dar uma droga para uma pessoa doente não é amor.”
Maria Zilda diz, no entanto, que não guarda mágoa de Lucinha: “Já perdoei ela. Já perdoei a mim mesma por ter despertado esse sentimento tão ruim nela. Nunca mais conversamos, mas se eu a encontrar vou cumprimentá-la, certamente”.
Filha de Nilda Bethlem e Humberto Bastos, ambos já falecidos, a atriz conta que fez análise por 30 anos para superar traumas de infância. “Aprendi muita coisa ruim quando era criança. A discórdia, o desamor… O ambiente em que eu vivia em casa não era harmônico.”
“A última vez que visitei a terapeuta, disse a ela que deixei de ser a dona Nilda e virei o Humberto Bastos, muito mais divertido. Passei a viver com bom humor, alegria, brincando, sem levar as coisas na ponta da faca. Acho que a análise foi útil nesse ponto de me desligar das coisas do passado e tocar a minha vida pra frente”, diz.
Em seu livro, Maria Zilda descreve a mãe como exigente e superprotetora e o pai como um homem boêmio e cômico, que foi expulso de casa pela matriarca por causa de relacionamentos extraconjugais. “Meu pai tinha muitas amantes. Minha mãe vivia possuída pelo ciúme doentio”.
“Um dia, ela me pegou pela mão e me levou, caminhando furiosa, até onde estava parado o carro de papai, com Diogo, o motorista, e uma mulher no banco traseiro. E minha mãe gritou: ‘Olha bem! Essa é́ a amante de seu pai’. Todo mundo olhava e eu fiquei morrendo de vergonha, então ela decidiu que ele não entraria mais em casa.”
A atriz escreve, com bom humor, que herdou o “dedo podre” da mãe. Casou-se com César Fernandes em 1970, com quem teve Rodrigo, seu primeiro filho, e pouco tempo depois se separou: “Quando Rodrigo nasceu, eu já não tinha mais tesão pelo César, muito pelo contrário. Além de descobrir que tinha os casinhos dele”.
Maria Zilda diz que, inconformados com o fato de ela querer colocar um ponto final na união, sua mãe e seu tio a convenceram de se internar em uma clínica, pois acharam que ela tinha “ficado maluca”. Lá, a atriz experimentaria pela primeira vez um relacionamento homossexual e as drogas, que permearam sua vida por longos anos.
“Na verdade, usei drogas meio que para ser aceita. Enquanto as pessoas estavam na gandaia, eu já tinha filho, tinha que amamentar e cuidar dele. Então fiquei um pouco posta a parte porque não obedecia aos parâmetros das pessoas da época. Então, resolvi usar também para me enturmar. Foi uma coisa que era da época”, afirma ao F5.
O segundo casamento da atriz foi com o diretor televisivo Roberto Talma, com quem teve o filho Raphael. “Digo que meus filhos me salvaram. Eu saía, bebia, mas quando chegava uma certa hora era como um piloto automático. Eles mamavam de madrugada, então as 3h da manhã eu estava em casa para dar mamadeira.”
A união não durou muito, porque ele “se encantou com as paulistas” quando o casal foi morar em São Paulo, em 1983: “Ser amante é uma opção sua, se você sabe que a pessoa é casada, mas a traição está muito ligada à mentira, e tenho horror a mentira. Ela acaba com a confiança, e sem confiança não há uma boa relação, nem de amizade, nem de amor, nem de nada”, opina.
Maria Zilda se casou pela terceira e última vez, com arquiteta Ana Kalil, entre 2008 e 2017. Entre um casamento e outro, no entanto, Maria Zilda teve alguns casos. Ela se relacionou, por exemplo, com o ator José de Abreu, 73, durante as gravações de “A Intrusa”, sua estreia no cinema, em 1979.
“Na despedida, ficamos tristes com a separação, mas logo depois soube que era casado e tinha família no Sul. Podia ter me dito antes…”, relata.
A coleção de memórias traz também episódios dos bastidores do teatro, da TV e de algumas aventuras, como por exemplo a viagem que fez de “motorhome”, em que quase destruiu o camping no qual o veículo estava estacionado.
“Meus amores, eu tinha esquecido de tirar o fio que ligava [o motor home] à água e, quando parti, levei junto a mangueira de uns 20 metros comigo. Oh, my God! Recomendo a todos viajarem de motorhome, mas fiquem atentos às curvas e fios, please!”
A atriz confessa que os capítulos que mais exigiram dela emocionalmente foram aqueles relativos a sua família e sobre o casamento com Kalil, afirma ela. Ela afirma também que não pretende se casar novamente. “Deus me livre! Já casei demais (risos). Só tenho vontade se for cada um na sua casa. Um relacionamento de parceria, para jantar e viajar.”
Com mais de 45 anos de carreira e uma coleção de histórias pessoais e profissionais para contar, sempre com um toque de bom humor, ela avalia sua vida até aqui: “Acho que me dou nota oito. Eu também tenho falhas, defeitos e vacilei na vida algumas vezes. Ninguém é perfeito”.
Atualmente, Maria Zilda pode ser vista na reprise de “Selva de Pedra” (Viva), e na série “Pico da Neblina” (HBO).
Comentários
Ver todos os comentários