A cidade na Nova Zelândia que debate banir todos os gatos
A iniciativa faria com que a geração de gatos atuais fosse a última
Uma pequena cidade na costa sul da Nova Zelândia quer implementar um plano radical e controverso para proteger a vida selvagem local: banir todos os gatos domésticos. Proposta pela agência ambiental Environment Southland, a iniciativa faria com que a geração de gatos atuais fosse a última: depois que os gatos dos habitantes de Omaui morressem, os residentes da cidade não poderiam mais adotar nenhum felino.
O plano prevê também que donos de gatos tenham de castrar, colocar um microchip de controle e registrar seus bichos com as autoridades locais. A iniciativa foi proposta na assembleia legislativa local como parte do gerenciamento da vida animal e está aberta para consulta com os moradores da cidade desde terça (28). A decisão se o plano será adotado ou não deverá ser tomada até outubro.
Criticada por muitos moradores de Omaui, a medida é defendida por organizações que argumentam que gatos domésticos são responsáveis pela morte de bilhões de pássaros e pequenos mamíferos todos os anos.
CAÇADORES
As autoridades afirmam que a medida de proibir os gatos é justificável porque câmeras de segurança mostram os animais soltos na rua caçando pássaros, insetos e répteis. "Seu gato pode viver sua vida em Omaui normalmente. Mas quando ele morrer, você não poderá adotar outro", afirma Ali Meade, gerente de biossegurança da agência ambiental local, argumentando que os gatos têm causado muitos danos à vida selvagem de Omaui, localizada ao lado de uma grande reserva ambiental.
Mas moradores ouvidos pela imprensa local se disseram "chocados" com a proposta de banir os gatos.
Um deles, Nico Jarvis, argumenta que seus três gatos ajudam a combater pragas em sua casa e disse que a proposta é a de um "Estado policialesco". ''Não é nem uma regulação, é uma proibição", afirma.
Amantes de gatos no grupo de Facebook da entidade reagiram às notícias com virulência e disseram que veneno, poluição de carros e humanos também causam danos às espécies nativas. A ONG Paw Justice, que luta contra abuso de animais, questionou as informações que baseiam para o projeto.
"(Autores da proposta) afirmam que câmeras registraram os danos feitos por gatos à flora e à fauna nativas. Mas precisamos de fatos antes de começar esse jogo de distribuir culpas", diz comunicado da ONG no Facebook.
"Podemos ver as imagens dessas câmeras? Quantos pássaros morreram? Quantos gatos supostamente causaram esse dano? É um único gato? Ele é selvagem ou domesticado? Quem conduziu o estudo e será que ele foi checado de modo independente? Como sabemos se o dano ambiental não foi causado por outros fatores? (...) Decisões que afetem nossa comunidade amante de animais de estimação devem ser baseadas em pesquisas e fatos, não conjecturas. Desde quando nosso país se tornou uma ditadura?"
Pelo projeto, qualquer pessoa que desrespeite a legislação receberia uma notificação e, se continuasse se recusando a respeitá-la, as autoridades iriam confiscar o novo animal –mas só "em última instância".
John Collins, diretor da entidade Landcare Omaui, é um dos principais defensores do projeto de banir os gatos para proteger o "alto valor" das reservas naturais da cidade. "Não odiamos gatos, só queremos que o ambiente seja rico em vida selvagem", disse Collins ao jornal Daily Times.
O ecologista Pete Marra, diretor do Centro de Migração de Pássaros Smithsonian, é autor de diversos artigos e livros sobre os riscos impostos por gatos domésticos à fauna. Ele afirma não ser "anti-gato" ou contrário às pessoas que têm os bichanos. "Gatos são ótimos bichos de estimação –são excelentes! Mas eles não deveriam ficam soltos na rua, assim como não deixamos os cachorros andarem soltos na rua", argumenta.
DEBATE SOBRE GATOS
O debate sobre populações de gatos e ecossistemas locais se reproduz em outras partes do mundo. Cientistas especializados em conservação alegam que gatos domésticos e ferais estão entre as cem piores espécies invasivas do mundo.
Peter Marra argumenta que as extinções de 63 espécies ao redor do mundo estão ligadas ao aumento na população de gatos. O problema é pior em áreas com ecossistemas sensíveis, com o Nova Zelândia. "A situação saiu do controle", afirma ele. "Esse problema não é culpa dos gatos, mas dos humanos."
Marra defende que donos de gatos ao redor do mundo mudem a forma de pensar sobre os bichos: deveriam ser adotados em vez de criados, castrados e mantidos em casa, onde podem brincar com brinquedos. Outra opção é levá-los para passear em ambientes controlados –saindo com um coleira, por exemplo.
E a popularidade dos bichos está em alta –a população mundial de gatos não mostra sinais de que vá diminuir. "Eles são muito fofos, o que torna a situação muito mais difícil", explica Marra.
É estimado que pelo menos 4 bilhões de pássaros e 22 bilhões de pequenos mamíferos sejam mortos por gatos só nos Estados Unidos todos os anos.
COMO ELES CHEGARAM LÁ
A popularidade dos gatos é enorme na Nova Zelândia: os bichanos estão presentes em pelo menos metade de suas residências. Ele são um tema polêmico na Austrália também, onde gatos ferais e de estimação que andam soltos são responsabilizados por milhões de mortes de bichos locais todas as noites.
Os gatos chegaram ao continente junto com colonizadores Europeus, e desde então acredita-se que pelo menos 27 espécies tenham sido extintas por causa deles –e mais de 120 estariam ameaçadas. O problema é tão grave que o país tem financiado iniciativas para abater gatos selvagens desde 2015 e considera introduzir um toque de recolher para gatos domésticos.
Governos estaduais e municipais têm tomado iniciativas locais –forçando donos de gatos a manterem-nos dentro de casa à noite, implementando quotas máximas de bichos por residência e castração e identificação obrigatórias.
No entanto, iniciativas contra os felinos continuam controversas. No ano passado, entidades que defendem os direitos dos animais protestaram contra uma assembleia municipal que oferecia uma recompensa de 10 dólares por pele de gato feral morto.
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