Aline Midlej assume Jornal das 10, recorda racismo e cita Boechat como mestre
Jornalista vai substituir Heraldo Pereira na apresentação do telejornal
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Inspiração para muitas jovens negras, a jornalista Aline Midlej, 38, encara a partir desta segunda-feira (5) o desafio de apresentar o principal telejornal da GloboNews, como a nova âncora do Jornal das 10. Ela substitui Heraldo Pereira, titular na bancada desde 2017, que passa a ancorar o noticiário político do Bom Dia Brasil (Globo).
“Para mim é uma honra, imensa responsabilidade e um sinal de que tenho feito coisas de que de fato vão ao encontro do jornalismo que a Globo quer e que eu quero fazer. Conseguir estar no lugar dele [Heraldo Pereira] a partir de agora me indica que a gente está fazendo, trilhando, um caminho como canal, como jornal, e eu como jornalista na direção que eu desejo”, diz.
A nova casa de Midlej é só uma das mudanças anunciadas pelo jornalismo da Globo e da Globonews. O Edição das 10, apresentado até agora pela jornalista, passará a se chamar Conexão GloboNews, com apresentação de Leilane Neubarth, do Rio, José Roberto Burnier, de São Paulo, e Camila Bonfim, de Brasília. Os dois primeiros voltando do home office após se vacinarem contra a Covid.
Em entrevista ao F5, Midlej afirma que vai trazer a sua assinatura na apresentação do Jornal das 10 e pretende sair do estúdio para fazer reportagens. O primeiro entrevistado será um dos pesquisadores mais antigos do Fiocruz que vai falar sobre a vacina nacional contra a Covid-19. Ela também visitou a fábrica onde está sendo produzido o imunizante.
Midlej, que trabalhou por seis anos na Band, antes de chegar ao Grupo Globo, afirma que sofreu racismo no início de sua carreira, mas sempre de forma velada, indireta, e defendeu maior representatividade na TV. "Muitas meninas e mulheres me veem e, não só se identificam, mas conseguem se enxergar nesses lugares. Passar a fazer uma nova leitura de si mesma é grandioso, muito poderoso, potente."
A jornalista também lembrou do amigo Ricardo Boechat (1952-2019) e da importância que ele teve em sua carreira, dizendo que ainda não consegue acreditar que ele morreu há dois anos. “O Boechat era meu mestre, era meu ídolo e conselheiro. Ele foi o ídolo com o qual eu trabalhei, eu conversava com ele todos os dias, eu tive a sorte de ter o afeto dele”. Leia trechos editados da entrevista.
O que a GloboNews vai trazer de novidade no Jornal das 10?
A gente está trazendo um olhar novo para o assinante, não só com a apresentadora ou um novo âncora. Mas também tentando trazer um visual diferente porque o jornal está mudando de casa, saindo de Brasília e voltando para o Rio de Janeiro. A gente quer trazer alguns elementos visuais que criem novas identificações também para o assinante. Tem questões técnicas que estão sendo mudadas, questões editoriais, de conteúdo e, principalmente, é claro, de forma.
O tradicionalismo do Jornal das 10 ele vai ser mantido, a nossa força. É o jornal mais antigo da casa e está mudando de cara, de jeito, repaginando no ano que a GloboNews completa 25 anos. No segundo ano de pandemia, o canal adquiriu um papel ainda mais importante do que já tinha na formação de opinião, de levar conteúdo para as pessoas conseguirem lidar com esse momento. Em termos de conteúdo, vou, além de apresentar, tentar ir sempre para as ruas para fazer matérias.
Você apresentava o Edição das 10 da manhã e agora vai ser âncora às 22h. Como está se preparando para essa mudança de rotina?
É uma inversão total de rotina, o que eu estou achando ótimo. A gente está aproveitando essa semana que eu estou fora do ar me preparando para o jornal. Estou fazendo uma readequação biológica do meu organismo. Tenho tentado acordar às 9h, independentemente do que eu vou fazer. Inverti tudo: exercícios, ioga, leitura. Mas acho que só na hora a coisa vai ser vivenciada de maneira mais integral.
Como é substituir o Heraldo Pereira no comando do Jornal das 10h?
O Heraldo é um mestre, é maravilhoso e tem muitas qualidades. Eu falo que ele é um pacotinho muito especial, uma pessoa extremamente generosa, brincalhona, querida. As poucas vezes que encontrei o Heraldo aqui no Rio, durante os plantões, sempre foi amável com todo mundo, de verdade. É um cara que acumula muito no jornalismo, já fez muita coisa, principalmente na cobertura política.
Para mim, é uma honra, imensa responsabilidade e um sinal que tenho feito coisas de que de fato vão ao encontro do jornalismo que a Globo quer e que eu quero fazer. Conseguir estar no lugar dele [Heraldo Pereira] a partir de agora me indica que a gente está fazendo, trilhando um caminho como canal, como jornal e eu como jornalista na direção que eu desejo.
Você vai participar do rodízio de apresentadores dos telejornais da TV Globo em 2021?
Por enquanto, não. A missão principal agora é fazer o Jornal das 10, ele entrar nessa nova fase pleno, com a força que sempre teve, levando esse astral novo para as pessoas, renovado. A minha missão principal vai ser essa na GloboNews.
Você trabalhou com o Ricardo Boechat e noticiou a morte dele...
Trabalhei, o [Ricardo] Boechat foi meu grande padrinho no jornalismo, inclusive, na época que ele morreu, eu noticiei a queda do helicóptero no final do meu jornal [Edição das 10, na Globo News]. Foi uma experiência muito traumática para mim, porque eu noticiei que era um acidente muito grave, o helicóptero caiu no Rodoanel. Eu soube depois que eu saí do ar que era ele, porque começaram as conversas no grupo de colegas da Band. Eu desfaleci na Redação.
Quem era o Boechat para você?
O Boechat era meu mestre, meu ídolo e conselheiro. Ele foi o ídolo com o qual eu trabalhei, conversava com ele todos os dias, eu tive a sorte de ter o afeto dele. Eu sei que ele me ajudou a abrir caminhos. Se o Boechat foi consultado algum dia sobre mim, tenho certeza que ele falou: ‘ela consegue sim, eu acho que ela tem que fazer’. Foi um cara que me ensinou muito e que me abriu muitos caminhos.
Se ele fosse entrevistar uma dona de casa ou o presidente da República, ele lidava do mesmo jeito, com o mesmo respeito e tirava o melhor do outro da mesma forma, não importa a personalidade que estava ali do outro lado da linha na rádio quando ele se consagrou. Até hoje eu vejo alguma cobertura e falo: ‘como que o Boechat não está aqui para falar sobre isso?’. Ainda mais em uma cobertura como essa [de pandemia] que a gente está vivendo no Brasil, realmente faz muita falta.
Quando você era criança não era muito comum apresentadores negros na televisão e você está substituindo outro negro. Qual o impacto positivo na vida das crianças verem cada vez mais apresentadores negros?
Quando eu me formei e estava crescendo a gente tinha grandes nomes, como Gloria Maria e a Zileide Silva. Eu estou aqui contando nos dedos, mas não podemos contar no dedo, isso tem que ser uma realidade. Hoje, a minha presença e de outras colegas aqui da Globo mostra para o espectador, seja ele quem for, que isso é o Brasil.
Quanto mais você tiver no ar a diversidade brasileira, melhor vai ser o conteúdo, a interação, a qualidade dessa troca. Eu sei que hoje muitas meninas e mulheres me veem e, não só se identificam, mas conseguem se enxergar nesses lugares. Passar a fazer uma nova leitura de si mesma é grandioso, muito poderoso, potente.
O racismo está em situações que para muitas pessoas passam despercebidos ou em mensagens indiretas. Quando você começou na TV você sofreu esse tipo de preconceito?
Não foi um problema, na verdade havia um padrão, digamos assim, que as mulheres não usavam muito o cabelo natural. Isso não é só com as mulheres negras, vale para as brancas que têm o cabelo mais enrolado. Eu lembro que, quando eu saí dos bastidores, deixei de ser produtora para virar repórter, tinha um pouco de incômodo com o volume do meu cabelo. Eu percebi de maneira indireta com a minha direção, as pessoas falando: ‘você precisa tirar um pouco do volume, deixar ele diferente’. Nunca era uma coisa direta. É um jeito de falar, mas é racismo.