Lima Duarte celebra 'Bem-Amado' e diz que Zeca Diabo continua no imaginário popular
Primeira novela a cores da TV será disponibilizada na Globoplay
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Considerada uma das novelas mais importantes da teledramaturgia brasileira, "O Bem-Amado" (Globo, 1973) será retransmitida pela Globoplay a partir desta segunda-feira (15), após 48 anos. Escrita pelo romancista Dias Gomes e baseada em uma peça de 1962, também do dramaturgo baiano, ela marca a chegada de Lima Duarte, 90, à emissora.
"Foi a primeira novela que fiz na TV Globo e, graças ao Zeca Diabo, não saí mais dela e nem também do imaginário brasileiro", afirmou o ator. "O autor, Dias Gomes, era um crítico profundo e inteligente. A novela tinha personagens maravilhosos, tipos profundos, muito bem compostos e o povo se apaixonou", recorda ele.
A trama conta a história de Odorico Paraguassu, interpretado por Paulo Gracindo, prefeito de Sucupira, que busca um cadáver para inaugurar o cemitério da cidade fictícia. “Vote em um homem sério e ganhe um cemitério” era o slogan de sua campanha, porém ninguém da cidade morria para que ele conseguisse cumprir sua promessa.
Para conseguir um defunto, Odorico então permite que o matador Zeca Diabo, vivido por Lima Duarte, volte à cidade com o combinado de que não será preso. O que o corrupto prefeito não esperava era que Zeca retornaria disposto a nunca mais matar alguém, já que ele queria ser um homem bom.
Odorico tem como aliadas as irmãs Cajazeiras, são elas: Dorotéia, interpretada por Ida Gomes, Dulcinéia, por Dorinha Duval e Judicéia, por Dirce Migliaccio. As três são apaixonadas pelo coronel e seu secretário pessoal, Dirceu Borboleta, vivido por Emiliano Queiroz.
“O Bem-Amado” foi a primeira novela a ser exibida com cores na televisão brasileira e criticava de forma bem-humorada o Brasil da ditadura militar. Em 1973, a Censura Federal proibiu que a palavra “coronel” fosse pronunciada na trama. Era através dela que alguns personagens, em especial Zeca Diabo, se referiam ao prefeito Odorico. Os militares pensavam que Dias Gomes fazia alusão a um coronel de patente militar, porém ele se referia aos “coronéis” do sertão da Bahia.
Também foram censuradas as palavras capitão, ódio e vingança, o que obrigou a equipe da produção a apagar o áudio de vários capítulos já gravados. A música que abertura também foi alvo: “Paiol de Pólvora”, cantada na voz de Toquinho e Vinicius, foi proibida pela devido ao verso “Estamos sentados em um paiol de pólvora”.
E não apenas a música de abertura, mas toda a trilha sonora da novela foi composta pelo paulistano Toquinho e o carioca Vinicius de Moraes. A dupla que surgiu em 1969, vivia grande sucesso quando foi convidada pelo diretor Daniel Filho para trabalhar em “O Bem-Amado”. Na época era comum que novelas encomendassem trilhas sonoras para duplas de MPB.
O LP lançado em 1973 virou um disco editado em CD pela gravadora Som Livre, no ano de 2001. Esse trabalho é comparado inclusive com os melhores álbuns da dupla e até agora continua sendo considerado atemporal por sucessos como “Meu Pai Oxalá”. Toquinho também revelou curiosidades sobre a trilha no documentário “Teletema - A História da Música Popular Através da Teledramaturgia Brasileira” (2014), de Guilherme Bryan e Vincent Villari.
A trama ganhou títulos em várias premiações. Em 1974 ganhou o Troféu Imprensa na categoria de melhor novela. Além disso, a novela também recebeu outras menções como Melhor Direção (Régis Cardoso), Melhor Adaptação (Dias Gomes), Melhor Música (Toquinho e Vinicius de Moraes) e Melhor Realização de Exteriores. E Paulo Gracindo recebeu o prêmio especial do Primer Festival de La Telenovela en México.
Uma das cenas mais marcantes da produção é estrelada por Milton Gonçalves, 87, que deu vida ao pescador Zelão. Nela, o personagem inspirado por Dias Gomes em uma história real, salta da torre da igreja com asas que construiu e sobrevoa a cidade de Sucupira enquanto a população o olha. Narrada pelo ator Mário Lago, a gravação passa de colorida a preto e branca para mostrar o voo.
Atualmente, apenas parte do elenco ainda está vivo. Lima Duarte, que viveu o protagonista, hoje em dia está escalado para “Aruanas” (Globo, 2019). Emiliano Queiroz, 85, teve sua última aparição na TV em 2020, na novela “Éramos Seis”. Já Milton Gonçalves fez seu último trabalho televiso no especial de natal “Juntos a Magia Acontece” (2019).
Lima Duarte também comentou sobre a construção de Zeca Diabo: "Eu inventei todo esse jeitinho dele de falar com as pessoas. Na época, eu fui na figurinista e disse que iria arranjar a roupa. Fui em um tintureiro na Estação da Luz, em São Paulo, onde consegui um terno escuro. Depois, fui em um churrasco de um amigo em Sorocaba e um dos convidados tinha um chapéu. Achei que seria um bom chapéu para o personagem, um matador que não mata".
Gracindo Júnior, que viveu o vigarista Jairo, participou da série “Magnífica 70” (HBO, 2018), e Maria Claudia, que viveu sua esposa, Adalgisa Portela, hoje dedica-se ao teatro. Por fim, Dorinha Durval sumiu da mídia e se tornou artista plástica após assassinar o marido, Paulo Sérgio Alcântara, em 1980, hoje aos 92 anos apareceu ao receber a vacina contra Covid-19.
A produção de Dias Gomes rendeu ainda um seriado baseado na novela que não foi tido como uma continuação da novela, embora contasse com alguns dos seus principais personagens, e uma minissérie produzida em 2011, roteirizada por Guel Arraes e Claudio Paiva, estrelando Marco Nanini como o bem-amado prefeito oportunista, Odorico Paraguaçu.
Agora, além da edição especial da novela lançada em DVD, pela Globo Marcas, no ano de 2012, os fãs da trama podem reviver a produção icônica, carregada de críticas sociais, humor e sátiras, e relembrar a trilha sonora antológica da dupla Toquinho e Vinicius.