Silvio Santos não veio aí, e festa de 60 anos de seu programa teve toque melancólico
Apresentador não mandou nem mesmo um vídeo saudando a plateia
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Se um programa de auditório da Globo estivesse completando várias décadas, dá para imaginar o tamanho que teria a comemoração.
Um especial seria gravado no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, ou na Cidade das Artes, com clima de entrega do Oscar. As mulheres desfilariam de vestido longo pelo tapete vermelho; os homens, de black-tie. Grandes estrelas da música se apresentariam, inclusive uma ou duas internacionais. Todo o elenco da casa –ou o que sobrou dele– compareceria em peso.
Mas o que está celebrando 60 anos no ar é o Programa Silvio Santos, que até foi exibido pela Globo durante cerca de uma década. Surgido em 1963, o PSS (para os íntimos) passou por diversos canais e horários. Desde 1981, é o carro-chefe da rede de TV aberta comandada por Silvio Santos. Atração, apresentador e emissora se confundem: difícil dizer onde termina um e começa o outro.
Tanto que a gravação do especial de 60 anos do PSS, nesta terça (30), foi a cara do SBT. Aconteceu lá mesmo, no Estúdio 3 da sede da emissora, às margens da rodovia Anhanguera, nos arredores de São Paulo. Nenhuma celebridade na plateia: só as colegas de trabalho, algumas delas veteranas de inúmeras caravanas, e um punhado de jornalistas, entre os quais eu me incluí.
A falta de pompa foi compensada por uma das grandes qualidades do PSS: a espontaneidade, a alegria, um certo clima de improviso. Espontaneidade estimulada, digamos assim, pelo lendário Liminha, que puxa aplausos e gritos do auditório. Com a maior facilidade, aliás, pois todo mundo ali sabe o que deve fazer.
O único astro especialmente convidado foi o vice-presidente, Geraldo Alckmin, que tem pelo menos dois momentos de sua trajetória ligados a Silvio Santos. Na década de 1970, quando era prefeito de Pindamonhangaba, Alckmin participou várias vezes do quadro Cidade Contra Cidade, ganhando ambulâncias para seu município e popularidade para si mesmo. Em 2002, já governador do estado de São Paulo, negociou diretamente com o sequestrador a liberdade de Patrícia Abravanel, uma das seis filhas de Silvio Santos.
Em vez de trazer novidades, o PSS mergulhou na própria história. Trouxe para o palco um casal que se conheceu no quadro Casamento na TV, em 1967, e do qual poucos telespectadores ainda se lembravam.
Mais divertida foi uma reedição do Qual É a Música, em que duas equipes de cantores se enfrentaram. Nenhum deles é um grande medalhão da MPB, mas a simples menção de alguns nomes já serve de gatilho para um turbilhão de lembranças: Ovelha, Gilliard, Lady Zu, Silvio Brito, Sarajane, Nahim, Márcio do Trio Los Angeles, Lilian (sem Leno), Jane (sem Herondy). No final, surgiu Ronnie Von, o maior vencedor da competição, dessa vez apenas como hors-concours.
Nenhum "sem" foi maior, obviamente, do que a ausência do próprio Silvio. Sim, como todos já sabem a esta altura, o Programa Silvio Santos festejou seu 60º aniversário sem a presença seu titular, seu criador, o maior nome da televisão brasileira de todos os tempos. As honras da casa couberam a Patrícia Abravanel, que há tempos já substitui o pai. Na plateia (e, em alguns momentos, no palco), todas as mulheres da família: a mulher de Silvio, Íris, e as filhas Cíntia, Silvia, Daniela, Rebeca e Renata.
Aos 92 anos, Silvio Santos se tornou raro na emissora que construiu. Apesar dos boatos que insistiam numa aparição-surpresa no final da gravação, o "patrão" não mandou sequer um vídeo saudando os presentes. Tivemos que nos contentar em vê-lo no telão, protagonizando momentos memoráveis ao longo das últimas seis décadas.
Mais para o final, entraram em cenas todos os jurados sobreviventes do Show de Calouros. Foi emocionante ouvi-los homenageando Silvio —e inevitavelmente melancólico. Ao reencontrar Décio Piccinini, Sérgio Mallandro, Sonia Lima, Luís Ricardo, Flor, Nelson Rubens, Leão Lobo e Mara Maravilha, tive a ligeira sensação de ter morrido e estar vendo o videotape da minha vida.
Porque é isto o que é o Programa Silvio Santos: uma parte inextricável da trajetória de quase todos os brasileiros. Crescemos ao som do "lararará", rimos das gafes e dos imprevistos, e agora ficamos de coração apertado quando vemos que SS não aparece na própria festa. É difícil nos acostumarmos a um mundo onde "Silvio Santos vem aí" está começando a perder o significado original.