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HUMOR: Os Cristos continuam pobres e proibidos no Carnaval do Rio

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Há 25 anos, a Beija-Flor de Nilópolis colocava na Marquês de Sapucaí um dos carros alegóricos mais impactantes do Carnaval do Rio: o "Cristo Mendigo", que precisou sair coberto depois que a Igreja Católica usou seu poder para tentar proibir a alegoria. A ideia de "oculta-lá" com luto e colocá-la na avenida mesmo assim foi do saudoso Joãosinho Trinta.

Crédito: Luiz Caversan/Folhapress RIO DE JANEIRO, RJ, BRASIL, 07-02-1989: Carnaval 1989: o "Cristo mendigo", da escola de samba Beija-Flor de Nilópolis, envolto em plástico preto e com uma faixa com a inscrição "Mesmo proibido, olhai por nós!", durante o desfile no sambódromo do Rio de Janeiro (RJ). Criada por Joãosinho Trinta, a alegoria havia sido proibida pela justiça por uso de símbolo religioso, foi liberada na véspera do desfile, mas o carnavalesco manteve o Cristo escondido. (Foto de Luiz Caversan/Folhapress)
O "Cristo Mendigo", da Beija-Flor de Nilópolis

Mas se as bodas são de prata, o custo é de ouro. De lá para cá, os desfiles do Rio se transformaram em espetáculos caríssimos, com ingressos cada vez mais VIPs e... quedê o povo? Até a pobreza, quando retratada, vem com pancake, rímel e gloss. Pobreza high-tech! Padrão de novela das oito!

Vai ver foi por isso que o governador do Rio, Sérgio Cabral, circulou tão à vontade pelo sambódromo no último domingo (2). Não precisou nem de helicóptero para ficar a uma distância "segura" da miséria. Estava em um evento onde o popular é cada vez mais anabolizado, coreografado, roteirizado. Exatamente como nos vídeos de campanha política que ele sabe fazer de cor e salteado. O tipo de estética que amansa o olhar enquanto o pano preto da política encobre coisas, essas sim, muito feias.

Que o diga o empréstimo que Cabral conseguiu aprovar em 18 de fevereiro e que aumenta o custo da Linha 4 do Metrô do Rio em R$3,5 bilhões. Com isso, a obra vai consumir (até agora) R$13,5 bilhões, segundo o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL-RJ), contra os R$5 bilhões previstos nos "inicialmentes" da coisa toda. A assessoria da Linha 4 do Metrô do Rio informa que o custo da obra é de R$ 8,5 bilhões.

Crédito: Folhapress
Gentileza gera gentileza: o governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), beija o prefeito da capital fluminense, Eduardo Paes (PMDB)

Enquanto as pirotecnias das Escolas de Samba encantavam os olhos, garis do Rio decidiram fazer paralisação para reivindicar melhores salários. Para chamar a atenção, deixaram as sujeiras das ruas ao Deus dará. O prefeito Eduardo Paes (que também assistia aos desfiles nos espaços caríssimos da Marquês de Sapucaí) demitiu 300 deles. O recado é claro: pague para ver e você pode não ter como pagar para ter comida na geladeira.

Confetes? Serpentinas? Que venha a Copa.

Em 1989, o "Cristo Mendigo" de Joãosinho Trinta trazia uma faixa com o apelo: "Mesmo proibido, olhai por nós". Mas quem poderia olhar aquele cartaz, se não o povo das arquibancadas, e os espectadores diante de suas tevês?

Apesar dos avanços, ao longo dos últimos 25 anos é ele, o povo, o espectador, que continua proibido de ver o que vai por debaixo dos panos da política. Em um ano de Carnaval Padrão Fifa, Copa do Mundo Eleitoreira e Eleições Carnavalizadas, cabe a cada um de nós a decisão de des/cobrir a alegoria em que estão transformando o Brasil e encarar a nossa realidade mendicante.


DIEGO REBOUÇAS, 31, é roteirista e jornalista. Lançou em 2012 "Travessia", livro de poesias, pela Livros Ilimitados.

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