'A Regra do Jogo' e 'House of Cards' espelham o Brasil desta semana: coincidência?
A vida imita a arte, reza o antigo clichê. Mas é impossível não lembrar dele nestes dias tão tumultuados, onde o noticiário parece tão delirante quanto uma obra de ficção.
E coincidências estranhas pipocam na televisão. Uma delas é a estreia da quarta temporada da série "House of Cards" nesta sexta-feira (4). Já tem gaiato nas redes sociais elogiando a "estratégia de marketing" da Netflix, tão sincronizada com o calendário da política brasileira.
Claro que é piada. Mas são inegáveis as semelhanças entre Frank Underwood (Kevin Spacey), o amoral protagonista do seriado, com o nosso querido Eduardo Cunha. Ambos ganharam notoriedade ao chegar à presidência da Câmara dos Deputados; ambos não medem esforços para não só se manter no cargo, como também alcançar outros ainda mais elevados, e dispensando o voto popular.
Cunha já recusou com veemência a comparação, ainda mais porque o personagem da TV não hesita em matar com as próprias mãos quem ousa lhe dificultar o caminho. Ainda não constam assassinatos entre as muitas suspeitas que pesam sobre o deputado brasileiro. Mas a carapuça serviu no imaginário popular, haja vista a quantidade de memes que ligam os dois.
Mais perturbadora é a semelhança da reta final de "A Regra do Jogo" (Globo) com a Operação Aletheia, a mais recente etapa deflagrada pela Lava-Jato. Na novela, finalmente os familiares de Gibson descobriram que ele é ninguém menos do que o "pai da facção" —o líder de uma organização que nasceu por um desejo de justiça, mas logo descambou para o crime puro e simples.
Quis o destino que os capítulos onde acontece essa terrível revelação coincidissem com as delações, os depoimentos coercitivos e as enormes surpresas que explodem no mundo real. E o destino ainda foi irônico: ele quis que o intérprete de Gibson fosse nada menos que José de Abreu, um dos apoiadores mais notórios do governo. Que ainda disse que se inspirou em FHC para compor o personagem...
Longe de mim sugerir que essas coincidências façam parte de uma teoria de conspiração. A explicação singela é que a corrupção e a mentira são parte inextricável da experiência humana, tanto no Brasil como nos Estados Unidos ou onde quer que seja.
Por isto, elas são excelente matéria-prima para roteiristas e romancistas, que não se fartam de usá-las em seus filmes, livros e programas de TV. Mas talvez eles precisem se esforçar mais: está cada vez mais difícil competir com a realidade.
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