Tony Goes

Programa de Pedro Bial volta mais denso e consequente

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Desde que deixou o "Fantástico" e passou a aparecer na TV apenas no "BBB", Pedro Bial se tornou um alvo fácil para todo tipo de crítica.

Como é que um jornalista com sua trajetória se resignava a permanecer na "casa mais vigiada do Brasil", cercado por sarados e popozudas? Seria por causa da rotina de trabalho relativamente leve --três meses puxados, e o resto do ano de férias?

O fato é que Bial nunca pareceu totalmente à vontade no "Big Brother". Seus discursos empolados antes das eliminações têm um outro significado oculto, além de indicar quem vai sair: "Olha só, pessoal, eu sou capaz de muito mais".

Em 2012 ele finalmente pôs a mão na massa e concretizou um novo programa. A primeira temporada de "Na Moral" foi ao ar há cerca de um ano. A proposta era ambiciosa, ainda mais para um canal aberto: discutir um tema polêmico com visões pró e contra de maneira leve e divertida, em pouco mais de meia hora.

O começo foi meio titubeante. Convidados demais dividindo o pequeno palco de arena ao mesmo tempo, uns falando sobre os outros, e mais uma celebridade aleatória "atacando de DJ".

Mas logo o programa encontrou seu tom, produzindo pelo menos dois episódios memoráveis: o sobre privacidade, que teve um embate entre Pedro Cardoso e um "paparazzo", e o que discutiu o casamento gay, com duas mulheres trocando votos matrimoniais em frente às câmeras.


A segunda temporada estreou na quinta-feira (4), pouco antes da meia-noite. O horário tardio permite ousadia, e o tema escolhido não podia ser mais incendiário: a descriminalização das drogas.

Sem jamais resvalar para o moralismo, a discussão começou com um dado contundente: a guerra ao tráfico mata mais gente do que o consumo de drogas em si. Alguma coisa está muito errada quando a solução causa um estrago maior do que o problema.

A atração musical era Marcelo D2, que há mais de uma década luta pela descriminalização da maconha. A briga é séria, mas não deixou de ser engraçado vê-lo cantar o clássico refrão "vou apertar, mas não vou acender agora" para saudar a entrada do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (tratado sem o "ex" pelo apresentador).

Sem interesse a se candidatar a nenhum cargo, hoje FHC se dá ao luxo de dizer o que pensa. E já há algum tempo que ele vem se posicionando com clareza neste debate onde é fácil se perder nas complexidades.

O programa foi ilustrado por muitas reportagens externas, com entrevistas com usuários que foram presos e até mesmo uma matéria gravada em Portugal, país que viu o consumo de tóxicos ilegais diminuir depois que descriminalizou o uso.

Também teve rápidos diálogos entre delegados de visões opostas que, se não chegaram a conclusões definitivas, mostraram como a questão é multifacetada. Tanto que os integrantes da plateia, usando jalecos verdes, amarelos ou vermelhos para sinalizar suas opiniões, podiam mudar de cor caso também mudassem de ideia.

O único passo em falso do programa de estreia foi a participação de Fernanda Montenegro no último bloco. A grande atriz tem posições ponderadas sobre quase tudo, mas não é exatamente uma "expert" no assunto que estava em pauta. Ela mesma disse que se sentiu "a cereja do bolo", pois não acrescentou muito à conversa. Nem mesmo sabor, diria eu.

Mas esta foi a única derrapada de um episódio, de resto, irrepreensível. Bial e sua equipe conseguiram tornar o "Na Moral" mais denso e consequente, sem abandonar o entretenimento. Não é pouca coisa.

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

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