Show caótico revela carisma de Lady Gaga
Semana passada, escrevi numa coluna que os megashows só valem a pena quando vistos de muito perto. Mais especificamente, da chamada "pista premium": a área mais próxima do palco, e a que tem os ingressos mais caros.
Pois eu paguei a minha língua, de duas maneiras diferentes. Fui ao show de Lady Gaga no domingo, no estádio do Morumbi em São Paulo, e justamente na pista premium. Só que nem de lá eu consegui ver tudo perfeitamente.
Acontece que o espetáculo não foi concebido para ser visto do ponto onde eu estava. O palco é muito alto, e boa parte dele é obscurecida por uma passarela em "U" que avança sobre o gramado. Dentro dela, o espaço mais VIP de todos, reservado aos "little monsters" - os fãs mais extremados da cantora.
Mas valeu a pena. Mesmo tendo que acompanhar boa parte do que acontecia em cena pelo telão, me diverti muito no show. Mais do que isto, até: me emocionei. E não fui só eu, foi o estádio inteiro.
Lady Gaga é uma performer curiosa. Passa boa parte da apresentação escondida por figurinos pesados e máscaras bizarras. Cheguei a desconfiar que, em alguns momentos, nem era ela quem estava por baixo da indumentária.
Mas quando mostra o rosto e começa a interagir com a plateia, sua verdade fica clara. Quem está ali não é só a maluca que se veste com pedaços de carne crua. É uma moça feiosa porém imensamente carismática, dona de um enorme talento musical.
E que conquista a plateia com uma mensagem que chega a soar piegas, mas em perfeita sintonia com os dias de hoje. Gaga celebra a diversidade, a tolerância, o "seja quem você é".
Impossível não compará-la com Madonna, em quem ela busca óbvia inspiração para depois transcender. Madonna, apolínea e impecável, diz que todo mundo é fabuloso, e que isto merece ser comemorado. Gaga é dionisíaca e vai além: no mundo dela, a comemoração acontece mesmo que você, de fabuloso, não tenha nada.
Assim como aconteceu no Rio, em São Paulo ela também chamou alguns fãs ao palco. Eles choraram e tremeram tanto que pareciam estar em pleno transe religioso, e de certa forma estavam. Mas neste momento a cantora desceu do pedestal, fazendo questão de mostrar que é tão comum como qualquer um.
Tecnicamente, o show parece dar um passo atrás. Enquanto quase todos os astros contemporâneos usam cenários virtuais em telões gigantescos, Lady Gaga trouxe um castelo "de verdade", concreto, com torres e escadarias.
Também há um holograma de seu rosto dentro de um diamante formado por lâmpadas de néon, carcaças "fake" de boi penduradas como num açougue e muitas outras coisas que nem tentam fazer sentido. Há momentos que lembram um espetáculo na Disney World, outros que parecem a Broadway de 50 anos atrás. Um bom diretor talvez desse um jeito no caos reinante.
Mas talvez a ideia seja essa mesma. O planeta Gaga não tem ordem: é bagunçado feito um quarto de adolescente. E eles adoram, porque se veem nela. "Você nasceu desse jeito, e isto é maravilhoso". Gaga ooh la la la.
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