Tony Goes

Shows como o de Lady Gaga só valem a pena na pista premium

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Você sai cedo de casa. Enfrenta um ônibus lotado, um táxi a preço exorbitante ou um estacionamento improvisado onde Judas reencontrou as botas. Depois ainda amarga algumas horas na fila para entrar no estádio, debaixo de um sol escaldante.

Uma vez lá dentro, é uma luta de foice para conseguir um lugar razoável. Os ambulantes não dão trégua: continuam circulando (e atrapalhando a sua visão, que já não é das melhores). Alegam, com afetada humildade, que estão trabalhando, enquanto você estaria se divertindo --como se você não tivesse trabalhado muito para pagar o seu ingresso. Ah, e boa sorte se você precisar ir ao banheiro.

Finalmente o show começa, com mais de uma hora de atraso. Você aponta um par de binóculos para o palco, mas só vê formiguinhas rebolando. Pelos telões dá para discernir mais detalhes, mas nada que se compare à imagem de um DVD. Que você poderia estar vendo no conforto de sua própria casa.

Na saída, o caos é ainda maior. Cai uma chuva fina. O transporte público evaporou. O carro de um amigo, estacionado em local proibido, foi multado E arrombado. Você caminha alguns quilômetros até encontrar um ponto cheio de gente. Dali a muitos minutos, passa um ônibus solitário --e abarrotado.

Com uma pitada de exagero, esta é a via-crucis de quem se propõe a assistir a um megashow. E olha que eu excluí dessa rotina alguns elementos, raros porém graves, como brigas ou acidentes.


É também uma das razões que, no meu entender, explicam o encalhe dos ingressos para as apresentações de Lady Gaga e Madonna. Claro que há outros motivos, muitíssimo bem enumerados por Lúcio Ribeiro em um post em seu blog "Popload", na segunda-feira passada: ingressos pela hora da morte, concentração de estrelas na mesma época e modismos passageiros. Gaga provavelmente teria lotado vários estádios se tivesse vindo ao Brasil dois anos atrás.

Mas as duas divas do pop ainda têm fãs fiéis, e dispostos a pagar qualquer coisa pela proximidade com elas. Tanto que os ingressos para a chamada "pista premium" de seus shows, mais perto do palco, se esgotaram em poucas horas.

Mas o resto encalhou, a ponto de virar piada nas redes sociais. Tem gente dizendo que basta entrar no elevador do prédio onde mora para ganhar um par de ingressos.

Acho que boa parte do público simplesmente calculou a relação custo-benefício. Não vale a pena pagar tão caro e passar por mil perrengues para ver um show de tão longe. De perto, vá lá, pensam os mais exaltados. Os menos preferem ver na TV.

Quais serão as consequências deste novo fenômeno? Grandes nomes da música vão hesitar antes de vir ao Brasil? Ou suas apresentações por aqui ficarão mais parecidas com as que fazem no hemisfério norte, em lugares menores e mais confortáveis, e a preços mais acessíveis? Torço que sim, mas não conto com isto.

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

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