Pessoas têm apagado perfil no Facebook e em outras redes sociais para aproveitar mais a vida
Motivos são variados, como tempo dedicado ou insegurança em relação a dados pessoais
Muita publicidade, falta de notícias interessantes, perda de tempo e o receio de ter os dados divulgados. São esses fatores que vêm motivando cada vez mais gente a sair das redes sociais, especialmente do Facebook. "Quem abandona, normalmente, já vinha questionando o Facebook havia muito tempo", diz Pedro Arthur Nogueira, diretor da agência digital Virtual Jam e especialista em mídias digitais.
Recentemente, a rede social comandada por Mark Zuckerberg admitiu que as informações de cerca de 87 milhões de usuários foram utilizadas sem o consentimento deles pela empresa americana Cambridge Analytica para fazer propaganda política nas eleições de 2016, nos EUA. Desse número, 443 mil seriam brasileiros. "O vazamento de dados impactou aqueles que acompanham notícias e que anunciavam no Facebook. Tive que fazer reuniões com seis de cada dez clientes para falar sobre a credibilidade do Facebook", diz.
O vazamento de dados fez com que muitos usuários abandonassem a rede social. Entre eles, o bancário Gidalte Lúcio, 30. "Depois desse problema, resolvi sair definitivamente. Também notei que o Face já não conecta mais as pessoas como antes. Muitos amigos nem têm mais usado essa rede, alguns
foram para o Instagram ou o Twitter."
Ainda que considere a própria decisão acertada, Lúcio reconhece que sentiu falta do Facebook, no começo. "Me deu a sensação de que eu estava perdendo algo, que poderiam aparecer notícias ou informações de amigos e que eu não as veria. Mas a vontade de sair foi maior. O Facebook, para mim, virou uma máquina de publicidade", diz Lúcio.
Pollyana Ferrari, especialista em mídias sociais, concorda. "Quando o acesso é gratuito, é porque a mercadoria é você", define ela. "Quem tem um Facebook está destinado a receber anúncios de todos os temas, e as pessoas se cansaram de tantos links patrocinados. Quando o Facebook surgiu, diziam que era uma plataforma para locais de encontro e praças de conversas entre amigos. Hoje não há mais essa troca."
Ela relembra ainda das notícias falsas, ou “fake news”, disseminadas em peso nas mídias sociais, o que prejudica a credibilidade da rede. "Disseminam notícias que são inverdades, e aqueles que não têm preparo para desconfiar e checar a fonte passam a informação adiante sem o menor critério."
Segundo a especialista, deparar-se com "fake news" tem motivado os usuários a se questionarem sobre o motivo pelo qual ainda mantêm o perfil ativo. "Eu mesma já tive vontade de sair. Só não o faço porque trabalho com isso e preciso estar sempre ligada."
A farmacêutica Gabriela Ribeiro Martins, 25, excluiu seu perfil no Facebook, mas não por notícias falsas nem vazamento de dados. "Saí por três razões: perdia muito tempo vendo coisas que não eram úteis, além de temas que não eram de meu interesse. Fora isso, o Facebook prejudicava o meu relacionamento amoroso, causava muitas brigas. Tínhamos atritos por causa de ciúme, e isso estava atrapalhando o namoro. Então, nós dois decidimos excluir nossos perfis. E deu certo."
Gabriela afirma que sentiu falta logo que saiu. "Tenho parentes de outras cidades, e nosso principal contato era pelo Face. No começo foi mais difícil, mas só até trocarmos telefones e nos falarmos por WhatsApp. Percebi, com o tempo, que as pessoas que se gostam continuam a manter contato, mesmo sem rede social."
SEM DANOS
A psicóloga Mariana de Rezende explica que as redes sociais não devem causar danos pessoais nem emocionais aos seus usuários. "Hoje, vemos uma superexposição na internet, além da idealização de felicidade, o que gera uma comparação entre a pessoa que está postando e a que a está vendo. Desta forma, as redes acabam por despertar ansiedade e depressão, pois a sensação que dá é que o outro está vivendo uma vida maravilhosa, e a gente, não."
A regra nas redes sociais, de acordo com a psicóloga, é que a pessoa precisa aparentar ser feliz. "Já tive que indicar a um paciente que saísse das redes, e o resultado foi ótimo. Ele começou a olhar para a própria vida, para o seu interior, em vez de focar a vida alheia."
Para Mariana, quando é gasto tempo demais nas redes, alguma tarefa fica por fazer. "A desmotivação com relação às redes sociais tem também a ver com o fato de a pessoa querer dedicar seu tempo a fazer outras coisas." Mas nem tudo é crítica. A psicóloga destaca que as redes ajudam a conectar pessoas, facilitando o acesso e o conta to entre elas. "Claro que há muitos benefícios, como reencontrar amigos."
Foi o tempo que interferiu na decisão do marceneiro André Dip, 25, de sair do Facebook. "Era tempo perdido. Eu tinha a ilusão de estar próximo das pessoas, mas as redes mais me distanciavam do que me aproximavam delas. Quando eu saí do Facebook passei a realmente encontrar pessoas com quem, antes, eu só combinava algo. Já tem quase quatro anos que excluí meu perfil e não sinto falta. Hoje, os amigos
já sabem que eu não tenho Face e me avisam dos eventos por WhatsApp para eu não perder nada. E não acho que esteja perdendo, mesmo. Sinceramente."
Para Pedro Gurgel, presidente da agência de propaganda Capital Mídia, as informações inúteis no mural das pessoas acabam desgastando a rede social. "O que causa a saída das pessoas é a quantidade de dados inúteis, e o Facebook já tem tomado providências para evitar isso. Ele tem trabalhado para
excluir os perfis falsos, outra coisa que atrapalha demais", conta Gurgel. "A tendência da maior parte do público que sai do Facebook é mudar para o Instagram, que é uma rede social mais voltada para fotos e vídeos."
PRIVACIDADE EM RISCO
Em um ambiente virtual em que a exposição da vida pessoal é facilitada e estimulada, excessos nesse sentido podem ter como consequência a sensação de vulnerabilidade. E essa insegurança também está entre as justificativas de quem deixa o Facebook.
Fabiana Vaz Arten, 33, analista administrativa, é uma dessas pessoas. Entrava na rede social diariamente, até que começou a ter problemas com sua segurança. "Já tem dois anos que saí do Facebook. Na época, tive que entrar na Justiça contra uma pessoa que me deu um calote, pois comecei a receber ameaças dela pela minha página. Como não sabia do que essa pessoa era capaz, fiquei com medo da exposição da minha vida e da de meus familiares. Achei arriscado continuar ali. Usava
as configurações de privacidade e filtrava tudo o que publicavam a meu respeito, além de fotos em que eu era marcada, mas, ainda assim, não me sentia segura."
Por conta disso, Fabiana decidiu excluir seu perfil. "Além dessa história, eu já fiquei bastante irritada porque a maioria posta uma vida de contos de fadas na rede. As pessoas acham que todos devem acreditar naquilo."
Ela afirma que considera esse ambiente virtual um terreno perigoso. "Tem gente que se perde e que deixa de aproveitar a vida em busca de curtidas, comentários e visualizações em suas postagens. Acho triste quando viajo e as pessoas mal olham a paisagem porque estão em busca da melhor foto, ou, ainda, quando vejo famílias e amigos que nem conversam nos restaurantes para estar online. Acabam todos perdendo um momento que era para ser de interação e alegria entre eles."
Para Fabiana, as redes são muito superficiais. Por isso, ela prefere compartilhar suas fotos apenas por
WhatsApp. "Assim, eu bato papo e interajo com os amigos de verdade. Não sinto a menor necessidade de saber o que as pessoas andam fazendo a todo momento em suas vidas."
A psicóloga Mariana de Rezende afirma que, atualmente, o descontentamento com as redes sociais é comum. "Sugiro que a pessoa faça uma avaliação. Se sentir que a internet está atrapalhando de alguma forma, vale avaliar se deve excluir o perfil."
Ela ainda completa: "As redes podem servir de gatilho para desencadear a depressão, por exemplo, e muitas pessoas nem imaginam isso. Já vi casos, especialmente de adolescentes, em que as redes contribuíram para problemas de saúde mental".
A especialista em mídias sociais Pollyana Ferrari diz: "Não vai acontecer nada se você ficar uma hora sem olhá-las. Você não perderá nada de essencial à sua vida". Ela aconselha que os viciados em mídias sociais sejam mais seletivos e usem as ferramentas de privacidade a seu favor.
"Deixe o Instagram em modo privado, controle as marcações de amigos no Facebook, observe bem o que vai postar e não se esqueça de checar sempre a fonte de qualquer notícia que vá republicar."
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