Carol Duarte diz que novela não muda padrões incrustados, mas é benéfica pelo debate
Atriz está no ar como o homem trans Ivan, em 'A Força do Querer'
Atriz está no ar como o homem trans Ivan, em 'A Força do Querer'
Quatro anos após estrear em novelas, a atriz Carol Duarte, 29, está podendo rever seu primeiro papel na reprise de “A Força do Querer” (Globo, 2017). Muito além de gostar ou não de acompanhar a trama de Ivana, ela afirma que “olhar a personagem hoje é entender que o Brasil mudou para frente e para trás”.
“Claro que a gente muda a forma de ver o mundo, ainda mais nesse momento em que tudo anda tão acentuado e difícil. O Brasil tem faces que não estavam tão evidentes em 2017, o governo insiste em dar passos para trás”, afirma ela, que, por outro lado, destaca como positivo a maior representatividade nos espaços de poder.
Ivana no folhetim é uma jovem confusa com seu corpo, que no decorrer da história se descobre um homem trans. Nesta semana, ela revelou aos pais, Joyce (Maria Fernanda Cândido) e Eugênio (Dan Stulbach), sua identidade e contou que já começou seu processo de transição, o que acarretou e ainda acarretará novas crises familiares.
Apesar da trajetória polêmica do papel, Ivana, que logo passará a ser chamada de Ivan, foi abraçada pelo público há quatro anos e volta a ter a mesma aceitação agora. Para a atriz, resultado da forma como o personagem foi desenvolvido, sem defeitos éticos, com um caráter limpo, uma pessoa boa.
Além disso, Duarte diz acreditar que a própria descoberta de Ivana foi o principal ponto para a aceitação: “Ivan tem muitas cenas sozinho, falando consigo mesmo ou com o espelho. Quando ele se entendeu e mostrou seu alívio, esperança e coragem o público se realizou junto”, afirma ela.
Para a atriz, no entanto, a maior dificuldade em dar vida a Ivana/Ivan foi na verdade o ritmo de trabalho, já que nunca tinha feito uma novela antes. “Meus companheiros de cena foram muito pacientes e os câmeras do estúdio junto com o Rogério Gomes [diretor] e os outros diretores me ensinaram demais."
“A resposta rápida do público foi fascinante, mas nos bastidores foi um ano dedicado ao Ivan, entre preparação e gravação, são muitas as cenas gravadas por dia, além da minha ignorância técnica com um set de filmagem”, brinca a atriz, que estrelou em seguida a novela “O Sétimo Guardião” (Globo, 2018-2019).
No último ano, no entanto, Carol Duarte ficou longe dos novos projetos devido à pandemia do novo coronavírus. “Tudo parou, peças canceladas, viagens de trabalho canceladas, série adiada. Segui estudando e desejando me dedicar em outras funções, não só como atriz”, afirma ela, que agora já se prepara para filmar um novo filme.
“Aprendi a regar melhor minhas plantas e entender que tudo passa, sei fazer bolo e li mais livros, assisti a mais filmes. Mas foi e está sendo difícil [a pandemia], são muitos os mortos, desemprego. São irreversíveis alguns estragos desse governo, é devastador saber que estamos num barco furado com essa gente do pior escalão nos guiando.”
Apesar da carreira ainda curta nas novelas, Carol Duarte parece ter dedo certeiro na escolha de seus papeis. Após Ivana/Ivan, em “A Força do Querer”, ela deu vida à prostituta gaga Stefânia, em “O Sétimo Guardião”, também uma personagem desafiadora e sucesso entre o público.
A atriz, no entanto, se mostra bastante cautelosa em relação ao poder que as novelas têm e afirma que elas não mudam pensamentos, apenas abrem debates. “Precisamos aprender a conviver com aquilo que foge à ‘normalidade’ imposta. Sabemos que não é uma novela que muda os padrões incrustados, mas ser benéfica no debate público.”
“Mas a luta é dura porque somos o país que mais assassina pessoas LGBTQs”, continua ela. “A verdade é que somos um país violento, sempre fomos, mas só com engajamento público e político é que vamos mudar. Não é possível uma sociedade justa e livre com qualquer um de nós oprimido e violado.”
Duarte afirma que quer sempre estar envolvida em projetos que façam sentido. “Escolho pelos artistas envolvidos, pelo tema e ponto de vista escolhidos, pelo desafio... Adoraria fazer uma vilã bem novelesca ou uma peça que faça o público sair desnorteado de tão maluca, já no cinema eu quero abrir horizontes fora da nossa fronteira, atuar em outra língua.”
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