Televisão

Como a série 'Eu Nunca...' ajuda a quebrar estereótipos sobre sul-asiáticos

Nova série da Netflix retrata adolescência pelo olhar de filha de imigrantes

Paxton (Darren Barnet) é o crush de Devi (Maitreyi Ramakrishnan) na série 'Eu nunca...' - Lara Solanki/Netflix
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Jéssica Nakamura
São Paulo

"Eu Nunca..." mal estreou (a produção chegou ao catálogo da Netflix em 27 de abril) e já vem sendo celebrada como um divisor de águas na representação dos sul-asiáticos (também conhecidos como "asiáticos marrons") em Hollywood. Isso porque a nova série de Mindy Kaling, 40, trata de dramas da adolescência sob a ótica de uma adolescente que nasceu nos Estados Unidos, mas é filha de um casal de imigrantes indianos, tendo sido educada com influência tanto da cultura de seus antepassados quanto do país em que cresceu.

Quem assumiu o desafio de dar vida à protagonista Devi Vishwakumar após derrotar outras 15 mil concorrentes foi a atriz Maitreyi Ramakrishnan, 18, que nasceu no Canadá mas, assim como Mindy, é descendente de tâmeis. Em entrevista à Variety, Maitreyi disse estar muito feliz com o carinho que tem recebido de pessoas que se identificam com a personagem: "Seja algo simples como uma das piadas sobre os pelos nos braços ou alguém me dizendo 'obrigada, isso me fez perceber que eu ainda tenho algumas coisas relacionadas à morte de um parente para desenterrar'. Era tudo que eu queria para essa série".

Maitreyi também celebrou a representatividade da série, visto que asiáticos estão normalmente relegados a um papel secundário ou de alívio cômico. "Não há nada de errado com isso, mas não é legal quando, além de ser ofensivo, é nossa única opção, porque isso faz com que a gente se veja apenas como um coadjuvante, como alguém que não tem importância. E quando você se identifica com uma personagem, normalmente é uma pessoa caucasiana e aí você percebe que está vivendo sua vida nas sombras como uma pessoa de cor e que só consegue se ver por meio de personagens brancas, o que também não é totalmente legal".

Além disso, a atriz apontou para a importância de retratar o esforço de Devi para que seu sobrenome, Vishwakumar, seja pronunciado corretamente. "É importante porque é o nome dela. Você merece ser chamada do jeito que quer ser chamada, independentemente de qualquer coisa", contou a atriz, revelando que costumava adaptar seu nome à língua inglesa no Canadá, mas parou de fazê-lo quando chegou em Los Angeles e viu o cuidado que tiveram de perguntar como seu nome era pronunciado corretamente: "Pensei 'meu Deus, é a minha chance de recuperar meu nome, porque eu amo meu nome. Por que eu ia querer mudá-lo?".

QUEBRA DE ESTEREÓTIPOS

Neta de indianos, autora de dois livros sobre a migração de indianos aos Estados Unidos, a jornalista norte-americana S. Mitra Kalita destacou, em artigo publicado na CNN Digital (da qual é vice-presidente sênior de notícias, opinião e programação), alguns pontos da série que ajudam a quebrar estereótipos sobre os sul-asiáticos (também conhecidos como "asiáticos marrons").

Um deles é o fato de que a protagonista Devi faz terapia, um ato revolucionário dentro de uma cultura que trata a saúde mental como um tabu. "Ninguém vê problema em uma pessoa procurar ajuda, mas quando se trata da própria saúde mental, ainda sentem muita vergonha", disse Maitreyi em entrevista à Teen Vogue. "É aquela mentalidade do tipo 'ah, se você precisa, você pode procurar ajuda, mas eu tô bem, tá tudo bem comigo, eu não preciso de ninguém'".

'Eu nunca...' quebra o estereótipo na hora de representar mulheres sul-asiáticas - Lara Solanki/Netflix

Outro ponto é o fato de Mohan, o pai de Devi, ser um pai extremamente sensível e amoroso. "É um distanciamento revigorante do pai imigrante nerd e antissocial normalmente retratado como rígido, autoritário e emocionalmente distante", celebra a jornalista, que também destaca a forma como as mulheres são representadas na produção. Embora Nalini, a mãe da protagonista, se esforce para seguir a tradição, ela também anda de moto. Já sua prima Kamala, que está terminando seu doutorado nos Estados Unidos, tem um namorado secreto e não quer aceitar o destino de um casamento arranjado. "Issotambém marca uma mudança do retrato usual da mulher sul-asiática, que coloca a família e a cultura sobre seus próprios desejos", defende S. Mitra.

Por fim, embora a maioria dos filmes que se passam no colégio costume dividir os nerds dos populares, Devi mostra que as meninas que se preocupam em manter os estudos em dia e as notas altas para passar nas melhores faculdades também se interessam por festas, crushes e sexo. "Ela corre atrás do objetivo de fazer sexo e arrumar um namorado com tanto fervor (talvez mais, até) quanto se dedica a tirar boas notas e participar em atividades extracurriculares", finaliza a jornalista.

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