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Música

Tom Chaplin reflete sobre passagem do tempo e crise de meia-idade em álbum solo

Com 'Midpoint', vocalista do Keane diz que aprendeu a viver com menos altos e baixos

Tom Chaplin Divulgação

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São Paulo

"I'm getting old and I need something to rely on (estou ficando velho e preciso de algo em que confiar)", cantava Tom Chaplin, 43, nos vocais de "Somewhere Only We Know", primeiro grande sucesso do Keane. Na época, com 20 e poucos anos, ele nem sonhava que o álbum de estreia da banda se tornaria um dos mais vendidos dos anos 2000.

"A maioria das pessoas acha que essa canção é de amor", diz o cantor ao F5. "Para mim, ela é sobre os lugares onde a gente costumava ensaiar naquele período. Lembro de nós, como banda, tentando lutar para sermos ouvidos pelo mundo. Mas todo mundo escuta essa música de forma diferente, acho que é o que faz ela ter um apelo tão universal."

Quase duas décadas depois, o músico continua refletindo sobre a passagem do tempo. Ele lança na sexta-feira (2) o álbum solo "Midpoint", no qual fala sobre o assunto por outra perspectiva: a de quem viu o tempo passar. O nome do trabalho segue o do primeiro single lançado, no qual ele diz que "você sabe quando está ficando velho".

"É um álbum que aborda essa parte da vida em que me encontro agora, com 40 e poucos, tendo passado quase 20 anos em um relacionamento e morando em uma casa com filhos há um bom tempo", conta. "É um momento em que você para e percebe que talvez metade da sua vida já tenha ficado para trás."

O cantor diz que isso faz com que alguns questionamentos comecem a aparecer. "Isso força você a refletir se você está feliz, se conseguiu tudo o que queria, sabe?", comenta. "É o clássico período em que algumas pessoas acabam tendo uma crise de meia-idade, comprando um carrão novo ou abandonando as próprias famílias. Pode ser uma fase bem assustadora, então cada um reage de um jeito."

Chaplin (que diz desconhecer qualquer parentesco com Charlie Chaplin) conta que acabou canalizando isso para a música. "Ainda estou na meia-idade, não é algo que já acabou, mas acho que o que mais me pegou foram essas questões sobre se estou bem mesmo no meu relacionamento e na minha carreira ou se queria provocar um rompimento para começar tudo de novo."

"São ideias bastante sedutoras, é por isso que muitas pessoas acabam tomando esse caminho", avalia. "Será que uma nova parceira pode me trazer mais tesão ou pelo menos novidade para a minha vida? Talvez traga por um tempo, mas isso nunca dura muito... Então, todas essas ideias estavam pipocando em mim."

A partir dessa música, o resto do álbum foi fluindo naturalmente —sempre com essa temática como pano de fundo. O músico diz que escolheu um ponto de vista esperançoso e otimista. "Acho que dá para atravessar tudo isso", afirma. "Dá para chegar ao outro lado se sentindo feliz, desde que você aceite que não tem mais 21 anos."

"Você não tem mais a mesma energia que já teve um dia e não dá para fingir que ainda tem", diz. "Não dá para evocar o desejo da mesma forma. E isso não é necessariamente uma coisa ruim. É só algo ao qual você precisa se adaptar."

Para ele, uma das principais formas de perceber essa mudança foi pelo ouvido. "Eu fico pensando no quanto eu era arrebatado pelas músicas quando era adolescente, era algo muito poderoso", lembra. "Hoje em dia é muito mais difícil uma música ter o mesmo poder sobre mim e me tocar tão profundamente."

O britânico explica que vivia em outra intensidade e exemplifica com o quanto ficou extasiado ao ouvir pela primeira vez o álbum "Okay Computer" (1997), do Radiohead. "Perceber que você talvez não sinta mais algumas coisas pela primeira vez é quase um luto que você tem que viver", compara.

Porém, Chaplin diz que também há algo de libertador nisso. "Quando passa, você percebe que não é o fim do mundo", diz. "O que aprendi ao longo dos anos é que o que torna tudo mais suave é estar conectado com as pessoas, sentir-se amado, ter um lar para chamar de seu... Criar uma pequena bolha na qual se refugiar."

Enquanto os rapazes do Keane tinham uma imagem de roqueiros "bonzinhos", o vocalista lembra que passou muito tempo lidando com seu vício em drogas. "Eu não tinha nada de bonzinho, de verdade", revela. "Tinha uma parte de mim que era educada e tentava dizer a coisa certa, mas a outra parte era muito autodestrutiva e infeliz."

Atualmente, ele está há quase 8 anos sem beber ou se drogar. "Passei muito tempo achando que sucesso, adoração e grandes picos, fossem musicais ou induzidos por drogas, é que me fariam feliz", compartilha. "Tentei isso por muitos anos, e não funcionou. Pelo contrário, era isso o que estava me matando."

Foi só com a maturidade que veio a certeza de que nem tudo precisava ser 8 ou 80, algo que ele explora na canção "Rise and Fall". "Estamos sempre caindo e nos levantando, é a natureza da vida, mas para mim tudo era muito extremo, os altos eram muito altos e os baixos eram desesperadores e realmente horríveis", afirma.

"Era exaustivo viver nesse estado, atualmente eu procuro achatar essa curva", conta. Ocasionalmente, ainda anseio pelos altos altíssimos, mas sei que isso tem um preço, então estou satisfeito com o espaço que ocupo agora."


Sobre a parceria com o Keane, que está suspensa desde a pandemia, ele diz não saber dizer se e quando será retomada. "Sei que pode parecer uma resposta ambígua, mas, sendo muito honesto, eu não sei o que vai acontecer", diz. "No momento, o seu palpite sobre o status do Keane é tão bom quanto o meu."

Ele diz que o último álbum da banda, "Cause and Effect" (2019), ainda está fresco na memória e que os integrantes chegaram a fazer algumas apresentações juntos, mas que atualmente é muito mais difícil se reunirem. "Todos temos famílias e, como diz a letra de 'Midpoint', nossas paixões se renderam às vontades do mundo, então é muito mais complicado encontrar a energia e o tempo para fazer novas músicas", lamenta.

O cantor afirma que é bem diferente fazer as próprias músicas ou trabalhar com os colegas Tim Rice-Oxley, Richard Hughes e Jesse Quin. "No Keane, o Tim faz a maior parte das músicas e eu canto, essa combinação, que deu certo por muito tempo, acabou ficando engessada", compara.

"Eu não gostaria de começar a escrever letras para o Keane, porque não funcionaria", diz. "O que eu amo da banda é tocar ao vivo e celebrar o catálogo de canções que nós criamos. Porém, isso não me dá o mesmo nível de liberdade criativa que a carreira solo."

Chaplin diz que o processo de fazer um álbum solo é bem mais artesanal. "A composição e a gravação são momentos muito preciosos, e eu me divirto muito fazendo", diz. "Não é a mesma dinâmica com o Keane —e está tudo bem. Não estou criticando a banda, só estou dizendo como é. Lá, somos nós quatro, sempre foi assim e é como acho que deve continuar sendo."

O cantor ainda não sabe se vai conseguir vir ao Brasil com seu show independente —as apresentações no Reino Unido com o novo repertório começam também na sexta-feira. "Tenho que fazer dar certo do ponto de vista financeiro, porque obviamente uma turnê solo não teria shows tão grandes, mas eu adoraria ir", afirma. "Não temos nada confirmado, mas espero conseguir aparecer por aí no próximo ano."

A última vez que ele esteve no país foi em 2019, quando o Keane voltou à ativa, após um período de seis anos em que o quarteto deu um tempo. "Os fãs da América Latina, e isso certamente inclui o Brasil, trazem uma energia inegável e uma atitude muito alegre para os shows", conta. "Isso é garantido por aí e um contraste muito peculiar com o meu dia a dia e com tudo o que passamos no mundo ultimamente."

Ele também lembra com carinho da forma "bonitinha" como os brasileiros pronunciavam o nome da banda cantando "olê, olê, olê, quí-nê, quí-nê". "Nosso último show em São Paulo, que foi o último da turnê, foi brilhante, a banda estava ótima, a viagem foi maravilhosa e a plateia estava enlouquecida", recorda.

Porém, a lembrança que primeiro vem à cabeça quando alguém fala do Brasil é a vista do hotel à beira-mar no Rio de Janeiro. "Eu olhava pela janela do quarto e via aqueles caras jogando futebol na praia ou fazendo embaixadinhas na areia, e o nível de habilidade... era puro talento, é simplesmente brilhante."

"Eu amo futebol e adoro jogar futebol, mas não sou muito bom", admite. "Na minha cidade natal [Hastings], onde eu costumo jogar, são seis de cada lado, e todos acham que são ótimos, mas não são! Eles são todos uns lixos. É só vir ao Brasil para entender isso."

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