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A polêmica das candidatas a miss 'idênticas' na Índia

Participantes do Miss Índia 2019; críticos dizem que elas todas se parecem e não representam a diversidade de tons de pele do país
Participantes do Miss Índia 2019; críticos dizem que elas todas se parecem e não representam a diversidade de tons de pele do país - BBC News Brasil/Getty Images
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Descrição de chapéu BBC News Brasil
GEETA PANDEY
Nova Déli

Concurso popular entre o público indiano e responsável por alçar à fama estrelas de Bollywood, a competição Miss Índia costuma ser um divisor de águas na vida de suas participantes. As competidoras deste ano, porém, se viram no centro de uma polêmica, depois de críticos acusarem os organizadores do concurso de privilegiarem garotas de pele clara.

Uma colagem do rosto das participantes publicada no jornal Times of India –que pertence ao mesmo grupo organizador do Miss India - mostra os rostos das 30 belas mulheres. Mas quando um usuário do Twitter postou as imagens e questionou "o que está errado com isto?", o assunto ganhou força nas redes sociais.

Com volumosos cabelos à altura dos ombros e tons de pele aparentemente idênticos, as mulheres "parecem todas iguais", na opinião de algumas pessoas. Outras disseram, em tom de ironia, que talvez elas fossem "todas a mesma pessoa".

A discussão evoluiu para a ideia de que, embora não haja nada de errado com as competidoras em si, a falta de diversidade em tons de pele –em um país onde grande parte das mulheres tem pele escura - pode evidenciar uma obsessão indiana por meninas de aparência clara.

A BBC entrou em contato com os organizadores do Miss India, mas não obteve resposta até o momento.

Aishwarya Rai, que foi Miss Mundo em 1994; Índia tem tradição de misses ganharem proeminência no mundo do entretenimento do país
Aishwarya Rai, que foi Miss Mundo em 1994; Índia tem tradição de misses ganharem proeminência no mundo do entretenimento do país - BBC News Brasil/Getty Images

'TRAINEE DE MISS'

Concursos de beleza são populares na Índia desde os anos 1990. O país produziu diversas misses que se tornaram estrelas nacionais e internacionais, como Priyanka Chopra, ex-miss que hoje faz carreira em Hollywood.

Com o passar dos anos, começaram a surgir pelo país diversas empresas especializadas em treinar jovens interessadas em participar de concursos do tipo. No entanto, a maioria das meninas que ascenderam são as de pele mais clara.

Isso é um reflexo de o que acontece no cotidiano do país: muitos indianos consideram os tons de pele mais claros "superiores" aos escuros, a ponto de sempre ter sido aceito que peles mais claras tenham valor mais alto no "mercado matrimonial".

E desde os anos 1970, quando o "creme de branqueamento" Fair and Lovely surgiu no mercado, cosméticos que prometem clarear o tom de pele estão entre os mais vendidos no país, tendo inclusive atores e atrizes de Bollywood como garotos-propaganda.

Em 2005, surgiu o creme em versão masculina, Fair and Handsome, que foi endossado pela estrela bollywoodiana Shah Rukh Khan e se tornou um sucesso.

DISCRIMINAÇÃO PELA COR

Alguns dos cosméticos prometem não apenas pele mais clara, mas também uma vida melhor –são propagandeados como forma de se obter empregos mais glamourosos e conseguir um relacionamento amoroso. E, para muitos, concursos de beleza acabam perpetuando esses estereótipos.

Nos anos recentes, houve campanhas para questionar esse favorecimento, celebrando a beleza das peles mais escuras. Uma das iniciativas, no início do ano, consistiu em um ensaio fotográfico para retratar os populares deuses e deusas indianas com pele escura.

Mas isso não impediu a enxurrada de novos cremes e produtos em gel que prometem clarear desde as axilas até a genitália feminina. Segundo estimativas, o mercado de produtos femininos de clareamento deve movimentar US$ 716 milhões em 2023.

Defensores desse mercado dizem que se trata de uma escolha pessoal, assim como mulheres usam batons para deixar seus lábios mais vermelhos. Em contrapartida, críticos dizem que a obsessão por pele clara e a percepção de que esta é "superior" reforçam, sutil mas constantemente, o preconceito social com pessoas de pele escura, que sentem os efeitos em sua autoestima e em suas perspectivas profissionais.

Modelos de pele escura, por exemplo, afirmam ser preteridas; Bollywood também tem poucas atrizes protagonistas que não sejam de pele mais clara. Em 2014, o órgão de autorregulação da publicidade na Índia, ASCI, emitiu diretrizes vetando comerciais que retratem pessoas de pele escura como "não atraentes, infelizes, deprimidas ou preocupadas", agregando que elas não deveriam ser mostradas em situação de desvantagem em questões como "matrimônio, empregos ou promoções".

Anúncios publicitários do tipo, porém, continuam a existir, embora sejam um pouco mais discretos atualmente. E atores e atrizes populares continuam a ser contratados como garotos-propaganda.
Ao mesmo tempo, há reações. A atriz Sai Pallavi afirmou recentemente ter recusado uma proposta milionária para endossar um creme clareador.

"O que vou fazer com o dinheiro que ganharia com essa campanha? Não tenho grandes necessidades. E digo que nossos padrões estão errados. Esta é a cor dos indianos. Não podemos buscar estrangeiros e perguntar por que são brancos. Aquela é a cor deles, e esta é a nossa", ela disse à imprensa local.

BBC News Brasil
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