Afinal, o que pretende Roberto Alvim?
Secretário especial da Cultura estarrece o país em vídeo com referências nazistas
Em 2009, Joaquin Phoenix anunciou que estava deixando de ser ator para se tornar rapper. Ao longo de todo aquele ano, o intérprete de “Coringa” apareceu nos talk shows da TV americana dizendo coisas desconexas, cantando mal e espantando seus fãs. Muita gente acreditou que ele tinha pirado.
Em 2010, Phoenix lançou o filme “I’m Still Here” (“Ainda Estou Aqui”), dirigido por seu então cunhado Casey Affleck. Um falso documentário sobre sua transição de carreiras. Tudo o que ele havia feito no ano anterior era apenas uma grande e elaborada performance. Uma atuação que extravasou os limites da tela. Uma pegadinha épica com a imprensa e o público.
Já pensou se Roberto Alvim estiver fazendo algo parecido? Todas as suas atitudes como integrante do governo Bolsonaro –o ataque gratuito a Fernanda Montenegro, a indicação de Sergio Camargo à presidência da Fundação Palmares, o vídeo cheio de referências nazistas divulgado na noite desta quinta (16)– fariam parte de um experimento teatral, para desmascarar de dentro do máquina governamental as pretensões autoritárias de seu chefe.
A hipótese é divertida, mas suspeito que a explicação para esses arroubos seja bem mais prosaica. Alvim descobriu, logo no começo do ano passado, que puxar o saco de Jair Bolsonaro lhe era bastante benéfico.
Ele começou de maneira discreta, ainda em 2018, postando nas redes sociais mensagens de apoio ao então candidato do PSL. Foi criticado por seus pares na classe artística, o que fortaleceu sua narrativa de perseguição. Disse que seu cabaré em São Paulo teria falido por causa do boicote da classe teatral, toda ela esquerdista. E ainda acrescentou uma história de superação com teor religioso, pois teria vencido um câncer depois de se entregar a Jesus.
Acabou chamando a atenção de Bolsonaro, que, já eleito, precisava desesperadamente de algum apoio, qualquer apoio, de alguém ligado à cultura. Alvim foi agraciado, em junho passado, com a direção da Funarte. Uma de suas primeiras medidas no cargo foi tentar contratar a empresa de sua mulher, a atriz Juliana Galdino, para tocar um projeto de 3,5 milhões de reais.
O caso não teve maior repercussão porque Alvim conseguiu abafá-lo com outro. Aproveitando que Fernanda Montenegro havia posado para a revista literária Quatro Cinco Um como uma bruxa prestes a ser queimada em uma fogueira de livros – uma alegoria da censura – o dramaturgo xingou-a de “sórdida” e “mentirosa” nas redes sociais, justamente em um ano em que a atriz era celebrada por seus 90 anos de vida.
Quase todo o Brasil repudiou o gesto, mas Bolsonaro gostou. E alçou Alvim ao comando da Secretaria da Cultura, a entidade mais próximas do que era o extinto MinC, hoje subordinada ao Ministério do Turismo.
Alvim logo começou a aprontar das suas. Apontou gente totalmente desqualificada para comandar bibliotecas, museus e instituições culturais. A indicação mais chocante foi a de Sergio Camargo, um jornalista negro que nega a existência do racismo estrutural no país, para o comando da Fundação Palmares, um órgão de fomento à cultura afro-brasileira.
A repercussão da escolha de Camargo foi péssima, mas Alvim não se aquietou. Em busca permanente de visibilidade, chegou a postar um vídeo em que aparece ao lado da família desejando feliz Natal aos brasileiros. Parece coisa de candidato em campanha eleitoral.
O vídeo desta quinta, também. Roberto Alvim demonstra que aprendeu, na cartilha com poucas letras de Jair Bolsonaro, que a maneira mais rápida de ganhar notoriedade é disparar barbaridades. A base de fãs conquistados é relativamente pequena, mas muito fiel e ardorosa.
Só que, dessa vez, será que ele não errou a dose? É óbvio que as referências nazistas não são acidentais. Roberto Alvim acredita mesmo no que diz, ou só quer afagar sua claque e escandalizar o resto do Brasil?
Ah, como eu queria que tudo isso fosse só uma performance.
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