Felipe Neto, um novo líder politico brasileiro
Ação na Bienal do Livro do RJ levou youtuber para um outro patamar
O começo desta década presenciou um fenômeno que não foi previsto por nenhum analista: a ascensão dos influenciadores digitais, também conhecidos como vlogueiros (blogueiros em vídeo) ou youtubers (por insistência do próprio YouTube, a plataforma favorita desses novos comunicadores).
A onda varreu o planeta inteiro, e é claro que o Brasil não ficou de fora. Nomes como Christian Figueiredo ou Kéfera Buchmann logo se tornaram ídolos de crianças e adolescentes, mesmo sem aparecer na TV. Entre tantas caras novas, uma se destacou: Felipe Neto, o primeiro vlogueiro brasileiro a conquistar um milhão de assinantes para seu canal no YouTube.
Hoje Felipe tem mais de 34 milhões de seguidores, muito mais do que seus colegas de ofício. Também é sócio de empresas ligadas ao setores de entretenimento e tecnologia. E começa a demonstrar um poder surpreendente para os adultos (entre os quais me incluo) que não acompanharam sua trajetória com o devido interesse: a capacidade de influenciar o debate político.
Não foi agora que Felipe Neto começou a incomodar os poderosos. Em 2017, o vlogueiro atacou o pastor evangélico Silas Malafaia, que convocou um fracassado boicote à Disney por causa de um beijo gay em um desenho animado produzido pela empresa.
A treta entre os dois escalou, e Malafaia entrou com um processo na Justiça. Propôs uma conciliação: Felipe tiraria do ar os vídeos em que denuncia esquemas fraudulentos em que o pastor estaria envolvido e pediria desculpas, e não se falaria mais nisso. Sem se deixar intimidar, o youtuber se recusou.
Essa e outras polêmicas em que Felipe Neto se envolveu costumam se restringir ao mundo virtual. Entretanto, no sábado (7) passado, o rapaz usou seu dinheiro e seu poder de mobilização para realizar uma ação concreta, de enorme repercussão no mundo real.
Em uma reação épica à atabalhoada tentativa de censura do prefeito Marcelo Crivella a uma graphic novel da Marvel à venda na Bienal do Livro do Rio de Janeiro, Felipe comprou 14 mil livros de temática LGBT, embalou-os em plástico preto e distribuiu-os gratuitamente na própria Bienal.
Os volumes esgotaram-se rapidamente. Mais tarde, no mesmo dia e já desembalados, foram empunhados por manifestantes indignados com a insistência do alcaide em devolver o Brasil à Idade das Trevas.
A extrema-direita tentou desqualificar Felipe Neto. Desencavaram um vídeo antigo em que o vlogueiro critica o movimento gay. Não funcionou: ele mesmo esclareceu que mudou de ideia por que – ta-dá! – leu muitos livros e abriu a cabeça.
Inconformados, os reacionários ainda levantaram hashtags no Twitter como #PaisContraFelipeNeto e #FelipeNetoLixo. Tampouco deu certo: os apoiadores de Felipe se apossaram delas, e os tuítes positivos ultrapassaram os negativos.
Enquanto isso, a mídia tradicional se surpreendeu com a firmeza e o alcance de Felipe Neto. O vlogueiro agora também é um autêntico líder político, capaz de dar voz aos anseios de uma geração e de apontar novos caminhos.
Felipe faz parte de uma nova leva de atores políticos, que inclui nomes como a deputada federal Tabata Amaral (PDT-SP) e os integrantes do MBL (que também vêm demonstrando amadurecimento em suas últimas declarações).
Mas ele irá se candidatar a algum cargo público? Tomara que não: Felipe Neto atinge muito mais gente –e afronta melhor seus adversários– de seu púlpito na internet. Convém prestar atenção aos seus próximos passos.
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