Tony Goes

Edital do Banco do Brasil amplia e distorce o significado de 'sexo explícito'

Questionário é vago o bastante para excluir quase todos os tipos de filme

Cena do filme "Bruna Surfistinha" (2011)
Cena do filme "Bruna Surfistinha" (2011) - Divulgação
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No cinema, a expressão “sexo explícito” quer dizer sexo para valer. Mão naquilo, aquilo na boca, aquilo entrando naquilo outro. Tudo escancarado diante das câmeras, sem deixar nada para a imaginação.

Não há notícia de que um filme desse gênero tenha buscado patrocínio no Brasil, seja estatal, seja em grandes empresas privadas. Seria mesmo de estranhar que uma marca famosa quisesse se associar a uma produção da Brasileirinhas.

No entanto, a BB DTVM, subsidiária do Banco do Brasil, achou por bem perguntar, em seu edital lançado nesta segunda-feira (12), se o projeto audiovisual candidato a receber recursos da empresa inclui cenas de sexo explícito.

Talvez os responsáveis pelo questionário temam que atores como Dreadhot ou Alemão, vencedores da última edição do Prêmio Sexy Hot, apareçam nesses filmes. Ou –bem mais provável— chamem de “sexo explícito” qualquer imagem ou diálogo que sugira, mesmo de leve, algum tipo de atividade sexual.
 
Não seria de se admirar. O próprio presidente Jair Bolsonaro disse que não haverá mais financiamento público para a pornografia, citando o filme “Bruna Surfistinha” como exemplo.

Quem viu o longa de Marcus Baldini, a segunda maior bilheteria nacional de 2011, sabe que nele há, sim, algumas cenas eróticas. Mas só na cabecinha de alguém com uma relação bastante complicada com o sexo é que elas podem ser consideradas pornográficas.

O mesmo edital pergunta se a obra inscrita “tem cunho religioso ou político” e “faz referência a crimes, drogas, prostituição ou pedofilia”. Parece razoável? Acontece que essas perguntas são vagas o bastante para barrar qualquer coisa que não seja destinada ao público infantil.

Imagine um filme em que uma força-tarefa da Polícia Federal desbaratasse uma rede de pornografia infantil. Um thriller empolgante, com o bem triunfando sobre o mal. Pelos critérios do edital da BB DVTM, esse projeto iria para o lixo.

Se os parâmetros são difusos, pelo menos uma coisa está clara: este governo quer nos infantilizar a todos. Haja vista a quantidade de cocô e outras secreções corporais presente no vocabulário de Bolsonaro. Uma linguagem digna da quinta série, atrelada a uma mentalidade medieval.

E ainda há uma ausência flagrante no questionário do edital. Não se pergunta se há cenas de violência na obra apresentada.

Pelo jeito, arminha pode. De todos os tamanhos.

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

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