Por que grandes marcas estão investindo em superproduções de curta duração para a internet?
Custos da mídia tradicional e restrições legais ajudam mudança
A pré-estreia do filme “Entering Red” não ficou nada a dever à de um blockbuster hollywoodiano. Na manhã de 5 de fevereiro deste ano, houve uma coletiva de imprensa em um cinema de Milão, com a presença das estrelas e do diretor. À noite, uma festa com direito a tapete vermelho e dezenas de fotógrafos.
As credenciais do filme são impressionantes. O diretor é Matteo Garrone, do premiado “Dogman”, representante da Itália no último Oscar e atualmente em cartaz no Brasil. Os atores principais são a cubana Ana de Armas (de “Blade Runner 2049”) e o italiano Lorenzo Richelmy (da série “Marco Polo”).
Só que “Entering Red” não é um longa-metragem. É um curta com 12 minutos de duração –disponível, por enquanto, apenas na internet.
Também é, para todos os efeitos, um comercial de Campari –ou melhor, um exemplar do chamado “branded content”, ou conteúdo patrocinado. Um número crescente de marcas importantes vem optando por esse estilo de comunicação.
Já é o terceiro ano consecutivo que Campari —o bitter vermelho que também é principal produto do Campari Group, especializado em bebidas alcoólicas— foge dos habituais comerciais de 30 segundos, preferindo investir quase toda sua verba de publicidade na produção de um curta-metragem com nomes consagrados do cinema e veiculação prioritária nas redes sociais.
O primeiro filme da campanha “Red Diaries” saiu em 2017. “Killer in Red” foi assinado por Paolo Sorrentino (Oscar de filme estrangeiro por “A Grande Beleza”) e estrelada pelo britânico Clive Owen (da série “The Knick”).
O filme foi visualizado cerca de 20 milhões vezes, tanto no canal de Campari no YouTube como em outras redes. Parece pouco se comparado ao público atingido pela TV. Mas os resultados foram satisfatórios, a ponto de a marca repetir a experiência em 2018 e 2019 (a Campari não divulga quanto investe na produção). O segundo curta-metragem, lançado no ano passado, “The Legend of Red Hand”, teve direção de Stefano Sollima (“Sicario: Dia do Soldado”), com Zoe Saldana (a Gamora de “Guardiães da Galáxia”) no papel principal.
Um filme para a internet tem um trunfo insuperável: o custo de veiculação é praticamente zero. No entanto, a Campari também promove o lançamento do curta em mídias tradicionais. Uma versão reduzida de “Entering Red” será exibida nos cinemas.
No caso de uma bebida alcoólica, ainda existe uma vantagem extra. Diversos países proíbem ou restringem (como o Brasil) a veiculação de anúncios da categoria na TV. Online, basta um aviso de que o material é inadequado para menores de 18 anos.
“Nós percebemos que os consumidores não gostam mais que alguém lhes diga o que fazer”, afirma Andrea Neri, diretor global de marcas italianas do Campari Group. “Eles preferem uma conversa de mão dupla, no ambiente das redes sociais.”
“Além do mais, Campari sempre se associou à arte e ao cinema”, prossegue Neri. É verdade: a Galleria Campari, na sede da empresa nos arredores de Milão, reúne mais de um século de peças publicitárias assinadas por grandes nomes das artes plásticas e do design. Este ano, Campari também será um dos patrocinadores do Festival de Veneza.
Como nos anos anteriores, também em 2019 foram convidados seis bartenders de diferentes países para criar coquetéis com Campari. A paulista Jéssica Sánchez, hoje baseada no Rio, representa o Brasil e aparece em “Entering Red”. Assim como o ator Joaquim Lopes, escolhido como embaixador da marca no nosso país. Todos os três curtas da campanha “Red Diaries” podem ser vistos no canal de Campari no YouTube, com legendas em diversos idiomas –inclusive o português.
Este é apenas um exemplo do avanço do "branded content" sobre a propaganda tradicional. Uma consequência importante dos novos hábitos de consumo, em que o streaming substitui a chamada TV linear (nada mais do que a televisão convencional, com canais e grades de programação). E vem mais por aí: as mudanças estão apenas começando.
Comentários
Ver todos os comentários