Tony Goes

Séries brasileiras: Agora vai?

As séries não são mais o futuro: são o presente de uma garotada

Fiorella Mattheis protagoniza a série "Rua Augusta"
Fiorella Mattheis protagoniza a série "Rua Augusta" - Divulgação
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Faz 20 anos que comecei a ouvir que as séries eram o futuro da TV. Naquela época, aliás, diziam que era um futuro imediato: mais um ou dois anos e todo mundo só vai estar vendo séries.

Entusiasmado com as possibilidades, participei de um projeto da Columbia Tristar Television que buscava implantar o formato americano de sitcom no Brasil --aquele bem tradicional, gravado na frente de uma plateia, com risadas invadindo os diálogos.

Quando "Santo de Casa" finalmente foi ao ar pela Band, a audiência não correspondeu. Mas tínhamos um público fiel, que nos acompanhava todas as semanas. Nossos fãs gostavam tanto que pediam mais: queriam que o programa fosse exibido todos os dias, com pelo menos uma hora de duração. Ou seja, queriam que a sitcom se transformasse em novela.

Meio século de novelas fez com que os brasileiros se aferrassem ao gênero. Até hoje, elas são o carro-chefe da nossa televisão. Dominam o horário nobre, e suas reprises se espalham pela faixa vespertina.

Mas alguma coisa está mudando. As séries, de fato, cresceram muito em importância --tanto comercial quanto cultural. Nos Estados Unidos começaram a atrair talentos de primeira linha, que antes preferiam fazer cinema do que se rebaixar na TV.

A crítica logo percebeu que séries dramáticas como "Família Soprano" ou "Mad Men" eram superiores a quase todos os longas produzidos por Hollywood, cada vez mais focada em super-heróis e continuações.

E a onda se espalhou pelo mundo, graças à internet. Seriados que estreavam lá fora nem precisavam chegar aos canais pagos brasileiros para causar impacto. Toda uma geração de jovens conectados não demorava a baixar os episódios online, de maneira ilegal, e até a produzir legendas para eles.

Com o advento da Netflix e outras plataformas de streaming, a ficha caiu para as emissoras abertas. As séries não são mais o futuro: são o presente de uma garotada que nunca viu uma novela inteira e não está nem aí para a grade de programação, com seus horários rígidos e intervalos comerciais.

A Globo passou a investir mais na produção de séries e minisséries, e foi seguida --em menor escala-- pela concorrência. Enquanto isso, a TV a cabo se viu obrigada por lei a produzir um mínimo de conteúdo nacional.

Isso propiciou que muitas séries brasileiras entrassem em produção, mais para cobrir cota que para atender uma real demanda do público. Quase sempre feitas com orçamento baixo, a maioria não passou da primeira temporada.

Só que, novamente, o quadro parece estar mudando. Nossas séries cresceram em qualidade e audiência, e algumas estão sendo vendidas para o exterior. "Players" como a HBO e a Netflix fazem encomendas e agitam o mercado.

O resultado está começando a aparecer. Só nesta semana, estreiam dois seriados brasileiros de peso: “Rua Augusta”, na TNT (nesta quinta, 15) e “Rotas do Ódio”, na Universal (no domingo, 18). Nesse mesmo dia, a HBO deslancha a quarta e última temporada de “O Negócio” em mais de 50 países.

Semana que vem tem mais: na sexta (23), toda a primeira temporada de “O Mecanismo” estará disponível na Netflix. A plataforma também já anunciou a produção de pelo menos outras três séries nacionais.

Então, agora vai? Difícil dizer. É provável que alguns desses títulos fracassem e outros sigam em frente. Mas o importante é que está se criando uma indústria, que não depende mais só da Globo.

Mais importante ainda é o surgimento de um novo espectador, que exige o mesmo padrão de acabamento das produções internacionais. É ele quem vai determinar, afinal, se o tempo das séries brasileiras chegou para valer.

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

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