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Krishna Mahon
Descrição de chapéu Sexo casamento

Com cuspe e jeito não há buraco estreito

Com krush (e com a vida) forma é quase tão importante quanto conteúdo

Obra de Adrianna Eu - Instagram/adrianna.eu
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Marinão diz que meu jeitinho de falar é tão calmo e doce que se eu mando a pessoa tomar no ku, ela agradece e vai, rs. Rola muito isso mesmo, confesso, mas esse dom desaparece quando mais preciso. Freud diz que quanto mais amamos alguém, mais temos para com essa pessoa uma relação de dependência. Isso nos torna muito vulneráveis e propensos aos piores afetos em relação àquela pessoa. Reações mais difíceis de controlar.

Pelo amor das deusas, me coloca para fazer uma negociação para um board de gringos, em inglês, valendo milhões em um projeto de série, mas não me faz explicar pela milésima vez para meu pai de 70 anos e minha avó de 90 que não dá mais para usar termos racistas como "neguinho".

Receber termos como "gostosa, tesão, delícia" de amigos gera risada, do Cauã ou do krush gera "quero" e de um desconhecido nas redes gera "credo". Tudo depende do interlocutor e da forma que as coisas são ditas. Sim, a forma conta quase tanto quanto o conteúdo. Mesmo que você não concorde com o conteúdo, repara no jeito de falar do Caetano, da Simone Tebet, do Chomsky...

O exercício constante é estar atento a não provocar o "credo" no krush e nem em ninguém, né? Por isso é tão importante sacar com quem você está se comunicando, a intimidade que têm, e nunca subestimar o boi na linha, o "lost in translation", porque mesmo nas conversas mais fluidas a gente nem sempre compreende ou é compreendido.

Gênio forte é apelido carinhoso para quem é mala. Se hoje tenho madre Teresa e Lulúcifer habitando em mim (vide coluna Rita, Lulúcifer e Madre Teresa) é porque sou vira-lata não só no DNA, mas tenho consciência que metade da minha família rosna. E como a gente repete o que aprende, quem tem família fluente em berrês, que urra para dar bom dia e que pratica bullying amoroso, o falar com educação, respeito e calma é mais desafiador ainda.

Esporte, música, língua estrangeira, cozinha, boquetchy, comunicação… Quanto mais a gente pratica, melhor a gente fica. Quando passei a apresentar um programa sobre sexo todas as madrugadas de sábado na Band, o SexPrivé Club, meu Instagram @krishnamahon virou, inicialmente, um canavial de rola, com nudes indesejados (que é assédio), e depois se transformou em um confessionário lindo e, muitas vezes, triste também. É que tem um bando de homem sem saber se comunicar direito, travando o afeto, já que foram ensinados por gerações e gerações que homem não pode chorar, não pode demonstrar seus sentimentos e todas aquelas baboseiras da masculinidade frágil que causam mais "credo" que "quero", alimentando assim sua própria desconexão, semeando seu eterno 5 x 1.

Já disse aqui, na coluna "Guia da Phoda Madrinha para cantadas online", que o coração é a chave para o rabo, mas é mais que isso. Essa vereda é algo que não vale somente para o krush; o falar com afeto, com jeitinho, pode evitar tretas, abrir portas, facilitar conseguir um aumento e o viver de forma mais suave, saindo do confronto, sabe? Escrevo isso para mim e para você, porque mesmo que naturalmente haja uma doçura mineira no meu falar, como disse, de vez em quando escorrego.

Na próxima vez que sentir o sangue subindo, que quiser berrar ou esfolar a cara de alguém, lembre-se do ditado: com cuspe e jeito não há buraco estreito. Se o assunto for importante, respire fundo, beba um copo d’água e pense consideravelmente no que quer dizer; só essa pausa já vai ajudar horrores, e falar com afeto então...

PS: Lembrei de uma propaganda de um aparelinho de quando eu era pequena: "Audisom —para quem escuta mas não entende bem as palavras". Quem dera a gente pudesse comprar um aparelhinho desse ou tivesse um Google Tradutor para achar a melhor forma de falar com o krush e com o mundo.

Krishna Mahon

Jornalista e cineasta indicada ao Emmy, é apresentadora do SexPrivé Club da Band. Foi produtora da Discovery e diretora de conteúdo do History.

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