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cena de série

A atriz Zendaya em cena da série 'Euphoria', criada por Sam Levinson, disponível no HBO Max Divulgação

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Danya Issawi
The New York Times

Todas as noites de domingo, Maddie Bone, 26, e as cinco amigas com quem divide um apartamento, todas na casa dos 20 e 30 anos, abaixam as luzes da sala, ligam o projetor de TV e sintonizam na série "Euphoria", da HBO Max –com as legendas ligadas, caso o trem elevado da linha J passe fazendo barulho.

Também preparam uma chaleira de chá Sleepytime, não para ajudá-las a dormir, mas para manter os nervos sob controle enquanto acompanham o sonho frenético e febril que "Euphoria" é. "Nós preferimos não beber álcool durante a série", disse Bone. "Precisamos de alguma coisa que nos relaxe profundamente".

Afinal, os momentos de paz são raros na série, um drama ousado sobre adolescentes que desafiam limites em um subúrbio do sul da Califórnia. A maioria dos episódios inclui alguma combinação de sexo ruim, violência explícita, nudez gratuita, consumo copioso de drogas e álcool e retratos impiedosos de vício. Para os espectadores, sentir estresse, ansiedade ou inquietação ao assistir à série são experiências comuns.

"Acredito que haja muito estresse e ansiedade para as pessoas que acompanham ‘Euphoria’", afirmou Adhya Hoskote, 20, de San Jose Califórnia, em uma mensagem via Instagram. "Pessoalmente, sei que minha ansiedade não é a mesma que a de uma pessoa que tenha experiência em primeira mão de vícios ou que tenha amigos e parentes lutando contra vícios, mas mesmo assim pode ser difícil assistir à série de vez em quando".

Hoskote disse que costuma fazer pausas enquanto assiste. Mas, como milhões de outras pessoas que acompanham "Euphoria", ela sempre retorna e pede mais.

A série, escrita e produzida por Sam Levinson, oferece um retrato estilizado de jovens envolvidos com problemas de vício, perdas e traições. Cada uma das linhas narrativas carrega seus próprios traumas.

Zendaya, a estrela da série e uma de suas produtoras executivas, divulgou um alerta quanto ao conteúdo antes da estreia da segunda temporada. "Esta temporada, talvez ainda mais que a anterior, é profundamente emocional e lida com assuntos que podem ser dolorosos e difíceis de assistir", ela escreveu em uma postagem no Instagram. "Por favor, só assista se você se sentir confortável".

Os espectadores também perceberam a intensidade da temporada. "Você passa uma hora ansioso enquanto assiste", disse Merna Ahmed, 21. "Mas quando você assiste a um filme de terror ou ouve alguma coisa de adrenalina muito intensa, continua a ouvir porque quer saber o que vai acontecer. Não consegue desviar os olhos da tela".

O sexto episódio da temporada, que foi ao ar no dia 13 de fevereiro, atraiu 5,1 milhões de espectadores de acordo com a HBO, apesar de ter estreado no dia do Super Bowl (que teve 112,3 milhões de espectadores nos Estados Unidos.)

"Euphoria" segue as pegadas de dramas adolescentes como "The O.C.", "Skins" e "Degrassi" (cujo elenco incluía o rapper Drake, hoje um dos produtores executivos de "Euphoria"), em sua abordagem quanto à passagem da adolescência à idade adulta. Mas "Euphoria" se destaca por sua disposição de ir a extremos, bem como pela estética apurada de suas imagens.

Acompanhamos a personagem de Zendaya, Rue, em sua incapacidade de resistir ao vício em opióides e a vemos queimar pontes para com pessoas que diz amar, e destruir sua própria casa. Acompanhamos assaltos, armas apontadas contra personagens, motoristas que ziguezagueiam pela estrada enquanto bebem cerveja.

Se isso tudo soa desagradável –ou até mesmo doloroso—, ainda assim não é obstáculo a que as pessoas continuem assistindo.

Ahmed, que mora em New Brunswick, Nova Jersey, acompanha a série por motivos sociais; ela adora conversar com os amigos sobre a história e ver memes sobre "Euphoria" no Twitter. Mas ainda assim tem a esperança de que os personagens, mesmo aqueles que parecem mais afundados em dificuldades, terminem por se redimir.

"Eu estava refletindo sobre por que continuamos a assistir mesmo que seja tão doloroso. No meu caso, ao menos, acho que é porque desejo ver esses personagens conseguindo a redenção", ela disse. "Você quer ver onde as coisas terminam para eles e torcer por eles".

Philip Cadoux, 23, que assiste à serie em companhia de amigos toda semana, ama as cores, os figurinos e a atuação de "Euphoria". E também sente empatia, porque conhece pessoas que lutaram contra vícios.

"É como uma dramatização intensa das coisas que todos nós experimentamos. São personagens com os quais é fácil nos identificarmos, mas as coisas pelas quais eles passam são todas chutadas para o volume 11 da escala", disse Cadoux, que mora em Nova York. "Não me identifico com Rue, mas me identifico com a mãe ou a irmã dela".

Além da estética e de atuações premiadas, profissionais de saúde mental concordam em que a série oferece possibilidades de identificação.

"Existe um processo paralelo entre os personagens que vemos nas telas e a disposição e capacidade dos telespectadores de se adaptarem à pandemia", afirmou Sabrina Romanoff, que é psicóloga clínica em Nova York, em uma mensagem de email. "Os espectadores acompanham o desenrolar de diversas histórias que têm por centro a questão: você faria qualquer coisa para conseguir o que quer?"

Ela também atribui o sucesso da série a um fenômeno que define como "doom-watching", uma tendência paralela ao chamado "doom-scrolling", que envolve consumir más notícias ininterruptamente por meio de nossos smartphones onipresentes. Quando as pessoas se envolvem em "doom-watching", assistem a séries tensas que servem para alimentar suas ansiedades, especialmente durante a noite, quando outras distrações não estão facilmente disponíveis. Ela considera que isso seja uma forma de projeção, especificamente de "projetar medos e fatores de estresse pessoais para o grupo coletivo ou externo e para personagens fictícios de televisão".

Mas nem tudo é pessimismo e desespero. Romanoff também acredita que a série possa servir como veículo para educação e entendimento.

"A série faz um grande trabalho ao demonstrar questões de saúde mental, problemas com vícios e a maneira pela qual as pessoas lidam com isso se automedicando", ela escreveu. "A série tem implicações importantes quando o assunto é expandir a conscientização e a empatia quanto a vícios, saúde mental, sexualidade e relacionamentos. Encoraja diálogos e reflexões importantes".

Mary Kay Holmes, 46, roteirista e mãe de duas adolescentes, também é parte dessa escola de pensamento. Ela assiste à série todas as semanas com a filha de 17 anos. (A menor, de 15 anos, acha "repelente" assistir à série com a mãe.)

Holmes e a filha gostam da série antes de tudo como fonte de entretenimento (ela disse que assistiria mesmo se não tivesse filhos), mas, como mãe, ela muitas vezes recorre a "Euphoria" para conversar e informar suas filhas sobre uso de drogas, masculinidade tóxica e questões de gênero e sexualidade.

"Às vezes é difícil assistir, mas a série trata de muitas coisas importantes", disse Holmes. "Em minha casa, acho que usamos bastante a televisão para dar início a diálogos e discutir coisas. Sei que não é essa a norma para muitas famílias, mas tento acompanhar o que minhas filhas estão consumindo em lugar de buscar restringir".

No entanto, o principal motivo para que os espectadores continuem a retornar é que a série retém sua atenção, graças à sua moda e maquiagem vistosas, ao seu visual deslumbrante e às reviravoltas na trama que não param de fornecer assunto aos espectadores.

"Eu com certeza assisto pelo drama. Na minha vida, não há muito drama no momento, porque trabalho em casa e estou em um momento emocional bem sólido agora", disse Bone. "Mas adoro repassar as tramas e diálogos com colegas de trabalho, amigos, transeuntes, qualquer pessoa que eu encontre na mercearia. É uma dessas coisas que realmente servem de assunto".

Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci

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