Como 'O Senhor dos Anéis' se tornou o 'Star Wars' das mulheres da Geração Milênio
Trilogia atrai garotas na faixa dos 20 ou 30 anos que ainda amam os filmes
Trilogia atrai garotas na faixa dos 20 ou 30 anos que ainda amam os filmes
Pouco depois do lançamento da parte final da trilogia "O Senhor dos Anéis", a crítica de cinema Caryn James ponderou se as mulheres "simplesmente se entediavam" ao assistir aos "blockbusters" de Peter Jackson.
"Qualquer filme que se torne tão popular precisa atravessar as linhas de idade e sexo para conquistar sua audiência", escreveu James. "Mas indicações tanto demográficas quanto empíricas apontam que a trilogia continua a ser, primordialmente, brincadeira de meninos".
Determinar se as mulheres se sentiram entediadas ou inspiradas pelos filmes, o primeiro dos quais, "O Senhor dos Anéis - A Sociedade do Anel", foi lançado 20 anos atrás, não é o meu assunto. Mas sei que eu, que tinha 13 anos, e minha irmã, que tinha 12, amamos a história de Sam e Frodo e sua batalha para destruir o anel do mal. E não éramos as únicas.
"Fiquei obcecada pelos DVDs", disse Karen Han, 29, crítica de TV e cinema radicada em Los Angeles. "Creio que a cada feriado eu assistia aos três filmes em maratona, e era algo que eu fazia todos os anos".
Para um certo subconjunto de mulheres da Geração Milênio, a trilogia "O Senhor dos Anéis" ocupa a mesma posição que "Star Wars" pode ter ocupado para aqueles que cresceram no final da década de 1970 e começo da década de 1980. Os filmes se tornaram parte muito querida do acervo cultural de conforto para mulheres no final da casa dos 20 e começo da casa dos 30 anos.
Nos anos transcorridos desde o lançamento dos filmes, assisti-los parecia ser um ritual que só eu e minha irmã realizávamos. (Nossos pais os viram conosco no cinema, mas nunca voltaram a assisti-los.) Durante minha época de universidade, conheci uma e outra fã de "O Senhor dos Anéis" –fiz algumas amizades com base nisso nos anos de pós-graduação, e em noitadas em bares. E havia, é claro, os memes e as contas de memes.
Mas alguns anos atrás, comecei a perceber que existiam artigos, no site The Cut e outros, com títulos como "E as Mulheres de Boromir?", "Sauron Sempre Me Dá Tesão", "O Maior Filme Natalino é ‘O Senhor dos Anéis’".
"Todas nós amamos ‘O Senhor dos Anéis’", disse Gabriella Paiella, 32, jornalista de cultura da revista GQ e ex-redatora do The Cut. "Isso com certeza reforçou minha sensação de que existia interesse feminino específico pelos filmes que eu não tinha percebido antes, porque acreditava que o mundo de ‘O Senhor dos Anéis’ pertence a meninos nerds".
Brincadeiras e memes continuam a ser uma maneira fantástica de unir fãs, mas Paiella e outras mulheres que amadureceram na era de "O Senhor dos Anéis" dizem que sua paixão pelos filmes é muito mais profunda e mais emocional. É um apego que cresceu em companhia dos momentos mais pungentes dos filmes e da trilha sonora de Howard Shore: "Você não conhece o seu Sam?", e "conheço seu rosto"; além de "eu o teria seguido, meu irmão, meu capitão, meu rei".
"A mensagem, geral da história é a de que enquanto houver amor e esperança com relação uns aos outros, a vitória ou o triunfo continuam possíveis", disse Han, explicando que "tecnicamente estamos falando de uma aventura épica de fantasia, mas não acho que ela se apegue às mesmas ideias de masculinidade e poder que muitas dessas histórias tradicionalmente propõem".
O relacionamento romântico primário da trilogia pode ser entre Aragorn (Viggo Mortensen) e Arwen (Liv Tyler), o relutante herdeiro do trono da Terra-Média e sua parceira romântica, que é meio humana, meio elfo. Mas Paiella e Han argumentam que a conexão entre os dois tem a mesma ternura que a dolorosa morte de Boromir (Sean Bean) – cujo desespero para salvar a Terra-Média o leva a tentar roubar o anel -, com Aragorn ao seu lado, no final do primeiro filme.
É o tipo de momento que não costuma ser encontrado com frequência nos filmes de ação de orientação masculina, e em certos quadrantes da internet, como o LiveJournal e o Tmblr, essa ternura –entre Frodo e Sam, Legolas e Gimli, Merry e Pippin, Gandalf e Bilbo– se tornou o ponto focal de histórias de ficção escritas por fãs sobre "O Senhor dos Anéis".
"Eu era completamente obcecada por contos gays sobre hobbits", disse Chelsea McCurdy, 35, que trabalha para uma organização sem fins lucrativos em Conway, Arkansas. "E acho que isso foi muito importante para mim em minha jornada queer e no amor pelos filmes".
McCurdy, que é casada com um homem transgênero e estima que eles assistam a pelo menos um dos filmes a cada duas semanas, disse que sua fascinação ia além de ser "uma adolescente tarada", acrescentando que "nada parecia inseguro, porque os mocinhos eram realmente bons sujeitos. E não existe estupro, não existe qualquer coisa que faça com que você se sinta desconfortável, como mulher, em toda a trilogia".
De fato, os personagens masculinos mais tóxicos da série encontram fins satisfatórios. São apunhalados nas costas e empalados (Saruman), mortos a flechadas (Grima Wormtongue) ou caem para a morte depois de atearem fogo a si mesmos (Denethor).
Passados 20 anos, McCurdy continua especialmente comovida com as personagens mulheres –Arwen, Galadriel (Cate Blanchett) e Eowyn (Miranda Otto)– cujos papéis foram reforçados nos roteiros por Fran Walsh, por muito tempo parceira de Peter Jackson, e por sua colega roteirista Philippa Boyens.
"Minha cena favorita de todos os tempos é a do ‘não sou homem’", disse McCurdy, em referência a um momento crucial em que Eowyn mata o mais apavorante servo de Sauron, o rei-feiticeiro de Angmar. "Aquela cena toda me arrepia, e a jovem feminista Chelsea simplesmente devorava cada momento".
A crítica de TV Han concorda, ainda que relute em usar a frase "personagem feminina forte". Ela explica: "Sempre que as pessoas tentam fazer isso no cinema contemporâneo, a sensação é a de uma compreensão rasa e fácil, mas em ‘O Senhor dos Anéis’ eles realmente foram além".
Que essas personagens mulheres e muitos de seus colegas homens sejam brancos (como a maioria dos personagens do filme) não diminui o poder de permanência da trilogia, mesmo para pessoas que hoje submetem Hollywood a padrões muito mais elevados.
"Os filmes estão além da crítica para mim porque acho que os consumi jovem demais e porque os vejo, mesmo que sejam recentes, como uma obra antiga, inamovível", disse Sara David, 32, editora da Vice Media e organizadora sindical. "Não percebi nenhuma falta de representação racial ou de gênero ali porque a história é muito antiga, e de bem versus mal em termos genéricos".
Para Han, não é o tratamento das cenas de ação pelos realizadores que se destaca, mas a maneira pela qual tratam os relacionamentos "e a maneira muito bonita e ornada pela qual retratam o mundo, o que não acho que o torne menos atraente para os homens, mas abre portas para que mais pessoas, de origens diferentes, encontrem algo que amar, nele".
Determinar se as meninas pré-adolescentes amarão os filmes hoje ou desenvolverão qualquer apego a eles da maneira que fiz é uma questão aberta a debate. (Filmes da Marvel eles não são.) Mas as quatro mulheres com quem conversei concordaram em que, se você quer abarcar as nove horas da saga de "O Senhor dos Anéis", o melhor é fazê-lo quando ainda é jovem.
"É uma daquelas coisas que você precisa fazer no momento certo de sua vida", disse Paiella, acrescentando que "não creio que encontrar esses filmes como adulto terá efeito semelhante. As pessoas ficam menos em guarda naquela idade do que quando se tornam adultas".
Tradução de Paulo Migliacci.
Outro Canal: Ex-BBB Marcos Harter tenta censura prévia contra Record, mas Justiça nega pedido
Outro Canal: Namorada de delator do PCC morto fala sobre assassinato: 'Não pude fazer nada'
Rafa Kalimann e Allan Souza Lima terminam relacionamento após um ano de namoro
Sagitário e o amor: veja com quais signos o sagitariano tem mais química
Outro Canal: Portiolli sobe ibope do SBT aos domingos e cresce audiência no antigo horário de Eliana
Comentários
Ver todos os comentários