'Succession': Como Nicholas Braun e o despreparado primo Greg prosperam
Ator celebra papel em série de sucesso após 20 anos de carreira
Ator celebra papel em série de sucesso após 20 anos de carreira
Certa manhã de sexta-feira, em setembro, Nicholas Braun, 33, atravessou uma ponte sobre o rio Hudson para chegar a Little Island, um parque flutuante que o fascina desde sua inauguração, no segundo trimestre. Ou, como ele diz, “vi esse lugar muitas vezes da estrada, mas nunca parecia ser o momento certo para uma visita”.
Braun, um sujeito de 2,01 metros de altura, caminhou pelo parque avaliando sua topografia. Passou alguns instantes admirando o giro hipnótico de um gigantesco disco rotativo (“me deixou tonto em cinco segundos”, ele disse), e dedicou um pouco menos de tempo a ouvir uma banda ligeiramente repetitiva que estava tocando no anfiteatro (“essa música precisa de letra”). Depois, explorou avidamente um túnel cavernoso que descobriu conduzir aos sanitários.
O resultado geral da visita, para ele, foi desenvolver uma nova perspectiva sobre o valor dos espaços públicos. “Parece que está faltando uma pista de minigolpe por aqui, não é?”, comentou.
Quando você está em companhia de Braun, qualquer coisa que ele diz, de seu jeito compassado e naturalmente inócuo, parece engraçada. A sensação é a de que ele tem uma propensão quase sobrenatural a se colocar em situações desajeitadamente cômicas.
As reações podem ser resultado de uma tendência automática de associar o ator ao papel que lhe valeu seu primeiro grande sucesso, o do primo Greg em “Succession”, série da HBO. O personagem poderia facilmente ter se tornado secundário se Braun não o elevasse a um bufão de primeira grandeza no drama cômico sobre a disputa feroz pelo controle de uma empresa.
Em apenas duas temporadas, Braun parece ter adquirido, sem esforço e de modo quase inconsciente, o jeitão de peixe fora d’água de Greg, quer nos momentos em que procura desculpas para que alguém pronuncie errado o seu nome, quer seja gaguejando durante uma audiência diante do Senado dos Estados Unidos.
Mas o Braun real não tem muita coisa do primo Greg. Ele é um cara com problemas comuns e ambições plausíveis, incomodado por vazamentos no encanamento de seu apartamento, esperançoso quanto a um relacionamento romântico duradouro e, depois de mais de 20 anos de trabalho como ator, feliz por ter encontrado um papel popular em uma série de sucesso.
Braun também simpatiza com os defeitos altamente divertidos de Greg e está otimista com a possibilidade que o personagem um dia transcenda suas limitações —talvez em algum momento da terceira temporada de “Succession”, que estreia em 17 de outubro.
“Acredito que exista um intelecto por baixo de tudo, mas ele fica soterrado por todas as outras coisas –pelo medo de falar em uma sala lotada de pessoas importantes”, disse Braun. “Mas quando ele tem uma oportunidade, acredito que tenha uma boa chance de se sair bem”.
Se existe alguma coisa em que Braun e Greg estão em perfeita sintonia é em contar a história de alguém que repentina e surpreendentemente se vê na exata posição que sempre quis ter, e está determinado a aproveitar ao máximo a oportunidade.
“Um dos lados de Greg é o de um lado de um cara que está sempre tentando e para mim retratar isso é muito gostoso e divertido”, disse Braun. “Um cara que tenta e em geral fracassa –mas ocasionalmente não, e as coisas continuam a funcionar, lentamente, mas a funcionar para ele”.
Braun terminou recentemente de filmar a nova temporada de “Succession” na Toscana e depois passou os dias seguintes viajando pela Europa com um par de conhecidos. (Como o ator explica, “eram dois caras que já estavam viajando de carro e eu perguntei se havia espaço para viajar com eles naquele Yaris”.)
Ele relaxou em um velho hotel de Gênova e jogou no cassino de Monte Carlo, separado dos demais apostadores por barreiras plásticas, o que o decepcionou um pouco. “Acho que jogar blackjack é melhor quando você pode conversar com os outros e ter companhia em sua auto depreciação por jogar dinheiro fora”, ele disse.
Algumas coincidências tiveram papel importante em sua carreira. Braun cresceu em Nova York e no Connecticut e tinha cinco anos quando seus pais se divorciaram. Depois que o pai dele começou a fazer aulas de atuação, um curso que ganhou de presente, ele encorajou o jovem e relutante Nicholas a seguir seus passos na arte.
“Eu o visitava a cada dois finais de semana, e ele me colocava em uma cadeira e fazíamos exercícios Meisner de repetição juntos”, disse Braun. “Era muito frustrante e eu odiava. Pai e filho em uma batalha de repetição: é uma loucura pensar nisso, na verdade”.
Os dois foram escalados juntos para um curta-metragem e em seguida Braun começou a conquistar papéis televisivos e cinematográficos importantes, trabalhando com atores como John Larroquette e James Coburn. Ao chegar à adolescência, ele já estava conseguindo filmes como “Super Escola de Heróis”, comédia da Disney e, embora entrasse para o Occidental College com o plano de se formar em matemática, desistiu do estudo depois de dois anos, decidindo que seu futuro era a atuação.
“Barack Obama estudou lá, também só por dois anos”, disse Braun, sorrindo. “Para ele, funcionou”.
Quando uma cópia do roteiro de “Succession” chegou às suas mãos, alguns anos atrás, Braun estranhou um pouco os diálogos cáusticos entre Logan Roy, o magnata da mídia que protagoniza a série e seus filhos brigões.
“Havia um monte de referências a ‘reforçar a oferta’ que eu não sabia onde se encaixavam”, disse Braun. “Era uma série sobre negócios?” Mas ao ler uma das primeiras cenas como Gregory Hirsch, um intrujão nada qualificado, na qual ele aparecia usando uma fantasia de cachorro em um parque de diversões e vomitando pelos buracos dos olhos, Braun disse, “eu compreendi minha parte na história”.
O personagem era “o cara que está sempre lá, mas nunca entende, e ao mesmo tempo quer entender e quer estar lá”, disse o ator. “Para mim, sabe, foi muito fácil entrar no modo de pensar de Greg”.
Quando Braun chegou para a audição com Jesse Armstrong, o criador da série, e Adam McKay, um produtor executivo e diretor do piloto, seu desempenho se destacou imediatamente.
“A altura dele desmonta o espectador na hora”, disse McKay, roteirista e cineasta premiado com o Oscar. “Tenho 1,96 metro e, por isso, quando encontro pessoas mais altas que eu, elas costumam ser atletas. Encontrar um cara de 2,01 metros e que tem esse tipo de neurose cômica em sua forma de agir era bem incomum”.
Depois que Braun leu páginas do roteiro e participou de algumas interações improvisadas com membros do elenco, a equipe de “Succession” estava certa de que tinha encontrado Greg.
Armstrong disse que o personagem foi concebido como alguém que compartilharia da desorientação da audiência no mundo dos Roy –um membro da família e ao mesmo tempo alguém que não se enquadrava com facilidade—, mas acrescenta que, na interpretação de Braun, o personagem se tornou algo mais.
“Você costuma ter um impulso egoísta como roteirista que é o de pensar que aquele ator vai te salvar”, disse Armstrong. “É o que Nick faz. Ele pega coisas que estão lá, inertes na página, e as torna engraçadas. E há momentos que você escreve pensando no que ele vai fazer, no quanto ele vai gostar da cena”.
Braun se divertiu em cenas como o depoimento completamente desarticulado de Greg ao Senado para o qual o ator recebeu diversas páginas de diálogo na noite anterior à gravação. “Jesse me perguntou se, em vez de voltar dentro de algumas semanas, eu toparia rodar a cena no dia seguinte”, recorda Braun. “E eu respondi que claro que sim. Mesmo que eu só tirasse 80% do que a cena podia dar, daria certo”.
“Succession” também aproveitou o elo inesperado que surgiu entre Greg e seu mentor e carrasco, Tom Wambsgans, interpretado por Matthew Macfadyen.
Macfadyen explicou que Tom, casado com a filha de Logan Roy, Shiv (Sarah Snook), tem ainda menos legitimidade na família do que Greg, que pelo menos é um parente real. Portanto, disse Macfadyen, Tim é uma das poucas pessoas que se sentem ameaçadas por Greg.
Não existe segredo evidente em sua alquimia com Braun, ele acrescentou. “Às vezes pensamos muito, conversamos, temos ideias”, disse Macfadyen. “E às vezes a coisa simplesmente acontece, na primeira tomada, e é essa que elas usam”.
Braun disse que com certeza partes de sua personalidade real aparecem em Greg, mas talvez não na escala que os espectadores talvez imaginem. “Eu aproveito alguns traços como as ocasiões em que tento demais ou me sinto desconfortável em algum lugar, ou quero me pronunciar, mas não sou exatamente autorizado e por isso o que digo parece forçado”, ele disse.
“Talvez eu me sinta atraído por papéis com algo de terapêutico”, ele prosseguiu. “Posso observar determinadas partes de mim mesmo e perguntar por que eu ajo como ajo. E pensar em como amplificar aquilo de uma maneira divertida”.
Falando de uma cena na qual Greg se prepara para um possível ato de espionagem empresarial, Braun diz, brincando, que “nunca me tranquei num banheiro para falar em um gravador e ter certeza de que ele está funcionando porque pretendo denunciar alguém. Nunca fiz isso, mas posso me ver agindo assim na situação certa”.
Embora pareça existir um teto muito sensato para o desenvolvimento de Greg em “Succession”, Armstrong não descarta de vez a possibilidade de que o personagem um dia se veja no posto de Logan Roy.
“Eu não quero destruir a diversão de considerar todos os candidatos”, ele disse. “Greg ainda tem muito a avançar. É comum que consiga o que quer por meio de uma mistura peculiar de astúcia e completa falta dela. Deixo para outras pessoas julgar se ele é ou não um verdadeiro candidato à sucessão”.
Enquanto isso, Braun continua se aclimatando à estranha celebridade que o personagem lhe valeu. Ele não consegue completamente evitar os fãs que Greg adquiriu, mas tenta impedir que a adulação e os memes afetem seu desempenho. “Não é bom pensar que ‘esse é um momento perfeito para um meme”, ele disse.
Braun vem tentando a sorte em outros projetos, como “Zola”, uma mistura de comédia e suspense, no qual ele é o namorado leal da stripper impulsiva interpretada por Riley Keough e deixou crescer a barba para interpretar o pretendente em “Cat Person”, adaptação de um conto de Kristen Roupenian. (“Eu nem sabia se conseguiria” [criar uma barba], ele comentou sobre seu novo visual. “Mas me convenci de que era capaz”).
Brian também disse estar trabalhando em sua escrita, que inclui um projeto bastante pessoal que ele descreve como “traumédia” sobre relacionamentos. Se ele parece “fascinado por romances e por cortejar outro ser humano”, diz, é porque “nunca tive um relacionamento longo em minha vida”.
“É algo que quero, mas sou incapaz de”, ele disse. “Vou nessa direção e aí encontro um muro e não consigo ir além. Preciso sair”.
Antes que você comece a lamentar pelo astro alto e popular de uma série de TV de sucesso, Braun acrescenta, com mais entusiasmo: “Acredito que vai acontecer.
Pensando em sua família, Braun diz que é cedo demais para desistir. “Meu pai me teve quando tinha 48 anos”, ele disse, acrescentando que havia aprendido a conhecê-lo melhor quando os dois enfim puderam conversar como adultos. “Isso só aconteceu no ano passado, cerca de oito meses atrás”, ele disse.
Talvez em reação à expressão curiosa no rosto do entrevistador, Braun logo emendou sua resposta: “Não, não, não, não. Estou brincando”.
A vida havia acabado de demonstrar uma vez mais que, sob as circunstâncias certas e com a inflexão certa, ele consegue levar qualquer pessoa a acreditar em qualquer coisa que diz. “Eu funciono bem nessa história de humor impassível”, disse Braun.
Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci
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