Escola de Wolf Maya se expande em shoppings e luta para ser levada a sério
"Eu vivia num meio fútil. Estava fadada a ser só uma gostosa da televisão. Isso mudou." A frase sai séria da boca da ex-paniquete Ana Paula Minerato, 22. E ela não está interpretando, por mais que tenha acabado de sair de uma aula sobre o dramaturgo alemão Bertolt Brecht na Escola de Atores Wolf Maya.
Minerato é um dos cerca de mil alunos do centro de ensino do diretor de novelas globais como "Amor à Vida", que completa 13 anos no shopping Frei Caneca, se expande para o Rio de Janeiro e luta para afastar de vez o estigma que o próprio Wolf, 61, define como "uma escolinha de televisão para gente bonita".
A pecha, acredita o dono do lugar, já foi corroída pela experiência e pelos 20 mil alunos que saíram dali com um diploma, após três anos de um curso profissionalizante que cobra mensalidade de R$ 900.
Ter no rol de ex-alunos protagonistas de folhetins como Maria Casadevall, 27, ajuda. Funcionou para Gabriela Leôncio, 21. "Olha, sinceramente vim pra cá porque sou do interior e lá a gente não conhece muito essas coisas de arte." O sonho inicial era ir para o Rio, mas a mãe se lembrou que "a escola do moço da novela" era em São Paulo.
Há dois anos na cidade, ainda não trabalha. "Tenho alguns projetos", diz ela, usando a frase mais chavão do seu negócio, "mas por enquanto é só escola mesmo".
Pensa em se inscrever na agência com o mesmo nome do lugar, que faz a ponte entre alunos, canais e empresas de publicidade -cobra comissão de 10% a 30% do cachê. Wolf diz que "não aceitam qualquer um".
Nem no vestibular, que teve cinco candidatos por vaga em 2014. E deixa muita gente em pânico não cenográfico. ("Duas paniquetes fizeram e não passaram", se jacta Minerato).
A procura criou até um mercado paralelo: de cursinhos sob medida para entrar na escola.
"Eu paguei R$ 600 para ter três tardes de aulas com um 'coach' [treinador]. Ele ensinou a lógica do teste e treinou cenas de improviso", diz um aluno que pede anonimato.
O momento mais tenso é quando os professores tiram do chapéu um papel que os vestibulandos têm de interpretar no improviso.
"Nessa hora, eu enlouqueci, fiz o que meu corpo mandava. Pulei, me joguei no chão. As pessoas mais novas têm pudor de se soltar. Eu fui com tudo, não tinha muito a perder", diz Lucíla Miranda Araújo, 45.
Isso porque ela já ganhara muito. Era uma médica de renome (seus trabalhos, como Comprometimento Cardíaco em Crianças e Adolescentes Portadores de Lúpus Eritematoso Sistêmico são referência). Na escola, que "aaama", diz ser só mais uma aluna.
Bem como é Bruna Santana, irmã do sertanejo Luan Santana, que está no terceiro semestre. Colegas a descrevem como "esforçada" e "discreta".
Nada como Roxanne, a loira perdida e pedante que Tatá Werneck interpretava na MTV antes de ser protagonista da Globo. A aspirante a atriz (modelo, cantora, ventríloqua...) Roxanne dizia aos quatro ventos "Eu faço Wolf, sabe quem é?".
DIA DE IR AO BANHEIRO
Todos sabem. Há um mito de que, nos dias em que Maya está pela escola, as garotas aparecem mais maquiadas e alunos pedem para ir ao toalete a cada cinco minutos, só para trombar "por acaso" com o diretor.
Ele ri da lenda. "Esse sonho tem que ser estimulado. Eu, quando ator, tinha loucura para bater um papo com a Fernanda Montenegro. A gente tem de estar perto do que admira."
Às vezes, funciona. O galã Malvino Salvador foi pinçado para novelas antes do sexto mês de aulas.
O diretor frisa que "nasceu" no teatro e oferece a sala Nair Bello aos alunos. "O objetivo não é só TV."
"Eu confesso que tinha algum preconceito. Mas pelo menos aqui eles não são hipócritas", diz o professor de vídeo André Garolli. "Eles entram querendo TV. O mais legal é chegar ao fim do curso e todos dizerem 'Teatro é demais!'. É mais honesto que numa escola onde só falam de teatrão, mas no fundo estão loucos para serem chamados pela Globo."
Criou-se também um curso de teatro musical (gênero que "está no sangue do brasileiro", diz Wolf).
Para divulgá-lo, disfarçaram alunos na praça de alimentação do shopping. Na hora do jantar, eles se levantaram e começaram a cantar e dançar a plenos pulmões. A ação foi filmada, caiu na internet e viralizou.
MC Galo, estrela do funk ostentação com milhões de visualizações no YouTube, é um dos alunos. "É mais do que aprender a cantar e dançar [jogando dinheiro para o alto, como faz nos clipes]. Isso é tranquilo. Aqui aprendo que esforço conta muito."
Repertório também. Os alunos são obrigados a ver peças de teatro e entregar resenhas. Eliete Cigarini, que interpreta a mulher de Antonio Fagundes em "Tribos", que estava em cartaz no Tuca, conclamou os alunos a vê-la. "Foram 30%."
Mas a professora diz encontrar os pupilos na situação inversa. "Vejo ex-alunos no mercado, e fico orgulhosa do trabalho. O Wolf também." O diretor está presente no vestibular e na avaliação dos alunos. E também na filial, aberta em 2013 no shopping Freeway, no Rio.
"Ele não viu minha prova no primeiro semestre e isso causou uma revoltinha na classe", diz a ex-paniquete Ana Paula. "Mas tudo bem. Antes desse curso, eu nunca tinha terminado um livro. Mas agora leio o 'Manual do Ator', do Stanislavski."
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