Estilo

Como o vestido de 'De Repente 30' voltou a ser sucesso após quase 20 anos

Tendências da moda na internet e Halloween ressuscitaram a roupa

Jennifer Garner usa vestido icônico em cena do filme "De Repente 30", ao lado de Mark Ruffalo - Divulgação

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Jessica Testa

Uma coisa engraçada aconteceu no set de The Voice americano em 8 de novembro: Ariana Grande, a mais nova treinadora do programa, apareceu para trabalhar usando um vestido Versace que, apenas uma semana antes, tinha sido usado como fantasia em muitas festas de Halloween nos Estados Unidos.

O colorido minivestido –com tiras enfeitadas por strass, cintura império, recortes e listras grossas em tons de turquesa, verde limão e escarlate– foi lançado como parte da linha de primavera da grife italiana em 2003.

Mas o modelo é mais conhecido por sua breve aparição na comédia romântica "De Repente 30", quando Jenna Rink, a personagem de Jennifer Garner, o usa para dançar a coreografia de "Thriller", de Michael Jackson, em uma festa de trabalho.

Quase duas décadas depois de lançado, o vestido encontrou vida nova, graças em parte a grupos de varejo online que vendem modelos espantosamente parecidos por menos de US$ 20 (cerca de R$ 113).

A revista Vogue previu em outubro que o look vibrante do vestido "estaria em toda parte" no Halloween. E, se o TikTok serve de prova, com certeza estava.

O ressurgimento do vestido coincide com uma nostalgia fervilhante por roupas da era da virada do milênio, da cabeça (fivelas e chapéus) aos pés (jeans de boca larga e sandálias plataforma).

Mas a popularidade do modelo vai além de capturar a estética da virada do milênio: celebridades e influenciadores vêm procurando peças específicas de arquivo associadas à cultura pop da virada da década de 2000, disse Marian Park, estrategista de moda jovem da WGSN, uma agência de previsão de tendências.

"É menos uma questão de figurino e mais uma questão de opulência e decadência", ela disse, apontando para um vestido de Roberto Cavalli, safra 2000, com estampa de tigre e um recorte lateral alto, usado pela cantora Aaliyah no MTV Video Music Awards daquele ano.

Mais recentemente, o vestido foi usado pela modelo Paloma Elsesser, pelo influenciador Bretman Rock e por Kim Kardashian.

Basta lembrar que Addison Rae, a rainha do TikTok, usou um vestido Gucci safra 2003 (design de Tom Ford) no Met Gala. Ou a visita de Olivia Rodrigo à Casa Branca, na qual ela usou uma saia xadrez, citando o modelo usado por Alicia Silverstone em "As Patricinhas de Beverly Hills".

"Acho que vamos ver cada vez mais jovialidade na escolha de roupas –e a associação com a ideia de que certa peça é parte de um figurino, ou algo específico de um filme ou de um momento cultural, perderá importância", disse Park. "O look é o mais importante".

Susie DeSanto, a figurinista de "De Repente 30", disse que o interesse renovado pela moda usada no filme vem sendo "uma loucura". "Por volta do Halloween, não consegui nem contar o número de fotos que recebi mostrando gente de todo tipo –menininhas, adolescentes, drag queens– usando aquele vestido", disse DeSanto.

"Pessoas que fazem podcasts de moda na Espanha e no Brasil me contataram e entrevistaram sobre as roupas, e me mandaram fotos, perguntando onde eu tinha conseguido cada peça, e onde elas poderiam encontrá-las agora".

O roteiro do filme pedia por roupas que fossem plausivelmente atraentes tanto para uma menina de 13 anos quanto para uma mulher de 30 anos –divertidas, inocentes e doces, mas quase com cara de "sexy-baby"—, e "os estilistas e as tendências do começo dos anos 2000 pareciam perfeitamente preparados para nos ajudar a contar a história", disse DeSanto.

A personagem de Garner alternava vestidos Miu Miu, Moschino e Marc Jacobs. (O fato de que o diretor do filme, Gary Winick, fosse um entusiasta da moda, ajudou bastante, disse DeSanto.)

O vestido Versace tinha sido lançado no final do ano anterior em um desfile em Milão, com Britney Spears sentada na primeira fila da plateia. Cathy Horyn, crítica de moda do The New York Times, comparou o modelo a "ser assaltada por uma gangue de Barbies enfurecidas".

"Era um vestido que funcionava para a cena, para a personagem, e foi por isso que o escolhemos e que ela o usou", disse DeSanto.

Embora a peça talvez esteja perdendo parte de sua associação com o filme, ele deve seu ressurgimento a uma das estrelas de "De Repente 30". No Halloween do ano passado, Christa B. Allen, que interpretou a versão mais nova da personagem de Garner no filme, comprou uma recriação do vestido no site Etsy e gravou um vídeo para o TikTok que a mostra reproduzindo a cena. O vídeo recebeu mais de quatro milhões de "likes".

"O cosplay é forte no TikTok", disse Allen. "Percebi que as pessoas amam Jenna Rink e que eu podia lhes oferecer uma maneira de reencontrar a personagem e passar mais tempo com ela".

Mais ou menos no mesmo momento, a modelo Elisha Herbert postou fotos no Instagram que a mostravam vestindo uma recriação do vestido, que ela tinha encomendado à Nasteski, uma grife australiana de roupas de banho e moda festival, cujos clientes adoram os "looks" de celebridades dos anos 2000 como Paris Hilton.

Quando a estilista Anthea Nasteski postou fotos do vestido, ela recebeu dezenas de comentários e algumas encomendas —como a vendedora do Etsy, ela está cobrando mais de US$ 400 (R$ 2.253) pela confecção do vestido– mas não divulgou realmente o modelo.

Na época, ela achou que seria "uma atitude de mau gosto revender o design alheio", mesmo que o alguém em questão fosse Donatella Versace.

Nasteski produziu o vestido rapidamente. Porque faltavam apenas alguns dias para o Halloween, quando Herbert fez sua encomenda, ela usou lycra e tecidos tingidos que tinha sobrando em seu estúdio.

Mas meses mais tarde, na metade de 2021, quando o vestido de repente começou a ser vendido em sites como o Cider e a Amazon por menos de US$ 20 (R$ 130) —e se tornou sucesso viral— , as novas réplicas usavam o mesmo padrão de cores tingidas que Nasteski tinha empregado. E as fotos que oferecem o vestido à venda na Amazon são as mesmas usadas no Instagram de Herbert.

Para Nasteski, esse é mais um exemplo de pequenos estilistas que veem seu trabalho exibido, sem crédito, nas plataformas de grandes empresas de comércio eletrônico. Mas também representa algo de mais complicado: o vestido à venda copiava as alterações que ela fez no design, mas o design original não era dela.

Quando as versões baratas do vestido foram lançadas, "ele de repente estava em toda parte", disse Allen. "Acho que, se alguém o usa, e as pessoas ao redor conhecem o filme e a personagem, isso cria um momento compartilhado alegre. Mas mesmo que as pessoas não conheçam o vestido e a personagem, o modelo continua a ser lindo".

Antes de seu 30º aniversário, em 11 de novembro, Allen contatou a Versace para saber se a empresa emprestaria o original para usar na festa. Mas disse ter sido gentilmente informada de que o vestido já estava reservado para outra pessoa. (Mais tarde ela descobriu que se tratava de Ariana Grande.)

Hoje o vestido não parece mais depender da nostalgia ou mesmo de qualquer conhecimento do filme, disse Mandy Lee, analista de tendências com grande número de seguidores no TikTok. Ela registrou ter visto alguém usando o vestido recentemente em público, na loja de roupas "vintage" Beacon’s Closet, complementado por meias arrastão.

"Não acho que ele deva ser visto como parte de um figurino de filme", disse Lee. "Há pessoas da Geração Z que não conhecem a referência, podem nem ter lembranças do filme. Agora não é mais aquele vestido de ‘De Repente 30’, e sim um vestido bonito por mérito próprio".

Mas ela não tem certeza de que, depois dessa nova onda de popularidade, o vestido se prove duradouro. A preços de menos de US$ 20 (R$ 113), "o vestido era muito acessível", o que o ajudou a se tornar sucesso viral.

Mas esse sucesso pode tê-lo matado, ao torná-lo uma microtendência que as pessoas passarão a odiar por vê-lo vezes demais, o que destinará o modelo à lata de lixo ou aos brechós. "A exposição excessiva que acontece online agora pode arruinar as coisas, às vezes", disse Lee.

Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci.